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Sob mão forte, Tchetchênia renasce com prosperidade e extremismo religioso
DA BBC BRASIL
Mais de dez anos depois de um violento conflito, a Tchetchênia, uma província de maioria muçulmana da Rússia, está renascendo economicamente graças a investimentos pesados feitos pelo governo de Moscou.
No entanto, a reconstrução da província vem acompanhada por um extremismo religioso que parece ter o beneplácito do presidente Ramzan Kadyrov, aliado forte do líder russo, Vladimir Putin.
Em Grozny, um coral de crianças canta uma música sobre o ex-presidente Akhmat Kadyrov, que foi morto por rebeldes tchetchenos há oito anos em uma explosão.
O assunto não é agradável, mas a beleza do coral é incrível. As meninas vestem lenços brancos no cabelo e delicados vestidos cor púrpura. Os meninos usam chapéus de pelo e portam adagas e munição de mentirinha.
Quando o filho de Akhmat sobe ao palco, o aplauso é incessante. Ramzan Kadyrov é quem comanda a Tchetchênia hoje em dia.
Isso é fácil de se perceber através dos seus diversos retratos espalhados por Grozny --em outdoors, no topo de prédios, até mesmo em showrooms de carros.
INSURGÊNCIA
Os Kadyrovs já foram eles próprios insurgentes. Mas resolveram mudar de lado. Desde a morte de Akhmat, o governo russo depende de Ramzan Kadyrov e suas milícias armadas para controlar os rebeldes na Tchetchênia e reconstruir a região.
Até agora, o plano parece estar dando certo. Há menos de uma década, a ONU dizia que Grozny era "a cidade mais destruída da Terra".
Hoje a capital tchetchena não tem mais os sons de metralhadoras disparando pelas ruas. O barulho mais comum por aqui é de construção de prédios.
Em uma das principais ruas da capital, há restaurantes de sushi, salões de beleza, arranha-céus e até mesmo um clube de comédia e karaokê. O nome da via foi rebatizado, sinalizando os novos tempos da Tchetchênia: Avenida Putin.
A revitalização da região, que em uma década ressurgiu das cinzas, foi possível graças aos bilhões de dólares de ajuda financeira por parte do governo central.
'DIREITOS HUMANOS'
Apesar da prosperidade, o homem por trás desta revitalização está longe de ser unanimidade.
Grupos de direitos humanos acusam Ramzan Kadyrov de perseguir seus críticos e de cometer abusos na luta contra os insurgentes que ainda militam. Um julgamento no Reino Unido revelou que Kadyrov é apontado pela agência de inteligência britânica MI5 como responsável pela morte de opositores políticos.
Essa é a primeira pergunta que faço a Kadyrov ao encontrá-lo no palácio presidencial.
"A vida que estamos construindo hoje aqui é maravilhosa", responde ele. "Mas o Ocidente e a Europa não querem isso. Eles dizem que Kadyrov é um bandido. Se acontece um incidente na Europa, eles dizem que Kadyrov está por trás dele. Se a vaca de alguém morre, Kadyrov é o culpado. Se uma galinha não está colocando ovos, é culpa de Kadyrov."
"Eles estão preparados para fazer qualquer coisa para difamar o nome de Kadyrov. E dizer ao mundo que Kadyrov é um mau sujeito. Eu digo a eles: 'Provem'."
Sobre as acusações de ter elaborado listas de oponentes a serem assassinados, o líder tchetcheno cai na gargalhada.
"A pessoa que faz estas acusações é esquizofrênica", sorri Kadyrov. "Eu juro por Alá, esta ideia nunca passaria pela minha cabeça."
'ISLAMIZAÇÃO'
Enquanto reconstroi a Tchetchênia, Ramzan Kadyrov está promovendo o que ele chama de "islã tradicional", mas isso tem feito a região se sentir cada vez menos parte da Rússia.
Álcool já não é mais vendido livremente nos mercados. Há lojas de artigos esportivos só para homens, e outras só para as mulheres. Nas lojas de computadores, cópias gratuitas do Corão são distribuídas a todos que comprarm iPads. Os quartos de hotel trazem setas pintadas no teto, apontando para a Meca.
Sob o regime de Kadyrov, foi adotado um código de vestimentas islâmico mais rígido. Uma mulher conta à BBC que foi ameaçada por não usar lenço no cabelo em público.
BBC | ||
Mulheres andam com lenço cobrindo a cabeça na Tchetchênia; o código de vestimenta se enrijeceu no país |
Ela está profundamente preocupada com a política de "islamização" da Chechênia. Temendo represálias, ela pede para não ter seu nome publicado.
"Minha sobrinha disse que um homem apareceu no seu colégio", diz ela.
"Ele disse a todas as crianças que perguntassem aos seus pais se eles rezam ou não, e pediu que eles relatassem as respostas. Ele disse que se as crianças e seus pais não rezarem, todos irão para o inferno."
"Clérigos estão indo às escolas e dizendo para meninos de seis anos de idade para controlarem suas irmãs, e que se elas não usarem lenços no cabelo, eles serão responsabilizados e punidos por Deus."
"Estou aterrorizada. Eu acho que daqui a dez anos, nós vamos ter criado uma geração inteira de extremistas religiosos."
Kadyrov nega que seu ramo do islã seja de extremistas. Ele também não concorda que o islã tradicional viole os direitos das mulheres.
"O paraíso fica aos pés da mãe", diz o presidente tchetcheno. "Então, como pode um tchetcheno, um muçulmano violar os direitos das mulheres? Eu amo demais minha mãe, minha mulher, minhas irmãs. Eu as honro e respeito. As mulheres são as guardiãs da família. Todas essas acusações foram inventadas."
Na medida em que a Tchetchênia moderna vai emergindo, deixando para trás um passado de violência e miséria, a região parece estar cada vez mais distante de Moscou.
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