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REFLEXÃO


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urbanidade
17/11/2004
Paz pela culatra

Os irmãos Sylvia e Djay Campos são os personagens ocultos da história de um dos mais interessantes símbolos já criados na cidade de São Paulo na guerra contra a violência. No próximo sábado, em Sapopemba, na zona leste da cidade, será inaugurada a primeira instalação de brinquedos feitos com o material das armas entregues ao governo por ocasião da campanha do desarmamento. O projeto seguirá para todas as capitais brasileiras.

Vindos do interior para São Paulo há 30 anos, Sylvia cursou direito, e Djay, sociologia. "Nunca mais quisemos voltar", diz Sylvia. Os dois trabalham na sede do Ministério da Cultura e, neste ano, foram provocados por um desafio: criar um símbolo para a campanha do desarmamento, lançada pelo governo federal.

Tiveram a idéia de transformar as 171 mil armas entregues ao governo em brinquedos a serem instalados em praças das capitais brasileiras. Devidamente derretidas e, depois, transformados em tubos, as armas passam a servir para produzir alegria. "Nem era preciso traduzir, o significado é óbvio."

Apresentado ao projeto, o ministro Gilberto Gil, que nem quis analisar a sua viabilidade, mandou executá-lo, sem fazer idéia da cadeia de produção que essa operação demandaria do derretimento em lingotes aos tubos moldados nas gangorras e balanços, passando pelo design.

Faltava escolher o local. "Era natural que fosse um local marcado pela violência", diz Sylvia. Adicionou-se então mais um símbolo. A prefeitura estava, naquele momento, fazendo de um lixão de Sapopemba uma praça, onde crianças, em vez de trabalharem em meio a restos podres, iriam se divertir. "O local não poderia ser mais apropriado."

Fechou-se, assim, um círculo completo de símbolos. No lugar do lixo, uma praça. A periferia, marginal, torna-se espaço de inclusão. No lugar das armas, brinquedos. A praça é um metáfora pronta e dispensaria qualquer discurso das autoridades para explicá-la, mas, no próximo sábado, não faltarão autoridades federais, estaduais e municipais para a sua inauguração.

Sylvia e Djay estariam lá, longe dos palanques, misturados, anônimos, à platéia. Nem queriam aparecer nesta coluna. Sylvia insistiu em que não citasse seu nome e escrevesse apenas sobre a campanha do desarmamento. "Fomos um detalhe sem importância. Escreva sobre a cultura da paz", sugeriu, satisfeita por ter, mesmo que anonimamente, de deixar uma marca na cidade que a acolheu.

Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, na editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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