João Pereira Coutinho

Escritor, doutor em ciência política pela Universidade Católica Portuguesa.

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João Pereira Coutinho

O fascismo continua

1. O fascismo não existe sem uma cultura fascista disposta a suportá-lo. O ditador português António de Oliveira Salazar (1889-1970) tinha uma foto de Mussolini sobre a mesa de trabalho. Mas não existe nenhum historiador sério que defina o Estado Novo como um regime "fascista" no sentido próprio do termo.

Temeroso das multidões e sem ceder a uma concepção totalitária de poder (para desespero de muitos fascistas genuínos, como os "camisas azuis" do Nacional-Sindicalismo), Salazar era o típico ditador autoritário e provinciano para quem a "repressão preventiva" (através da censura e da polícia política) era mais eficaz do que os desvarios musculados (e abertamente racistas) de Hitler e Mussolini.

Aliás, sobre o último, Salazar não escondia a admiração --mas negava a imitação. "Mussolini, digo eu, é um grande homem, mas não se é impunemente da terra de César e de Maquiavel!" Tradução: Mussolini só seria possível em Itália, não em Portugal.

Passaram setenta anos desde a queda do fascismo em Itália (ironicamente, também no dia 25 de abril). Mas é sem surpresa que vemos expressões da cultura fascista no seu melhor.

Segundo se lê na imprensa, a atual ministra italiana da Integração, Cecile Kyenge, não tem sossego perante os insultos racistas de políticos ou meros cidadãos.

A ministra, de origem congolesa, já foi comparada a um orangotango pelo senador Roberto Calderoli, vice-presidente do partido Liga Norte e ex-ministro de Berlusconi. As hostilidades não ficaram por aqui. Em aparições públicas, parece que se tornou hábito despejar bananas sobre a ministra.

Não pretendo polir os meus galões lusitanos. Polir? Só Deus sabe como ganho a vida a descer o sarrafo sobre os meus conterrâneos.

Mas o espectáculo das bananas só seria possível na terra de César e de Maquiavel, não de Camões e de Carmen Miranda. Que por acaso também usava frutas, mas com outra elegância.

2. E por falar em fascismo: a Nova Zelândia resolveu recusar a renovação do visto a um imigrante sul-africano porque ele não apresenta "parâmetros de saúde aceitáveis".

Por outras palavras: é gordo. Por outras palavras: é muito gordo. Por outras palavras: pesa 130 quilos, o que o torna vulnerável a doenças como a diabetes, o infarto, a hipertensão e todas as restantes maleitas que é possível encontrar na cartilha.

E quem paga todas essas despesas de saúde? Os contribuintes neozelandeses, claro. E quem são esses contribuintes?

Curiosamente, as autoridades da Nova Zelândia não incluem os imigrantes no pacote. Muito menos o obeso Albert Bruitenhuis, que trabalha há seis anos no país (com a mulher) e previsivelmente deve ter pago impostos durante todo esse período.

De duas, uma: ou o governo da Nova Zelândia pretende dispensar todos os seus imigrantes de pagarem impostos; ou os imigrantes do país deveriam recusar-se a fazê-lo.
Quando o corpo não serve, a carteira também não.

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