Paulo Daudt Marinho, 41, está na linha de frente da aproximação do Grupo Globo, o maior conglomerado de mídia do país, com o ambiente digital —com as plataformas concorrentes por publicidade e usuários, como Google, Facebook e Twitter.
Em entrevista em São Paulo, descreve a estratégia que vem implementando através do Viu, unidade criada há um ano e meio para projetos de internet, que lança na quarta (18) sua primeira iniciativa unicamente digital, desligada dos canais de TV.
É o primeiro passo de um esforço amplo que, como a Folha apurou, incluirá parceria com Google e Bradesco. Ele comenta também o futuro serviço de streaming semelhante à Netflix, reunindo Globosat e Rede Globo.
Encabeçando ações como o canal infantil Gloob, ele é um dos dois netos de Roberto Marinho (1904-2003) em função executiva no grupo —o outro é o seu primo Roberto Marinho Neto, que dirige a unidade de esportes.
A geração de seu pai, José Roberto, e dos tios Roberto Irineu e João Roberto vem se afastando do comando executivo para o Conselho de Administração, de caráter estratégico, onde os dois primos também têm assento.
Folha - Vocês vão lançar o primeiro projeto desligado dos canais, com [a celebridade de Snapchat] Thaynara OG. Quais são os próximos passos?
Paulo Daudt Marinho - Vou dar um passo atrás. A Viu nasceu tem um ano e meio, com foco em desenvolvimento de projetos digitais, trabalhando, por um lado, com esse mercado de influenciadores e trabalhando muito com plataformas de terceiros. Com YouTube, Facebook, todas as demais de mídia social ou de distribuição de conteúdo. [A Viu Visa] entender esse modelo de negócios, como é que a gente cria algum negócio sustentável em torno disso e como é que integra com a televisão.
Mas também não se restringe a isso. Também tem o objetivo de criar projetos originais, que convivam só no ambiente digital. A Thaynara vem dentro desse escopo, de criar um projeto digital original.
Vai ser um teste?
É parte da estratégia mesmo, o teste fica por conta de, de repente, dar certo ou não. Mas é o primeiro puramente digital, a gente pretende avançar bastante nessa frente.
É só YouTube ou terá mais?
Depende muito do projeto, mas a gente não se limita a uma única plataforma. A gente normalmente trabalha de forma integrada, em termos de entrega comercial ou em termos de conteúdo mesmo. O YouTube é uma plataforma importante e onde está rodando a maior parte do conteúdo, mas o projeto vive, vamos dizer, num ecossistema social.
Tem uma diferença estratégica no fato de estar trabalhando numa plataforma que não é mais do Grupo Globo.
Sim. Sobre essa questão, de trabalhar com outras, não do grupo, a gente já tem grandes plataformas, que ainda dão bastante resultado, têm bastante relevância. Mas você também tem o ambiente onde os consumidores estão, consumindo muito conteúdo, notícia, seja o que for.
E a gente, enquanto empresa de mídia, tem o desafio de desenvolver e construir negócios dentro desses outros ambientes. É importante estar se conectando com nosso público, com o consumidor, onde estiver. Esse é o pano de fundo para atuar em plataformas que a gente não controla.
No caso do YouTube, ele é um concorrente direto por publicidade. Como é feito esse acerto? Tem que ceder às regras do Google ou negociar?
Bom, é a nova dinâmica de mídia. O difícil, por um lado, mas ao mesmo tempo uma realidade, é que em alguns momentos você trabalha com o concorrente também.
"Frenemies".
É, o famoso "frenemy" [friend/enemy, amigo/inimigo]. Ouvi outro dia o termo abrasileirado, "coopetidor". A gente vive essa dinâmica hoje em dia, mas é claro que, para você atuar ali de forma consistente, com um olhar também de monetizar, de ter projetos comerciais ali, isso passa por uma conversa, um entendimento entre as partes. E por algum tipo de acordo, para poder trabalhar de forma efetiva dentro da plataforma.
Há um projeto em andamento com o Google e o Bradesco. Já é um passo seguinte?
É um passo seguinte, na construção. Esse já foi o caso do Lollapalooza. Tinha transmissão no canal Multishow e também no YouTube. A gente empacota tudo numa oferta conjunta. Vendemos todas as cotas [de publicidade] desse projeto. O Bradesco já era patrocinador do canal no Lolla, pintou a oportunidade de a gente criar mais uma cota e o Bradesco se interessou. Aí foi a primeira vez em que a gente abordou e vendeu para um cliente de forma conjunta.
Google e...
...Globosat.
No começo do mês, o diretor da Fox América Latina falou da negociação para a Globosat lançar um serviço incluindo o Telecine, no qual ela também é sócia. Em que pé está?
Bom, não vou poder me aprofundar. Mas, se a gente entende o contexto de mercado, todas as empresas de mídia estão de alguma forma caminhando para também distribuir seu conteúdo direto ao consumidor. Seus canais e coisas desse tipo. Seria natural um processo no qual também o Grupo Globo pensaria em alternativas nessa frente.
Não tem nada de novo sobre a empresa formada por Globo e Globosat na virada do ano?
A gente tem o Globo Play no ar, e a gente espera evoluir com esse produto.
De maneira geral, em que momento estamos na mudança [da TV para o streaming]?
Não vai ser um processo tão radical. A gente está num momento intermediário, em que muita acomodação vai acontecendo. Mas não existe uma coisa ou outra, e sim a convivência de diferentes ambientes. É um paralelo com o que está acontecendo [na relação com as plataformas], não vai ser só via operadora [de TV paga] ou só direto ao consumidor. As coisas se somam. A distribuição no canal linear, via operadoras, é um negócio ainda extremamente relevante, com muito potencial ainda. Então não acho que uma coisa vá destruir a outra.
Mas exige estratégia muito diferente de quando se tem a própria plataforma.
Claro.
Você está na linha de frente disso. Tem que negociar não só com Google mas com os chamados influenciadores.
Claro, é parte. Vou voltar no que acabei de falar. Os modelos mais tradicionais continuam com sua relevância ou com um bom grau de relevância. Ele precisam se aprimorar também, se aperfeiçoar, e conviver com outros. Quando a gente bota de pé algo como a Viu, a ideia é: vamos entender melhor e buscar negócios sustentáveis, que somem ao que a gente já vinha fazendo muito bem. Essa é a estratégia.
A gente vem evoluindo de forma interessante na Globosat, colocando no mercado projetos comerciais cada vez mais sólidos, integrando TV, nossos Plays, os sites dos canais e as plataformas em que a gente não é dono, mas controla o modelo de negócios que está operando lá dentro.
Outra plataforma concorrente é o Facebook, que está em meio a um grande questionamento. Como vocês trabalham? É semelhante ao que já está avançado com o Google?
Está num estágio anterior. Sobre os problemas, acho que aí é uma grande oportunidade para uma empresa como a nossa. A partir do momento em que, mesmo trabalhando com outras plataformas, que a gente não controla, mas controla o conteúdo e o modelo de negócios, a gente dá garantia, por exemplo, aos anunciantes, de uma entrega segura, de um ambiente seguro para as marcas. Aí a gente consegue construir um modelo interessante em cima disso.
RAIO-X
Paulo Daudt Marinho
41 anos, nascido no Rio
Formação
Administração de empresas pela PUC-RJ, com MBA voltado para negócios em Barcelona, na Espanha
Carreira no grupo
Começou como estagiário de O Globo aos 21, atuando depois, entre outros, na rádio Globo e no Multishow. Criou o canal Gloob, em 2012, e hoje dirige o Viu Hub, unidade digital abrigada na Globosat
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