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08/03/2012 - 14h26

Leia a 1ª versão da agenda brasileira para a Rio+20

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DE SÃO PAULO

Abaixo, a íntegra da primeira versão (5 de março de 0212) do documento sobre as políticas domésticas para o desenvolvimento sustentável:

A realização da Conferência Rio+20, em junho deste ano, oferece oportunidade única para que se discuta com seriedade e profundidade a agenda de políticas e negociações na área climática e de transição para uma economia de baixo carbono.

Não se deve aceitar passivamente que o problema dos limites naturais do planeta às estratégias de desenvolvimento econômico e social seja escamoteado da agenda de uma reunião cujo próprio nome e objeto é o desenvolvimento sustentável. As evidências dramáticas do processo de aquecimento global --expressas em acidentes climáticos extremos-- se multiplicam no Brasil e no mundo e os impactos, inclusive econômicos desta trajetória, já se fazem notar em diversos países e setores.

Frente aos desafios e urgência da agenda climática e ambiental, há um elevado risco de que a Rio+20 seja não apenas irrelevante, mas configure um retrocesso. Essa percepção começa a se generalizar e pode, inclusive, conduzir a um esvaziamento da conferência em termos de presença de chefes de Estado e governo, configurando embaraçoso contraste com a Rio 92, cujo aniversário se pretende comemorar.

Não se trata de ignorar que o ambiente global é hoje pouco propício às negociações e iniciativas de cooperação internacional. Ao contrário, é preciso reconhecer honestamente que a crise econômica serve de aparente justificativa a esforços unilaterais de crescimento. Sem desconhecer ou minimizar as dificuldades, impõe-se que a conferência demonstre que a transição para uma economia de baixo carbono, longe de ser um obstáculo, constitui o único caminho realista para imprimir novo dinamismo ao crescimento em termos sustentáveis.

A evolução recente dos trabalhos preparatórios confirma infelizmente os riscos de que a dimensão da sustentabilidade do desenvolvimento seja diluída, na Conferência, em uma agenda excessivamente abrangente, que resulte na perda de foco dos esforços de coordenação internacional na área da mudança climática e do meio ambiente. A Rio+20 é uma oportunidade que não se repetirá tão cedo para conferir conteúdo concreto ao pilar climático e ambiental do desenvolvimento sustentável e essa dimensão não deve ser esvaziada no interior de uma agenda genérica, retórica e sem qualquer foco.

É fundamental o papel do Brasil --anfitrião da Conferência-- nesse contexto internacional desfavorável. O Brasil é ator de primeira grandeza em tudo o que se refere à agenda climática e ambiental: os ativos do país na área agrícola, energética e florestal fazem do país um participante incontornável de qualquer esforço internacional de enfrentamento dos desafios globais.

Não podemos fugir à responsabilidade de contribuir como anfitriões à aproximação de posições e à construção de consensos em torno de metas ambiciosas, especialmente depois de assumirmos, em Copenhague (na COP-15) o compromisso de reduzir emissões no horizonte de 2020.

Nossa estratégia e nossas alianças na frente externa devem ser pautadas pelos objetivos de defender os interesses do país, mas devem também ser um vetor de afirmação do Brasil como protagonista internacional preocupado com os interesses globais e indivisíveis da humanidade, os chamados "global commons".

O melhor caminho para afirmar os interesses brasileiros e os valores de um futuro sustentável para todos os países passa não pelo alinhamento automático com outras economias em desenvolvimento, mas pelo papel indispensável de facilitador de consensos, no qual ninguém poderá tomará o lugar do Brasil.

O protagonismo brasileiro deve se expressar não apenas na esfera internacional, mas também --e hoje mais do que nunca-- na dimensão das políticas domésticas. Aqui, o Brasil avançou bastante, ao reduzir o desmatamento, definir uma Política Nacional de Mudança Climática e aprovar no Legislativo a Lei de Mudança Climática. Também na esfera estadual, há avanços importantes registrados na adoção de legislação inspirada por preocupações de sustentabilidade.

Na esfera doméstica, os esforços brasileiros de mitigação --concentrados na redução do desmatamento-- são palpáveis. Menos óbvias, porém, são as iniciativas do país no apoio à transição para uma economia de baixo carbono.

Na grande maioria dos países, as agendas de mitigação das emissões e de transição para uma economia de baixo carbono estão estreitamente relacionadas --uma vez que a origem das emissões se concentra, nestes países, no setor energético e/ou na indústria. No Brasil, ao contrário, há uma desconexão entre as duas agendas. Enfrenta-se o desafio da mitigação-- reduzindo o desmatamento--, mas pouco se faz para avançar em direção e uma economia de baixo carbono.

Em termos de agenda de políticas domésticas, esse quadro resulta em baixo grau de interseção entre, de um lado, políticas industriais, comerciais e de inovação e, de outro, políticas climáticas. Estas diferentes políticas pouco se falam, o que se torna patente nas prioridades das políticas industriais, que geram muitas vezes incentivos perversos do ponto de vista do aumento de emissões e da transição para um modelo produtivo de baixo carbono.

Como resposta à crise econômica de 2008, diversos países adotaram, em seus pacotes de estímulo, um conjunto de medidas especificamente voltadas para o aumento do conteúdo verde, o greening da economia ao longo do processo de recuperação. Os pacotes de estímulos anunciados por China e Coreia do Sul foram seguramente os que continham o maior componente de políticas verdes, embora medidas de incentivo de conteúdo semelhante tenham sido adotadas também nos EUA e em diversos países europeus.

Exceto no caso dos favorecimentos temporários a aparelhos da linha branca de maior economia de energia, o Brasil praticamente ignorou a dimensão climática em seus pacotes de estímulos adotados depois de 2008 e parece ter dificuldades para perceber que a agenda de desenvolvimento sustentável é portadora de extraordinárias oportunidades para um país como o nosso. As políticas econômicas (particularmente as políticas industriais, comerciais e tecnológicas) e sociais brasileiras devem ser coerentes com a transição para uma economia de baixo carbono e com o aproveitamento das oportunidades econômicas a elas associadas.

O atraso na implementação da Lei de Mudança Climática e na divulgação dos Planos Setoriais previstos no Programa Nacional de Mudanças Climáticas parecem refletir as dificuldades para coordenar as políticas climáticas e as políticas industriais.

Como a temática da sustentabilidade é "horizontal", requerendo o envolvimento de diferentes tipos de políticas e atores, a elevação de sua hierarquia na agenda de políticas domésticas no Brasil poderia se expressar na definição de uma estrutura de coordenação, vinculada à Presidência da República, entre as diversas instâncias e órgãos governamentais intervenientes.

Em síntese, os signatários deste documento defendem que:

- a Conferência Rio+20 é uma oportunidade para manter viva a chama do desenvolvimento sustentável e para avançar nas negociações climáticas e não deve ser esvaziada no interior de uma agenda de desenvolvimento genérica e sem qualquer foco.

- o Brasil deve atuar nas negociações climáticas internacionais como protagonista, defendendo seus interesses específicos, mas também constituindo uma força de moderação e equilíbrio para promover temas e agendas relacionadas a objetivos globais.

- o Brasil deve se engajar claramente, através de um conjunto coordenado de políticas públicas, na agenda de transição para uma economia de baixo carbono, buscando desenvolver vantagens competitivas associadas a este processo e desencorajando iniciativas que vão na direção oposta a esta transição.

- a prioridade à transição para uma economia de baixo carbono deve se traduzir em medidas de políticas industriais, energética, agropecuárias, comerciais e de inovação e em instrumentos de política que favoreçam investimentos sustentáveis.

- a fim de garantir prioridade à agenda de transição para uma economia de baixo carbono, deveria ser criada, vinculada à Presidência de República, estrutura de coordenação das políticas relacionadas com aquele objetivo, assegurando coerência entre diferentes ações setoriais, objetivos de curto e médio prazo, etc. Esta estrutura deveria configurar uma instância de primeira grandeza no ordenamento ministerial.

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