UOL
       
 
Página inicial

Paranóia ou mistificação?

O novo está morto

Ventos de mudança

Os novíssimos

Customização já

O messias da moda

As roupas do futuro

Coisa de macho

A alta-costura vive



 
Eduardo Knapp/Folha Imagem
Vestidos termocrômicos, que mudam de cor conforme a termperatura varia, do desfile de verão de Alexandre Herchcovitch, em junho último, em São Paulo

As roupas do futuro

Tecnoestilos dominam a moda e a ciência, privilegiam troca de informação e imitam a natureza

JIM PLETCHER
DA “TANK”


Por que as pessoas do futuro se vestem tão mal? Usam uniformes minimalistas de uma supragaláxia ou sobras de roupas de um filme B, que não cabem direito. Tecidos modernos não mudam apenas a aparência das roupas, mas a forma pela qual elas são sentidas, seus sabores e seus cheiros.

Há uma grande possibilidade de que, no futuro, as pessoas não usem nenhuma roupa. Elas poderão vestir casas, computadores, cartões de visita, até mesmo telefones. As roupas do futuro vão trocar informações com um computador e transmitir suas necessidades e desejos para as paredes de sua casa, para seu carro ou mesmo para seu parceiro.

Isso não é ficção científica, mas pesquisa e desenvolvimento atuais. Fechaduras que funcionam por meio de impressões digitais e equipamentos ativados por voz são parte de um mundo interativo em desenvolvimento. Há paredes que podem medir sua temperatura e fazer os ajustes adequados, aquecendo ou resfriando o ambiente.

Tecnoestilos e fibras do futuro estão sendo usados na moda e na ciência. Muitos estão por aí há tanto tempo que ninguém mais presta atenção: o náilon (usado em meia-calças de balé), o plástico (em chinelos), a Lycra (em bodies), os aveludados (em macacões)... As décadas se caracterizam pelos seus sintéticos, como os anos 70 pelo poliéster. A novíssima leva de materiais foi desenvolvida para fazer mais do que sobreviver a várias lavagens ou remoções de manchas.

O novo vocabulário
Para entender os tecnoestilos, um vocabulário novo foi desenvolvido. Híbridos são tecidos parte flexíveis, parte não-tecidos, com materiais como vidro, carbono e cobre. Tecidos não-lavados são aqueles em que as fibras são orientadas a esmo, como espumas e borrachas. Geossintéticos são materiais porosos ou flexíveis, usados dentro do solo ou sobre ele. Mas as mais importantes são as microfibras, segundo as autoras Sarah E. Braddock e Marie O’Mahony no definitivo livro “Technotextiles”. Esses fios, de origem sintética ou natural, são distribuídos em pequenas mechas para produzir uma trama mais fina _mas mais forte_ do que o normal.

Tudo isso envolve a manipulação da estrutura molecular do material, para maximizar as qualidades de seu desempenho, como força, resistência à formação de rugas e leveza. O importante é que essas tecnologias levam a acabamentos que podem ser termocrômicos (cores estimuladas pela temperatura), antibacterianos, desodorantes, de alta sensibilidade ou de proteção contra raios ultravioleta.

A biomética _biologia mais mimetismo_ se tornou possível por causa desses avanços. Os tecidos respondem aos espelhos ambientais, ou, de modo mais simples, ao design natural. Isso não é novo na moda. As pessoas inicialmente vestiam peles de animais porque elas esquentavam. Hoje, foram substituídas por materiais como o Polartec, de garrafas de refrigerantes.

“Em 600 milhões de anos de pesquisas e desenhos, a natureza deve ter achado as respostas para os problemas do design”, diz a especialista Colina Dawson no simpósio “Qual o Futuro dos Tecidos”, organizado pela escola inglesa Central St. Martins.

Sobre as roupas militares, por exemplo, Dawson diz que os exércitos querem que os soldados usem uniformes que possam se adaptar automaticamente a diferentes condições climáticas. Uma pesquisa começou por examinar materiais naturais: pêlos, penas e os pequenos poros em cones de pinho. Foram esses últimos que chamaram a atenção, por abrir e fechar diante de variados níveis de umidade. Nos tecidos, essa tecnologia deve estar disponível em 2001, em malhas com aberturas quase invisíveis entre as fibras.

Ficção científica
Fora do mundo da moda, conforme cresce a exigência por materiais biométicos, algumas descrições desafiam a ficção científica. Apesar de o lurex (feito de alumínio) existir há muitas décadas, os metálicos são outro “novo” avanço tecnológico. Tecnologias recentes produzem metais híbridos que podem ser aprimorados para seu conforto e conveniência. Um grupo do MIT (Instituto de Tecnologia de Massachusetts, na sigla em inglês) desenvolveu um tecido resistente ao desgaste, até mesmo quando usado como luva de forno.

A Phillips traz sua “telejaqueta”, que desenvolve o conceito de “área de rede pessoal”, segundo Jack Mama, diretor de criação da empresa. “Numa noite de um futuro não muito distante, devidamente implantados, órgãos eletrônicos conectados às redes de seu corpo serão um lugar-comum como o algodão; sua infra-estrutura íntima o conectará a um planeta cheio de bits, e você terá um software em suas roupas íntimas”, prevê W. J. Mitchell, da consultoria City of Bits. O fato de estarem tão conectadas pode tornar as pessoas mais livres ou mais restritas. A questão de quanta informação seria prudente ou confortável carregarmos conosco deve ser considerada cuidadosamente pelos estilistas.

Os novos híbridos não-trançados, geossintéticos e microfibras dizem respeito a uma única coisa: troca de informações. Um tecido feito de casquinhas de siris libera bactericidas à medida que for necessário. Outros podem ser programados para liberar doses de vitamina ou desodorante e, presumivelmente, remédios.

Provavelmente, há espaço para tecidos ou itens _como adesivos de nicotina_ para pessoas que se esquecem de tomar seus remédios.

Mas quanto tempo ainda vai demorar para que sejam adaptados às ruas?
Tecidos que respondem ao calor interagem com a temperatura ambiente e corporal. Quer que seu top reflita mudanças de humor de minuto em minuto? Tente um acabamento que muda de cor, reagindo a certos elementos químicos produzidos pelo corpo em resposta aos estímulos.

É isso que as matérias-primas fazem há muito tempo. Os detectores de metal não são nada mais do que scanners de informação, assim como os raios X. A diferença é que produzem informações brutas. Os novos tecidos fazem muito mais do que isso: interpretam e reagem. O grande medo de muito cientistas futuristas é que a civilização do futuro seja uma sociedade sem rosto, com nomes substituídos por números, salas com compartimentos para dormir e sexo virtual.

Mas os medos de conformidade parecem equivocados diante da geração de tecidos que vem por aí. Os novos materiais prometem um grau de auto-identificação e customização nunca antes possível: a Nike poderá fazer uma imagem digital dos seus pés e lhes dar um tratamento específico. Se você não quer que suas emoções mais profundas sejam reveladas pelas suas roupas, deve prestar atenção em como a moda utiliza esses materiais. Ou acabaremos nos vestindo como as pessoas do futuro.

Tradução de Ronald Villardo


Leia mais: No Brasil