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inclusão social
13/10/2004

ONG paulista investe no esporte para a integração do deficiente físico

"Senhora, essa doença não pega. Deixa a menina me tocar. Eu tinha apenas um ano a mais que sua filha quando fiquei assim". Essa foi a resposta de Larissa para a mãe da criança que sentia curiosidade em conhecer aquela menina em cadeira de rodas no shopping. Preconceito e Dificuldade são marcas que rodeiam mundo do portador de deficiência física, mas projetos esportivos procuram trabalhar o processo de inclusão social.

A jovem Larissa Blasco Leme, estudante do 1º ano do Ensino Médio, era uma menina "normal" até os nove anos. Após um sério acidente de carro, Larissa sofreu uma lesão medular e ficou paraplégica, perdeu o pai e a avó. Sua mãe, a dona-de-casa Benedita Aparecida Leme, conhecida entre os amigos como dona Santa, fraturou a perna (na região do fêmur) e o quadril no lado esquerdo. Passou por várias cirurgias e hoje usa bengala.

Através das idas a AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), dona Santa conheceu o trabalho da Associação de Desportistas de Deficientes (ADD) e sua filha Larissa ingressou na primeira turma para praticar basquete.

ADD é uma instituição sem fins lucrativos, criada em 1996, sob os ideais do professor de educação física Steven Dubner e da administradora Eliane Miada, voltada para o desenvolvimento do portador de necessidades especiais, por meio do esporte e da educação, resgatando a auto-estima, integração e inclusão social. Em 2003, a ADD abriu uma filial em Uberlândia (MG). Mais de 1600 pessoas praticam basquete em cadeiras de rodas, atletismo e natação.

A estudante participa do Programa Crianças da ADD, criada em 2001, que impulsiona a prática de esporte entre crianças portadoras de deficiência, possibilitando a descoberta de seu potencial ao ultrapassar barreiras além do aspecto físico como a parte psicológica. O programa apresenta duas modalidades: basquete em cadeira de rodas e natação.

"Os resultados são positivos em relação ao estigma que ainda impera na sociedade como reflexo da falta de informação. Não arrisco em dizer que ainda haja exclusão, mas uma inclusão marginalizada, pois são poucos os locais que agregam todos, sem a necessidade de reserva de cotas ou de programa de sensibilização", diz Eliane Lemos, coordenadora do Programa Crianças.

Até dona Santa se animou quando sua filha ingressou na ADD já que começou a ver que não era a única que enfrentava aquela situação e fez novas amizades com as mães dos outros jogadores. "Minha cabeça mudou. A gente tem dificuldade, mas agora sei encarar, batalhar e aprendi a conviver com meus problemas", declara dona Santa.

Já Larissa, somente descobriu o mundo do portador de deficiência através da associação. "Me perguntava porque todos ficavam me olhando. Eu sou a mesma, penso as mesmas coisas que os outros. A diferença é que estou sentada numa cadeira. Me senti mal quando algumas amigas da escola viraram a cara. Não sei se foi por medo ou outra coisa. Mas não fui eu quem saiu perdendo". Além do basquete aos sábados, a jovem freqüenta cinemas, shoppings e até uma casa noturna no bairro da Vila Olímpia. "É engraçado quando o pessoal está dançando e nunca espera ver alguém em cadeira de rodas em plena balada", conta a jovem jogadora.

De acordo com a coordenadora do Programa Criança, este trabalho é resultado da preocupação com as novas gerações que contavam apenas com a reabilitação física e devido à dificuldade que os deficientes adultos têm em conseguir emprego. Um dos objetivos é a integração de uma escola de qualidade e a prática de esporte, fortalecendo a auto-estima da criança e a aceitação de si mesma.

Outro jogador do Programa Criança é Wesley Ventura Campos, 10, que adora conversar e testar seu limite com os rodopios na cadeira de rodas. Aos cinco anos de vida, operou e apresentou hidrocefalia. Ele apresenta todos os movimentos, mas tem uma certa dificuldade para se locomover. "As pessoas ficam olhando o jeito de caminhar e o fato de usar fralda, já que tem incontinência urinária. Ele sentia vergonha dos amigos na escola, mas quando começou a freqüentar a ADD ficou mais seguro, porque via que não era só ele que tinha problemas e começou a encarar de uma forma diferente. Lá (no treino da ADD) é um clubinho. É uma mãe ligando para outra combinando de se encontrar no treino", diz a mãe de Wesley, Cleusa Ventura da Silva.

Wesley conheceu o trabalho da ADD por meio da inspetora de sua escola que o convidou para fazer parte da equipe de basquete. Além de aprender basquete, teve que aprender a manusear a cadeira de rodas. Hoje, o final de semana é para o basquete. "É muito bom basquete. Todo deficiente tem que praticar algum esporte. As pessoas que não tem deficiência se acham melhor que nós, deficientes. O que não é verdade", afirma Wesley.

O Programa Criança propõe que todos os participantes tenham bolsas de estudo nas melhores escolas de São Paulo. Atualmente o programa conta com a parceria dos colégios Madre Cabrini, Pueri Domus e Teresa Valsee (MG)."Não basta apenas incluir, há de se realizar a integração entre as pessoas", conclui a coordenadora da ADD.

A ADD procura profissionalizar a prática esportiva. O time Magic Hands é considerado um dos melhores de São Paulo, já que possui jogadores da Seleção Brasileira de Basquete. A equipe adulta é formada por 15 atletas que treinam quatro vezes por semana. O técnico Sileno Santos, que acompanha o time há um ano e meio, fala que os cuidados para treinar um time de portadores de deficiência física são os mesmos que se teria com qualquer outra equipe. "É necessário disciplina, empenho, organização e respeito". Mas aponta que uma das maiores dificuldades do deficiente é a locomoção. "É muito difícil se locomover em São Paulo, assim como no Brasil", avalia o treinador.

Já os jogadores vêm o basquete como algo essencial em suas vidas. O pivô Erick Epaminondas Silva, 26, joga há nove anos e começou em sua cidade natal, Recife (PE). Iniciou sua carreira na ADDF (Associação Desportiva de Deficientes Físicos de Pernambuco) e através de um amigo de São Paulo conheceu o trabalho da ADD, ingressando para o Magic Hands. "O basquete é minha profissão. É essencial", afirma Erick.

Thiago Fernando de Oliveira, 26, que atua como ala ou armador do time, joga há 12 anos. Antes praticava o basquete em alguns clubes de Campinas e São José dos Campos. Em 2002, entrou para o Magic Hands. Para ele, o esporte é "saúde, integração, tudo". Os dois jogadores participaram pela primeira vez das Paraolimpíadas deste ano, em Atenas, na Grécia. Apesar de não ganharem nenhuma medalha, foi uma grande experiência e responsabilidade em representar o Brasil.

O Magic Hands participa dos Campeonatos mais importantes do país, como o Paulista, o Brasileiro, Copa Brasil, Paraolimpíada de São Paulo, Torneio do Estado de São Paulo e Campeonato Sul Americano de Clubes e outros. Além da equipe adulta de basquete, a ADD incentiva o atleta individual por meio do Projeto Atletas Individuais, nas seguintes modalidades: atletismo, surf, ciclismo tandem e escalada.

Inclusão digital e educação
Além de esporte, a ADD tem o ADD Training, que ensina informática básica para portadores de deficiência. Todos os alunos que participam do curso são encaminhados para as empresas patrocinadoras que desenvolvem o processo de recrutamento e seleção desses alunos e contratam aqueles que possuem as características para as vagas existentes. "Durante a aula de Internet, ele aprende a se cadastrar nos sites das empresas que possuem vagas assim o aprendizado passa a ter significado e ele compreende que é possível mudar, desde que se comprometa com essa mudança", esclarece a coordenadora da ADD.

As aulas são realizadas na própria sede da ADD, em São Paulo, quatro vezes por semana. A associação também promove cursos para complementação da renda familiar, como artesanato e culinária e outros.

A luta pela inclusão
Segundo censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), realizado em 2000, o Brasil apresenta 1,5 milhões deficientes físicos, enquanto a Organização Mundial de Saúde (OMS), estima que 10% da população de países desenvolvidos tem alguma deficiência. Os países em desenvolvimento estão entre 12 e 15%. Destes, 20% seriam portadores de deficiência física.

O Conselho Estadual do Portador de Deficiência orienta e cobra do governo a política pública ao deficiente, com base na lei nº 7.853, implantada em 1999, que dá apoio a pessoas portadoras de deficiência, defendendo sua integração social. A Coordenadoria Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência institui a viabilização de interesses coletivos dessas pessoas.

Segundo Ana Leonor, vice-presidente do Conselho Estadual do Portador de Deficiência do Estado de São Paulo (CEAPPD), a inclusão social não é resolvida apenas pelo Conselho, mas pela união das entidades, Conselho e a própria comunidade. "Hoje, eu sinto que as pessoas estão mais conscientes. Não querem mais distância do deficiente. Saiu aquela imagem de piedade para o portador de deficiência e entra a questão da inclusão social. A cadeira de rodas não é mais uma doação, mas faz parte de um atendimento de saúde", afirma Ana Leonor.

Os municípios também podem estar se mobilizando para discutir as necessidades locais de cada região no Conselho Municipal Para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência. O objetivo é direcionar projetos do município por meio da união entre entidades, portadores de deficiência e a comunidade.

Vera Lúcia Leite de Oliveira, membro da Comissão do Portador de Deficiência da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) e presidente do Conselho Municipal de Osasco Para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência, pegou poliomielite (conhecida como paralisia infantil) aos três anos, o que comprometeu a perna direita que apresenta uma diferença de 1,5 cm. Utiliza aparelho ortopédico para se locomover. Pelo fato de ser deficiente física, abraçou a causa da luta para inclusão do deficiente, cursando faculdade de Direito.

Filha de metalúrgico e dona-de-casa, Vera foi a primeira deficiente a comprar o carro com isenção do IPVA. "Foi uma vitória muito grande a isenção do IPVA e a própria compra já que o deficiente tem a relação de dependência para se movimentar. Veio uma sensação de liberdade", conta Vera.

Atualmente, Vera vê um aumento em trabalhos sociais para este público, mas nota uma falta de capacitação profissional para incluí-lo no mercado de trabalho. Ela acredita na interação maior entre sindicato, associação e OAB no processo de inclusão. No entanto, percebe que muitas empresas ainda têm receio em contratar um funcionário deficiente, porque os contratantes pautam-se pela aparência e ficam em dúvida em relação à competência do candidato.

"O importante é buscar soluções, não excluir. Não adianta ficar com o currículo parado. Se a pessoa pode fazer e empenhar a função, ela poderá ocupar a vaga", afirma Vera Lúcia.

O Fórum Permanente da Região-Oeste é uma das atividades do Conselho Municipal de Osasco Para Assuntos da Pessoa Portadora de Deficiência, que visa reunir os vários pólos interessados em solucionar a questão do deficiente do município e regiões vizinhas. Ocorre uma vez por mês e o evento está aumentando cada vez mais. Na última reunião, contou com 13 representantes de municípios. São eles: Osasco, Carapicuíba, Cotia, Barueri, Santana do Parnaíba, São Lourenço, Juquitiba, Embu das Artes, Embu-Guaçú, Taboão da Serra, Varginha Grande Paulista, Pirapora e Jandira. A próxima reunião ocorrerá dia 30 de outubro.

Dentro dos Conselhos Estaduais, existem várias comissões com núcleos regionais como é o caso do Fórum que trabalha as necessidades específicas dos municípios participantes. "O trabalho dos Conselhos mobiliza a inclusão em nível estadual e municipal. A partir daí, os projetos de entidades e do próprio deficiente se tornarão mais direcionados. É uma interação positiva em prol de uma causa", defende Vera Lúcia.

ADD
Avenida Jandira, 1111 – Planalto Paulista
São Paulo, SP- CEP 04080-006
Tel. (011) 5052-9944

ADD Uberlândia
Rua Barão de Camargos, 263 – Centro – Uberlândia – MG
CEP: 384000-160
Tel: (0XX34) 3229-6517/9102-9181/9106-4511/9992-5604 falar com Tânia Lima, Guiomar Santos Leandro e Adriana Afonso
e-mail: uberlândia@add.org.br; esporteudi@add.org.br;psicologiaudi@add.org.br

 

SUSANA SARMIENTO
do site Setor3

 
 
 

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