Descrição de chapéu Moda

Estilista da Hermès defende 'homem aberto' que renuncia ao logotipo

Véronique Nichanian ajuda a derrubar códigos que engessam moda masculina

Pedro Diniz
Paris

De 30 anos para cá a moda masculina passou de uma cartilha restrita, composta por costume de trabalho e conjunto de calça e camisa para fim de semana, a um mundo colorido de novas proporções. A francesa Véronique Nichanian, 64, pode se gabar de ter colaborado para essa abertura.

Em três décadas à frente do comando das coleções masculinas da Hermès, completadas neste ano, essa mulher de riso fácil e estilo sóbrio colaborou para derrubar ideias como a de que homem só deveria usar azul, preto e cinza.

Suas coleções são um híbrido de inovação têxtil, traduzida em tecidos texturizados e mesclas de materiais, e estampas posicionadas pontualmente sobre o corpo.

Não há nem sombra dos logotipos que fazem a cabeça de parcela do público fashionista, porque Nichanian não estaria, segundo ela mesma diz, falando a homens que precisam de marcas para se expressarem.

Chamada pelo setor de "alta sacerdotisa da moda masculina", Nichanian falou à Folha horas antes de seu desfile mais recente na semana de moda masculina de Paris, em janeiro.

Na passarela, ela criou um corredor tomado por fogueiras, entre as quais passearam looks que remetiam às linhas do horizonte da paisagem escocesa e exaltavam o principal ativo da marca, o couro. Leia a entrevista.

 

Limitações

Não é verdade que a moda masculina seja limitada. A diferença é que, na feminina, as expressões têm de ficar mais evidentes, frontais.

Para os homens, pensamos mais em proporções certas, nos ombros e na silhueta, e em tecidos. Nos últimos dez anos, conseguimos explorar mais os diferentes tipos de homens, de uma maneira mais criativa, sem limitações de julgamentos externos, como acontecia no século passado.

Os homens são muito diferentes entre si, mas costumam comprar uma única peça, não usam um conjunto total de uma única marca, porque respeitam a própria personalidade. Quando desço para o andar da loja, vejo homens de 17 anos em diante buscando elementos como lenço, sapato e casaco para compor um estilo.

Fashion x tradição

A noção de tradição é muito diferente para cada homem. Para uns, significa o costume clássico, para outros, a precisão da técnica e os detalhes da roupa.

Não faço fashionismo, coisas de que você gosta por seis meses, até ir atrás de outra coisa no semestre seguinte.

Isso acontece por uma questão comercial e entendo que, para os jovens, o tempo é uma preocupação, de estar sempre buscando algo novo. Mas meu trabalho é fazer peças que durem por muito tempo.

Gosto da ideia de criar roupas que durem 50 anos sem sair de moda. É outra atitude, que não quer dizer que não seja fashion, mas que não muda tão rápido no tempo do mercado. Não crio contra o tempo, mas para o tempo.

Comportamento

Entrei na moda masculina porque se encaixava com a minha concepção de trabalho, de trabalhar a perfeição dos tecidos, das formas e das cores.

Quando comecei na [grife] Cerruti [em 1976], havia a noção de que um homem sério deveria vestir costume para trabalhar e roupa casual para a sexta-feira. Se ele usasse estampa ou uma jaqueta [com padronagem] tartan, logo as pessoas o julgavam, diziam 'ah, esse é arquiteto' ou outra profissão vinculada à arte.

Hoje, você pode usar uma camiseta e ser um homem de negócios de sucesso. Para os ingleses, por exemplo, isso era inconcebível um tempo atrás.

Essa segmentação, ainda bem, não existe mais. Muito porque os homens estão mais confiantes, e a sociedade está mais aberta a reconhecer que ele pode explorar seu lado feminino sem preterir o masculino.

Conservadorismo

Não acho que a ascensão de um conservadorismo político vá influenciar a moda, porque hoje há muito mais informação, e as pessoas têm o próprio julgamento sobre os fatos, não se deixam influenciar tão facilmente.

Antes, dizia-se que homem precisava casar, vestir gravata para trabalhar. Havia muitos códigos a serem seguidos.

O casual e esporte convivem com novos materiais e posso, por exemplo, transformar conjuntos de ginástica em roupas para o dia sem que o homem seja visto como excêntrico.

Criação do luxo

O luxo é uma mistura de beleza e técnica, de explorar um mundo de materiais bonitos, inovação e tecnologia [têxtil].

Grande parte dos designers de moda feminina olham para a mesma direção, utilizam as mesmas expressões e códigos de um mesmo mundo, então prefiro criar a partir de uma visão personalista.

Mantenho a criatividade porque sou curiosa, viajo muito, analisando a arquitetura e a influência que tem na forma como as pessoas se vestem. Tenho a sorte de trabalhar numa grife que valoriza o detalhe e falar para um homem que não precisa usar um logo para se sentir confiante.

Comentários

Os comentários não representam a opinião do jornal; a responsabilidade é do autor da mensagem.