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16/05/2011 - 05h40

Closure fecha o cerco

IVAN LESSA
COLUNISTA DA BBC BRASIL

Bullying não tem mais jeito. Fomos intimidados física e psicologicamente a aceitá-lo e difundir seu uso. Como se fosse uma nova moda, bambolê, rock ou twist.

Antes dos bullies e do bullying surgirem éramos serenos, plácidos e cordiais. A não ser no caso de quebrarmos a cara daqueles com quem implicávamos, de preferência um tipinho mais fraco, raquítico. Agora, é isso que se vê. Depois da reforma ortográfica, ficou claro que o Brasil topa qualquer besteira.

Disso nossos debochados inimigos se valem e botam pra jambrar. Vale o coringa. Longe está o tempo em que irish stew virou, no norte, aristu. Havia, na época, ao menos, um certo pudor, que como sempre aliado à nossa ignorância e falta de imaginação, nos fazia com que aportuguesássemos, ou melhor, abrasileirássemos as estrangeirices que nos bombardeava de todos os lados.

Nada com um jeitão mais nosso do que um prato de sopa com aristu no meio da mesa (ou no chão do quintal). Não nos sentíamos em estado de importação indevida e, ao menos, por uma vez, deixávamos as ameaças física da buchada de bode pra lá.

O perigo está nas palavras que trazem embutidas estados de espírito ou atitudes para os quais não temos o equivalente. Tecnologia ainda passa. Mas só um tico e olha lá. De repente, surge o anglicismo e a coisa pega como só anglicismos sabem pegar. Uma espécie de catapora ou dengue léxico e gramatical. De meu posto de observação em Londres, prevejo que o próximo imigrante ilegal pronto para ser recebido com braços e pernas abertas em terras do Brasil é o closure.

Ah, o closure! Conheço das séries de televisão e da mídia americana. Os americanos estão sempre doidos para dar um closure ao menor pretexto. Ou conseguir, um closure, para todos os seus aborrecimentos. Grandes e pequenos. Há graduações das mais sérias para o closure. Em geral, ele só é empregado após uma perda séria na vida por motivo de morte. E morte violenta. Estupro com requintes de maldade.

Pelo menos é o que me mostram os programas policiais, alguns dramalhões e depoimentos catados nos telejornais americanos. A filha foi morta e violentada. O monstro assassino capturado, julgado e executado por injeção letal ou cadeira elétrica. Pai e mãe da moça, expressões compungidas, declaram para a telereportagem: 'Finalmente conseguimos obter closure'. E assim por diante.

Há tipos de closure mais sutis. Ou mais grossos. Quando da execução de Osama Bin Laden por tropas de elite americanas. Times Square e as cercanias da Casa Branca se encheram de gente com garrafa de cerveja, sorriso boçal na cara, bandeiras americanas agitadas e cartazes patrióticos.

O repórter ouviu de vários a palavrinha açambarcadora: closure. Não juro, mas o presidente Obama também a usou, quando foi depositar coroa de flores no ground zero (olha outra aí dando sopa) em Nova York. Familiares dos que sucumbiram no monstruoso atentado terrorista trocavam closures como se fossem abraços de solidariedade. Closures eram flores que se abriam como aqui no dia seguinte à morte de Diana, Princesa de Gales.

Semana passada, o Taleban fez voar pelos ares no Paquistão ao menos 80 cidadãos. Em nome da execução de Osama Bin Laden. O Taleban, cheio de nove horas, não entende nada de closure. Para eles é vingança mesmo e estamos conversados. Vingança, vingança, vingança em nome do Profeta clamar, parafraseando o bom Lupiscínio Rodrigues.

Não penso em encontrar uma palavra equivalente, como se pode fazer fácil com bullying e bully. Fechamento era coisa de jornalismo, quando da finalização da parte da redação, diagramação e montagem de um jornal e revista e mandar para as bancas torcendo para não haver bombas e apreensão seguida de processo judicial. Como veem, dei meus primeiros passos na imprensa nos 21 anos da ditadura militar, que acabou sem closure nenhum frise-se.

Closure, para quem se der ao trabalho de googlar um pouco, é um termo ligado à psicologia popular americana. Refere-se à conclusão de um evento ou acontecimento traumático na vida de alguém. A palavrinha ficou popular ontem mesmo nos EUA, por volta de 1990. Também se fala em closure cognitiva, definida como o desejo de se obter conhecimento definitivo sobre uma questão. Portanto, o que os psicólogos lá querem dizer é que um indivíduo tem a necessidade de chegar a uma solução firme sem ambiguidades.

Mesmo assim, eu que sou cético, prefiro cantar com Linda Batista que encontraram um desafeto ou inimigo meu bebendo e chorando nas mesas de um bar. E eu gostei tanto. Vingança mesmo. Pura e simples. Sem frescuras.

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