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05/10/2011 - 05h26

Ivan Lessa: O caso da americana inocente

DA BBC BRASIL

Impossível deixar de falar no que foi o assunto da terça-feira: a terrível inocência, encontrada no tribunal italiano em Perugia, e lida em alta voz pelo juiz local, após horas de deliberação de um corpo de jurados, da norte-americana de 24 anos, Amanda Knox, que se encontrava presa há 4 anos, juntamente com o menos importante italiano Raffaele Solecito, de 27 anos, ambos dados como culpados de assassinato em julgamento anterior.

Não vou entrar nos detalhes do crime. Certifiquei-me que correu firme no Brasil informatizado ou de pé no chão.

Para mim, terça foi um dia de glória. Não que eu estivesse torcendo por algo mais que a verdade. Mas sim porque as transmissões ao vivo feitas pela BBC, de Perugia, jogaram para escanteio, ou bola perigosa fora da área, o raio da convenção do Partido Conservador.

Resta-me, agora, acompanhar as repercussões do crime, ou da dupla inocência, e esperar o outono que, enfim, parece ter engatado mesmo (21 graus na terça) e descobrir se esse vai melhorar ou piorar meu enfisema.

De qualquer forma, não posso dizer que tenho passado um tempo pior do que passou na prisão a jovem Amanda Knox, e, um pouco menos, especulo, o italiano agora também inocentado e enviado para casa, que fica logo ali na esquina e não em Seattle, no Estado de Washington, Estados Unidos, como é o caso da senhorita Knox.

Sem querer mover moinhos com águas passadas, relembro do crime que foi o trucidamento de uma mocinha, também de seus 20 e poucos anos, Meredith Kercher, cidadã britânica.

Vi multidões americanas jubilosas em Seattle, e outras cidades igualmente importantes, comemorando a agora indubitável inocência de Amanda Knox. Curioso. Até os tabloides sensacionalistas britânicos, sempre dispostos a agitar uma bandeira nacional, mantiveram uma certa compostura.

Então, aí está a coisa resolvida. Embora tenha sido julgada também culpada do crime de calúnia e difamação contra o cidadão Patrick Lumumba (ué, não tinha morrido há décadas?) e condenada a 3 anos de prisão por não tomar cuidado com o que diz, Amanda Knox, foi dada como já tendo cumprido essa parte de outra sentença para outro crime, bem mais leve, e, agora, quase que em triunfo (não, em triunfo, bolas!) volta para seu país já com data para entregar originais de seu livro, entrevistas pagas, encontro marcado com a mulher mais poderosa do planeta, Oprah Winfrey, para edição especial de seu programa de TV, e as muitas outras polpudas bonificações merecidas pelos americanos comprovados inocentes após recurso feito em tribunal de país estrangeiro. Sem falar no filme já feito e exibido que deverá ser atualizado.

Quedam no ar, como as folhas desta estação, diversas perguntas e eu a todas ignoro. Mais importante, sob meu ponto de vista, ótica ou viés, conforme queiram, é a espantosa ineficiência da polícia, não sei se da Itália toda ou só de Perugia.

Fiquei sabendo, no meu passar a bola debaixo das pernas da convenção do Partido Conservador, de um número acima do aceitável em qualquer país daquele que já foi chamado de "Terceiro Mundo".

Lembro ao leitor, com toda certeza mais familiarizado que eu com as minúcias do caso, que as forças da lei local levaram 46 dias para recolher traços de DNA no local do crime e, quando o fizeram, foi com plástico e não papel, conforme manda o figurino (vive-se e aprende-se).

Estranhíssima também é a história de Rudy Guede, outro garotão, este marfinense, ou ebúrneo, se preferirem, condenado a 30 anos de prisão por ter confessado a autoria do assassinato brutal (com o auxílio de Amanda Knox e Raffaele Solecito? Não se falou do assunto).

Após entrar com recurso, viu sua sentença reduzida a 16 anos, isso em 2008, quando o outro casalzinho, quiçá seus comparsas, já estavam em cela perugiana. A mídia passou ao largo da surreal história.

Paro por aqui, parabenizo todos os inocentes do caso, solidarizo-me com a família da mocinha morta e volto para minha TV. Onde deixei gravado, desde sábado, uma aventura completa do Inspetor Montalbano, cujos livros e filmes são sucesso mundial. Ele resolve banalmente aqueles crimes banais que só a banal Sicília oferece.

E, na noite de terça, vi Romanzo Criminale, que é um giallo, ou romance policial, renomada série italiana de livros sobre crimes e criminosos. Bom demais.

Uma coisinha: giallo é amarelo em italiano, pois desde 1929 é que os romances policiais são publicados numa coleção com capa dessa cor, romanzi gialli. Feito nós, que também tivemos, a partir de 1931, igualzinho, nossa Coleção Amarela. E, em 1945, os franceses publicavam, e ainda publicam, acho, seus policiais na esplêndida Série Noire. Do que, ao contrário de um policial perugiano, deduzo, ou ao menos sugiro, que, na verdade, o film noir americano (mais uma vez, parabéns, Amanda Knox) deveria se chamar yellow film e nós seguirmos o exemplo.

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