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urbanidade
21/03/2007
I hate São Paulo

São Paulo era o cenário das dores e conflitos, gerando uma relação de ódio e amor - relação que ele cultivou



Dardo Toledo Barros tinha dez anos de idade quando recebeu a notícia de que seu pai, Luís Álvaro, sofrera um infarto fulminante. Nunca entendeu por que não esteve no enterro. A descoberta veio muito tempo depois. "Senti como se fosse a segunda morte dele." A razão do choque: a causa da morte não foi infarto, mas suicídio.
Desde esse momento, ele começou a investigar as razões que levaram seu pai a se matar, deparando-se com uma sucessão de surpresas - o suicídio fora motivado por razões políticas. Essas descobertas serviram de inspiração para um filme, previsto para ser lançado em abril, intitulado "I Hate São Paulo" (Eu Odeio São Paulo). "Foi o jeito que eu encontrei de ordenar minha confusão emocional." Ex-estudante do Colégio Santa Cruz, Dardo, 48 anos, estudou filosofia e administração de empresas.

Desde os 14 anos ele já investia no mercado financeiro. No final da década de 90, mudou-se para Nova York, onde vive até hoje, e montou um pequeno banco de investimentos, no qual um dos produtos é uma linha de crédito para o cinema. "Sempre adorei cinema", conta Dardo, que integra a geração de paulistanos que freqüentavam o cine Bijou ("não barravam menores de 18 anos") e o Belas Artes, além de esperar ansiosamente a chegada da mostra internacional de cinema.

Nas entrevistas com familiares e amigos do pai, um simpatizante comunista, Dardo percebeu como a pressão dos tempos do regime militar, as prisões e as torturas compuseram um drama psicológico que resultou no suicídio. São Paulo era o cenário das dores e conflitos, gerando uma relação de ódio e amor pela cidade - uma relação que Dardo também cultivou e que o levou até Nova York, onde se inventou a palavra amor trocada por um coração, inspiração para o título de seu filme. Ele vem quase todos os meses a São Paulo e encontra seus amigos - os ex-colegas do Santa Cruz encontram-se com periodicidade. "Gostar dos meus amigos é gostar de São Paulo." Dardo aprecia a diversidade nova-iorquina, o prazer de andar em ruas seguras, a efervescência cultural, mas não sente o acolhimento das amizades paulistanas. Mas, para ele, São Paulo, além dos encantos da juventude com suas salas de cinema, também foi o cenário da perda precoce do pai, da degradação urbana e da violência.

Esses elementos - inclusive o investidor do mercado financeiro que faz um filme - entraram no roteiro, no qual a cidade é um dos principais personagens. Ao imaginar onde iria lançar o filme, que vai entrar em circuito comercial, veio-lhe na cabeça a cidade que ama - o lançamento será no Colégio Santa Cruz, cercado por seus amigos.


Assista cenas do filme

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Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
 
 
 

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