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Troller não vai sumir, alguém assumirá fábrica, diz criador do jipe

Administrador do Ceará criou bugues até chegar ao modelo, sucesso entre jipeiros

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Fortaleza

O anúncio da Ford, em janeiro, de que deixará o Brasil, causou furor entre jipeiros. A Ford também é dona da Troller, marca nacional comprada em 2007 pela montadora e que produz o jipe T4 na fábrica de Horizonte, região metropolitana de Fortaleza.

O modelo deixará de ser produzido no último trimestre de 2021 caso ninguém assuma a operação. Os governos do Ceará e federal, junto com a Fiec (Federação das Indústrias do Estado do Ceará), tentam arrumar um comprador. A Ford diz que "continuará facilitando alternativas possíveis e razoáveis para partes interessadas".

O projeto de um jipe para encarar a areia das praias do Nordeste, que virou febre entre participantes de rali, nasceu em 1994. Rogério Farias, 70, deixou a sociedade com o irmão, que tinha como principal produto os bugues Fyber, para fabricar artesanalmente o Troler (com um L apenas).

Rogério Farias em uma das edições do rally Paris-Dakar que a Troller levou equipe, no início dos anos 2000 - Arquivo Pessoal

Farias é administrador, mas se especializou em mecânica e desenho industrial. Chegou a elaborar lanchas e carretas agrícolas. A pedido de amigos que queriam um 4x4 confiável para as dunas do Ceará, Farias montou uma pequena fábrica em Horizonte, que fazia de três a quatro jipes por mês.

Parte das peças era retirada de carros já existentes, como espelhos retrovisores e bancos, o que rendeu ao jipe o apelido de "Frankenstein". O primeiro motor foi o de um Volkswagen Santana.

"Não dá para fazer, por exemplo, um espelho retrovisor específico, ficaria caríssimo. Outras peças fazíamos em Horizonte, principalmente, a suspensão", contou Farias.

A ideia era ter um veículo 4x4 com chassi tubular de alta resistência que aguentasse a salinidade das praias e fosse capaz de superar obstáculos no off road." A gente produzia um jipe e eu mandava para algum amigo testar. Era bem artesanal", disse Farias.

O carro passou a ser testado também em provas de rali, mas havia problemas. As primeiras versões tiveram defeito no freio e na direção, além de um superaquecimento que foi resolvido com um radiador maior —mesmo quando os carros passaram a ter produção industrial houve problemas, como chassi trincado na picape Pantanal.

"Achávamos que uma peça para o freio era a ideal, testávamos e não funcionava bem. Aí trocávamos até acertar. Quando levamos o carro para o [rali] Paris-Dacar [em 2000], o radiador era de um trator."

Farias deixou de ter participação societária na Troler em 2006, pouco antes de a Ford comprá-la, em janeiro de 2007. Vendeu sua parte para o sócio, o empresário e engenheiro Mario Araripe (que já era acionista majoritário desde os anos 1990, quando Farias precisou de uma injeção de recursos).Ali nasceu a Troller, agora com dois Ls, e a produção passou a ser em escala industrial. Farias continuou na empresa, participando do processo de fabricação do jipe.

Em 2007, toda a operação, que era deficitária, foi negociada com a Ford, que se aproveitou de uma lei federal aprovada pouco antes para ganhar isenções fiscais ao obter a fábrica no Nordeste.

"Não tive nenhuma participação nesse acordo com a Ford e nem recebi qualquer valor", afirmou Farias.

Ele continuou apenas produzindo algumas peças para o carro, principalmente das partes da suspensão, e as vendendo para a montadora americana.

O empresário já havia obtido isenção fiscal do Ceará ao instalar a fábrica em Horizonte em vez de Fortaleza. Durante o governo Lula (2003 a 2010), a empresa conseguiu redução no IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados).

"Não participei de nenhuma conversa sobre essa questão de impostos, minha função já era apenas a parte de produção, mas é claro que ajudavam [as isenções]", disse Farias, que hoje se declara um eleitor de Jair Bolsonaro (sem partido) que não gosta do PT.

"Se a eleição fosse hoje, eu votaria novamente em Bolsonaro, apesar de não concordar com tudo o que ele faz."

Um ano após assumir a fábrica em Horizonte, a Ford decidiu encerrar a produção da picape Pantanal, produzida junto com o jipe T4, pouco tempo após as primeiras unidades serem comercializadas.

Foi constatada, na época, a possibilidade de trincas no chassi que comprometeriam a segurança e a durabilidade da picape. Proprietários das cerca de 70 unidades vendidas foram chamados para devolver os veículos mediante indenização —em outras palavras, vender o carro de volta para a montadora. Aqueles que se recusaram assinaram termos de responsabilidade. Os veículos entregues foram destruídos.

"Tinha um escritório da fábrica em São Paulo e fizeram o projeto lá [em 2003]. Foi pego o chassi do T4 e aumentado em 1,20 m. Os carros deram problema. Não deu certo."

Hoje a Ford tem uma produção anual de 1.300 jipes T4, que custam a partir de R$ 167 mil. A fabricação seguirá normal pelo menos até o fim de 2021.

"Não acho que a marca Troller sumirá. Acredito que alguma empresa vai assumir a fábrica, qualquer grande montadora coloca a mecânica dela e o carro está rodando no outro dia", avalia.

Atualmente, ele administra uma fábrica de elevadores residenciais e não tem nenhum modelo Troller em sua garagem.

"Hoje é outro carro que é produzido. Muita gente compra para andar na cidade e reclama que não é macio. No começo o carro não tinha nada eletrônico, se você anda em um jipe sem nenhum fio para ligar, é totalmente diferente."

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