Pinacoteca se torna oficina para alfaiates e costureiros

Profissionais fazem parte de instalação de Laura Lima, exposta no Octógono do museu até outubro

Isabella Menon
São Paulo

O prédio de tijolos onde hoje funciona, na Luz, a Pinacoteca do Estado, já foi um dia sede de oficinas e ateliês —o local, erguido em 1900, foi projetado pelos arquitetos Ramos de Azevedo e Domiziano Rossi para o Liceu de Artes e Ofícios de São Paulo. 


Na década de 1910, época que a Pinacoteca foi criada, o Liceu começou a deixar o prédio, até desocupá-lo totalmente em 1932. 


Agora, a Pina Luz recorda o passado de trabalhos manuais com a instalação “Laura Lima - Alfaiataria”, que ocupa, a partir deste sábado (7), o Octógono, espaço dedicado a obras de arte contemporânea no primeiro andar do edifício. 


Além da relação com o passado, a artista vê um diálogo com o entorno. Ainda que não intencionalmente, diz ela, seu trabalho dialoga com o vizinho Bom Retiro, bairro conhecido por suas tradicionais oficinas de costura e confecções. 


No centro do museu, costureiros e alfaiates se dividirão em dois turnos. O visitante verá as obras feitas de tecido ganhando forma ao longo do tempo. 


“Há o estigma do mundo do entretenimento de que sempre temos que agradar o espectador. Aqui, a pessoa pode se sentir intrusa, por ocupar um local em que há pessoas trabalhando”, diz a artista Laura Lima. 

As obras produzidas por costureiros ao longo da mostra de Laura Lima serão expostas no Octógono 
As obras produzidas por costureiros ao longo da mostra de Laura Lima serão expostas no Octógono  - Divulgação

O trabalho, inédito no Brasil, deriva de outro, concebido em 2014. 


Naquele ano, Lima foi a Maastricht, na Holanda, a fim de receber um prêmio do Bonnefanten Museum, para o qual teve de idealizar um projeto. Nasceu assim “The Fifth Floor” (o quinto andar), em que alfaiates criavam ternos para molduras de madeira.


A artista costuma utilizar não só humanos, mas seres vivos em geral em seu trabalho, por se sentir tentada a mostrar a frequência das obras. 


Foi o caso de “Ágrafo” (2015), na galeria Luisa Strina, em São Paulo, em que gatos tinham à disposição de suas unhas obras embaladas. Ou em 2007, quando apresentou, no Centro Dragão do Mar, em Fortaleza, “Galinhas de Gala e Galinheiro de Gala”, em que penas alheias foram aplicadas a aves, o que lhe gerou acusações de maus-tratos aos animais.

Profissionais trabalham na versão holandesa da mostra de Laura Lima
Profissionais trabalham na versão holandesa da mostra de Laura Lima - Divulgação

Apesar da presença de seres vivos, Laura Lima não gosta de chamar seus trabalhos de performance. Para ela, rótulos costumam diminuir e restringir trabalhos. 


Desta vez, a instalação dialoga sobre o tempo e valor do trabalho. Como no caso da exposição holandesa, os alfaiates e costureiros darão vida a uma coleção de trajes confeccionados sobre molduras vazias, criando retratos abstratos. A ideia é que, até outubro, fiquem prontas cerca de 30 dessas peças.

 
Segundo a curadora Fernanda Pitta, “a ideia é observar a arte acontecendo”. “É pensar nesse tipo de questão e outras modalidades de atenção que não a do engajamento ou contemplação.” 


Para Pitta, a mostra confronta “o modelo expositivo tradicional” e propõe uma reflexão sobre como nos relacionamos com obras de arte. 


Laura Lima: Alfaiataria
A partir deste sábado (7), às 11h. De qua. a seg. das 10h às 17h30. Até 8/10. Pina Luz. Praça da Luz, 2, tel. (11) 3324-1000. R$ 6 (grátis aos sábados). 

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