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Marco Moraes

Por que não conseguimos reduzir as queimadas no Brasil?

Instituições governamentais, que deveriam aplicar multas, e bancos, que decidem para quem conceder crédito, são coniventes

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Marco Moraes

Geólogo e escritor, é pesquisador de mudanças climáticas e autor de “Planeta Hostil” (ed. Matrix)

Enquanto o Pantanal e a Amazônia ardem em chamas, naquele que pode ser o pior ano na história da devastação desses biomas, brasileiros e a comunidade internacional se perguntam por que não conseguimos ao menos resolver parte desse problema.

É fato que a mudança climática, com o aumento da temperatura, estiagens prolongadas e chuvas mais intensas, porém mais espaçadas, estão causando um grande aumento dos incêndios florestais em todo o mundo.

Queimada na floresta no município de Lábrea, no Amazonas - Evaristo Sá/Folhapress - AFP

Vale registrar que em muitos biomas, principalmente nas florestas temperadas e no cerrado brasileiro, o fogo faz parte do ecossistema. No entanto, mesmo nesses lugares os incêndios têm se alastrado descontroladamente, destruindo a vida selvagem, propriedades e causando perda de vidas humanas em proporções catastróficas.

No Pantanal e na Amazônia, a umidade não deixa que o fogo natural, nas raras vezes em que ocorre, se alastre. As queimadas ali são provocadas pela ação humana, irresponsável ou mesmo criminosa. Se essas é a causa das queimadas, os esforços para reduzi-las devem se voltar para a identificação e punição de quem está colocando fogo na mata.

Tal comportamento deveria ser inibido, mas não é por três razões principais. Um estudo recente do Greenpeace, em 478 propriedades onde se registraram focos de incêndio no chamado "Dia do Fogo" —quando, em agosto de 2019, grupos ruralistas combinaram queimadas em série na Amazônia—, mostrou que apenas 10% delas receberam multas relacionadas a queimadas ilegais, e muitas continuam sendo beneficiadas com recursos do crédito rural.

Ou seja, as instituições governamentais —que deveriam aplicar multas— e os bancos —incluindo o Banco do Brasil, que decidem para quem conceder crédito— são coniventes com os criminosos. Além das dificuldades atuais, o Congresso, onde são numerosos os tais membros da "bancada do boi", há mais de 25 projetos que pretendem tornar mais flexíveis as leis ambientais, sendo que 8 avançaram inclusive durante o período da tragédia das chuvas no Sul. E há mais de uma centena esperando para serem colocados em pauta. Ou seja, se a legislação atual não é aplicada, imagine como ficará a situação com a tal "flexibilização".

O Brasil tem um modelo econômico baseado na exportação de commodities, como carnes, grãos e minérios, que estão entre os produtos de menor valor agregado do mundo —mesmo quando produzidos com alta tecnologia, como é o nosso caso com boa parte do agronegócio.

Os defensores desse modelo estão cada vez mais poderosos, controlando a política e até mesmo a opinião pública. Vendem a ideia de que esse modelo econômico é nossa melhor opção.

O resultado é que o Brasil, na contramão do planeta, vive um processo de desindustrialização, baixo investimento em educação e capacitação tecnológica, e uma visão extrativista comparável à dos exploradores que aqui chegaram há mais de 500 anos.

Não devemos ser contrários ao agronegócio. O Brasil pode, sim, ser o celeiro do mundo. Mas para isso não é necessário destruir mais biomas, como a Amazônia, que dariam um retorno muito maior com a exploração sustentável de seus frutos, essências e muitos outros produtos que são únicos e valiosos.

A sociedade brasileira, portanto, está refém de um agronegócio que se desenvolve com base em um modelo retrógrado e insustentável. E estamos fazendo muito pouco para mudar isso. O atual governo parece ter boas intenções —no discurso. Mas o fato é que não houve mudança significativa em nenhum dos processos de degradação ambiental no país.

Até quando vamos agir assim? Não chegou o momento de compreendermos que a sustentabilidade é o caminho para um futuro melhor para todos nós? Por quanto tempo mais seremos o exemplo mais visível para o mundo de uma sociedade complacente com os danos ambientais?

Em breve teremos eleições municipais. É uma oportunidade para começarmos a virar esse jogo. Vote em quem vai lutar por uma economia mais moderna e sustentável. Senão por outro motivo, porque sua vida e seu futuro dependem disso.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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