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TRABALHO
Vale tudo para
subir
Técnica
do “outdoor training”, método radical de RH, coloca os funcionários
em situações limite ao ar livre e tenta fazer analogia com
o cotidiano da empresa
LUÍS
SOUZA
DA EQUIPE DE TRAINEES
Matuiti
Mayezo/Folha Imagem
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Participante
de curso de "outdoor training" salta de plataforma a 8 metros
do solo |
A O grupo de executivos não parecia estar em forma, tamanha a dificuldade
de subir na árvore por uma escada de corda e tocos pregados no
tronco, para chegar à plataforma a oito metros do solo. Todos usavam
capacete e um colete preso a uma corda por um mosquetão
(anel com trava dupla). Tudo isso para balançar a corda de um sino,
1,5 m à frente.
O nome do exercício é badalando. É quase
obrigatório em atividades conhecidas como outdoor training,
que andam na moda entre empresas que querem inovar, como diz
o francês Jean-Claude Razel, da Alaya Expedições,
aberta em 96.
A corda presa ao colete tem um freio, que, sozinho, não resolve.
Quem evita a queda é o belay, o responsável
pela segurança. Segundo Thomaz Brandolin, alpinista e belay,
se houver falha, quem salta se esborracha. Por isso,
somos supertreinados.
Brandolin é, desde 97, dono de uma das empresas que vendem programas
de outdoor training, o método que usa atividades ao
ar livre para capacitar executivos.
O objetivo declarado é melhorar, por analogias entre as atividades
e o dia-a-dia da firma, o trabalho em grupo, a liderança e a superação
de limites. O treinamento conta como dia trabalhado.
Uma prova de que o método está na moda é o fato da
Getronics, multinacional do ramo de tecnologia, ter instituído
o dia da aventura. Nele, os funcionários são
convidados a fazer uma atividade considerada desafiadora,
subsidiada pela empresa.
José Luís Marques, diretor de Recursos Humanos (RH) da Getronics,
diz acreditar que a dinâmica em grupo tradicional está batida.
Ele já levou funcionários para praticar trapézio
e corda bamba em uma escola de circo.
Quase tudo em inglês
O uso de termos em inglês no outdoor training ajuda
a dar impressão de modernidade. Até as expressões
em português, como facilitador (não-dicionarizada
no Aurélio) precisam de tradução para
o leigo.
Glossário rápido: facilitador é quem
conduz as atividades; debriefing é uma reunião
logo após os exercícios; zona de conforto se
refere a uma área ou contexto ao qual se está acostumado.
As atividades podem ser feitas num campus, local com acomodações
e área verde adequada que tenha, por exemplo, árvores especialmente
preparadas.
Idéia patenteada
O outdoor training chegou ao Brasil em 1992, quando o americano
Paul Campbell Dinsmore criou e patenteou o Teal (treinamento
experiencial ao ar livre).
De lá para cá, a demanda tem aumentado. Surgiram mais empresas
na área. Júlio Bin, que abriu a Gecko Outdoor Consulting
em setembro do ano passado, diz ter percebido não um nicho, mas
um rombo no mercado.
Esse tipo de treinamento nasceu durante a Segunda Guerra Mundial, criado
pelo pedagogo alemão Kurt Hahn (1886 -1974). Ele era adepto da
educação experiencial, que prega a vivência como melhor
tipo de aprendizado.
Refugiado na Inglaterra, Hahn elaborou um treinamento ao ar livre para
a Marinha britânica que simulava as dificuldades do combate. Pretendia
melhorar a capacidade dos marinheiros para lidar com situações
de risco.
O método fez sucesso. Correu o mundo e começou a ser usado
com executivos nos EUA e na Europa nos anos 70. Hoje, apesar de não
ser difundido no Brasil, há uma vasta bibliografia em inglês.
Os programas que contam com o exercício badalando não
são os que mais se baseiam no risco. Isso fica para o Wilderness,
radical quando se trata de tirar participantes da zona de conforto.
No Wilderness, os executivos são levados para um ambiente
adverso. Ficam em alojamentos rústicos ou acampamento, nos
quais tomam parte em tudo, desde as barracas até a comida.
São simuladas situações de incerteza, como deixar
o grupo na mata com uma bússola. Pratica-se algum esporte radical.
Não há tempo em sala de aula, só o debriefing,
no local da atividade.
Ser alguém
Quase todos os executivos têm problemas para completar os exercícios
do treinamento. No badalando do qual a reportagem da Folha
participou, todos pularam após algum tempo, mas muitos não
tocaram o sino.
A analista de RH da Unidas Rent a Car, Renata Murari, chorava ao chegar
ao chão. Eu pensei na minha família, fiquei com medo
de nunca mais vê-la. Mas pensei que, se não fizesse isso,
não seria ninguém, disse.
Do chão, o exercício não parece ser tão difícil
ou arriscado. As dificuldades dos outros parecem superdimensionadas.
Quando chega o momento de pular, tudo muda. Subir na árvore é
um pouco desconfortável, mas é o mais fácil. Na plataforma
é que se sente o risco e o desafio.
Lá em cima, é o participante, o sino e o ar. Como disse
um deles durante o debriefing: Dá para sentir
na pele o individualismo. Era o camarada sozinho no alto da plataforma.
Por mais que se tenha visto todos pulando e se tenha ouvido sobre os equipamentos
de segurança, é quase impossível não vacilar.
Por que as pessoas pulam? Talvez porque o grupo incentiva, ou o participante
anterior conseguiu. Talvez pelo desafio.
Para Paul Dinsmore, o momento do pulo é o mais interessante. A
plataforma é estável, mas a situação é
instável. Tem de ser tomada a decisão de se lançar
para o risco ou não. A pessoa tem de vencer um obstáculo.
Renata Murari, da Unidas, afirmou ter sentido uma sensação
de equilíbrio e controle ao pisar no solo. Eu senti mais
alívio e o coração batendo mais forte, disse.
Ao final, os executivos pareciam estar se sentindo mais capazes e felizes.
A maioria, que três dias atrás não se conhecia, conversava
como se todos fossem amigos.
Resta saber se sobreviverão _como amigos_ no escritório.
Leia mais: Dois trabalhadores morrem por minuto
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