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04/02/2006 - 08h32

ONU admite que desarmamento no Haiti fracassou

CAROLINA GLYCERIO
da BBC Brasil, em Porto Príncipe

A ONU fracassou nos esforços de desarmar a população civil no Haiti, admitiu o chefe da missão de paz no país, embaixador Juan Gabriel Valdes. "O grande fracasso da missão tem sido a dificuldade no processo de desarmamento", afirmou Valdes em entrevista à BBC na mansão onde vive, em Porto Príncipe.

Dois anos depois da queda do presidente Jean-Bertrand Aristide, acusado de armar milícias durante o seu governo, estima-se que 210 mil armas circulem no país de 8 milhões de pessoas. A maioria estaria nas mãos de gangues, que as usam em seqüestros, assaltos e tráfico de drogas.

Segundo Valdes, a dificuldade em desarmar a população civil --um dos objetivos da missão que envolve mais de 9.000 militares e policiais da ONU-- vem do fato de que não existe no país um ambiente em que as pessoas se sintam seguras para abrir mão do que pode ser não só seu único meio de proteção, mas também seu sustento.

"O que temos aqui são indivíduos que possuem armas que são provavelmente o maior bem que possuirão na vida. Esses indivíduos mantêm essas armas porque eles não confiam no futuro, porque sabem que essas armas são a única forma de entrar nas gangues ou serem salvos das gangues", disse o diplomata chileno.

"Temos de criar confiança, erradicar o medo, que é uma precondição que ainda não alcançamos e que apenas o tempo vai produzir."

Sem poder contar com a segurança pública, as elites contratam serviços de empresas particulares, negócio que se proliferou nos últimos dez anos no Haiti.

Mas a população que não pode arcar com esse luxo fica sujeita à ação das gangues, tendo de morar cara a cara com os bandidos.

Eleições

O general José Elito Siqueira, brasileiro que comanda as tropas da ONU no Haiti e está subordinado a Valdes, só tem elogios para a atuação do contingente que acaba de assumir, mas no caso do desarmamento também reconhece que a missão está com "meio objetivo conquistado".

"Sem uma situação planejada de reintegração, fica difícil haver o desarmamento e a reintegração, isso realmente precisa melhorar", disse Siqueira. "Uma pessoa não vai entregar uma arma se não tiver esperanças [de melhora]."

Tanto Valdes como Siqueira dizem que o Haiti tem uma "tradição" de violência nas eleições, mas ambos minimizam preocupações de que isso vai dissuadir os haitianos de ir às urnas no próximo dia 7 --o voto é facultativo no país.

"Nós temos informação que nos faz pensar que certos grupos gostariam de agir para impedir essas eleições, mas acho que com 7.400 soldados, 2.000 policiais internacionais e 5.000 policiais nacionais, nós nos mobilizamos de forma a desencorajar esse tipo de ação."

Apesar das tentativas da ONU de assegurar à população de que estará protegida pelo esquema especial de segurança, a organização humanitária Oxfam diz que parte dos eleitores não se sente segura para percorrer quilômetros até o centro de votação mais próximo.

"Muitos residentes de Porto Príncipe nos contaram que estão com muito medo para fazer a viagem para votar na terça-feira", disse o diretor da Oxfam no Haiti, Yolette Etienne, em um comunicado divulgado na sexta-feira.

Venda de armas

Valdes cobra dos vizinhos, inclusive dos Estados Unidos, maior controle sobre a venda de armas para o Haiti --que, segundo ele, vem especialmente da Flórida, nos Estados Unidos, e da República Dominicana.

"Conseguimos controlar um pouco do tráfico da República Dominicana, mas a Minustah infelizmente não controla o mar em volta desta ilha. O envio de armas continua a ser uma dificuldade e acho que uma das decisões que o Conselho de Segurança terá de considerar será pedir melhor controle dos países que cercam o país no que diz respeito à venda de armas a grupos dentro do Haiti."

Segundo a Oxfam, os Estados Unidos têm sido os maiores fornecedores de armas legais e ilegais ao Haiti desde a década de 80, quando o país estava sob o regime militar de Jean-Claude Duvalier.

"Nos últimos dois anos, o país fez uma grande exceção a seu embargo de armas de 14 anos, fornecendo 2.600 armas à polícia em 2004 e aprovando uma outra venda em 2005 de pistolas, rifles e gás lacrimogêneo, no valor de US$ 1,9 milhão", afirma a ONG britânica.

De acordo com a Oxfam, essas transações foram feitas com base em "exceções" previstas no embargo de 1991.

A Oxfam também acusa o Brasil e outros países de vender armas licenciadas ao Haiti há "décadas" e defende a aprovação do Tratado de Comércio de Armas, que prevê a proibição da venda de armas a países onde elas possam ser usadas em violações de direitos humanos.

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