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01/10/2002
-
08h45
LILIAN CHRISTOFOLETTI
da Folha de S.Paulo
Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente nacional do PT, José Dirceu, receberam doações em 1998 do empreiteiro argentino Santiago Crespo, mas o nome dele não aparece nas prestações de conta apresentadas à Justiça Eleitoral pelas duas campanhas petistas.
Até junho último, Crespo dirigia a empresa Cliba, contratada em abril pela Prefeitura de São Paulo para fazer a coleta de lixo.
A identidade do real colaborador de campanha foi revelada pela própria pessoa que aparece como "doadora" nos papéis entregues pelo PT à Justiça Eleitoral: o técnico em contabilidade José Carlos Barreira, 42, e confirmada pelo empreiteiro.
Advogados consultados pela Folha disseram que, em tese, a suposta omissão do nome do doador não poderá ser apurada pela Justiça Eleitoral, porque o prazo para tal já prescreveu.
O empreiteiro abriu uma conta bancária conjunta com o seu contador, mas ela era toda controlada pelo empresário, que assinava todos os cheques, segundo informou Barreira. Nas listas dos doadores encaminhadas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) aparece apenas o nome do contador, e não o do empresário.
Barreira, que trabalhou para a empresa do argentino, foi localizado em São Carlos (SP), onde trabalha e mora atualmente, para que confirmasse quatro doações que teria feito em cheques, no valor total declarado de R$ 20 mil (R$ 15 mil para a campanha de Dirceu e R$ 5 mil para a de Lula).
As doações de Crespo para Dirceu são a segunda maior da campanha do deputado, ao lado da da empresa Cardsystem.
Barreira primeiro negou as doações: "Não doei, com certeza. De alguma forma me envolveram nisso aí". Depois, Barreira disse ter descoberto o que teria ocorrido. Contou que Crespo usou uma conta conjunta, na qual o argentino tinha o poder de assinar os cheques. O contador diz nunca ter recebido extrato dessa conta nem ter sabido de novos gastos. Explicou que não conseguia emitir nenhum cheque apenas com a sua própria assinatura.
O empresário pediu então, em 98, para usar o CPF de Barreira para fazer doações a um partido.
Crespo é gerente-delegado da Benito Roggio & Hijos do Brasil, proprietária, até junho último, da empresa de coleta de lixo Cliba, contratada pela gestão Marta Suplicy (PT) em São Paulo e que doou R$ 251 mil para a então candidata a prefeita no ano de 2000.
A Cliba foi comprada em junho por Romero Niquini, que tem empresas presididas por Willian Chaim, ex-assessor de Dirceu.
A Cliba também trabalhou para a gestão Celso Pitta e foi condenada, em primeira instância, por supostas irregularidades no aditamento de contratos.
A primeira reação de Barreira, ao ser perguntado sobre as doações, por telefone, na manhã da última quarta-feira por telefone, foi definitiva. Após ler para ele seu nome e CPF, a reportagem manteve o seguinte diálogo:
Folha - O sr. aparece como doador da campanha de Dirceu em 98...
Barreira - Não.
Folha - O sr. nunca doou?
Barreira - Nunca, nunca, com certeza. É meu nome, meu CPF, mas nunca trabalhei com política.
Folha - O sr. conhece José Dirceu?
Barreira - Não conheço, nada.
Folha - É uma surpresa, isso?
Barreira - É, de alguma forma me envolveram aí.
Folha - A doação foi registrada...
Barreira - Quer dizer, usaram meu nome para... uma pessoa pode ter doado e, por algum motivo, usado meu nome e CPF?
Folha - Aparentemente, sim.
Barreira - O valor é alto?
Folha - R$ 15 mil.
Barreira - [Rindo] Que legal.
Folha - Qual é o seu salário?
Barreira - Hoje eu estou com R$ 4.800. Eu não iria dispor de R$ 15 mil para fazer uma doação.
Folha - Seu nome também está na declaração de Lula.
Barreira - [Rindo] Rapaz...
No segundo contato, na tarde de quarta-feira na empresa em que Barreira trabalha, a conversa foi acompanhada pelo ombudsman da empresa, Cláudio Luiz de Carvalho, e por outro colega de Barreira. O contador voltou a negar as doações para Lula e Dirceu.
Disse que em 1998 tinha uma microempresa na periferia de São Paulo e prestava serviços para a empreiteira Benito Roggio. Contou que teve contas no HSBC e no Itaú. Os cheques das doações, conforme o TRE informou depois, são do banco Sudameris.
O contador disse que iria apurar a razão de seu nome aparecer como doador. Na sexta-feira, Barreira, em novo contato,disse ter telefonado para o empreiteiro, que teria lhe dado explicações.
Segundo o contador, Crespo lembrou-lhe que em 98 pediu uma autorização para usar seu CPF para um recibo de doação. Barreira recordou-se do diálogo: "Ó, vou fazer um recibo de uma doação, só que não quero aparecer, então posso usar seu nome e CPF?". Eu autorizei. Eu não fiz cheque, eu não fiz absolutamente nada e ele usou essa conta", disse o contador.
A única dúvida de Barreira era a respeito do valor das doações: "Me dá a impressão que talvez eu tenha autorizado, a fazer o recibo de uns R$ 5 mil, e, no final das contas, onde passa um boi, passa uma boiada, aí fizeram outros recibos e outros cheques".
Leia mais:
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Veja também o especial Eleições 2002
Empresário ocultou doação a Lula e José Dirceu
RUBENS VALENTELILIAN CHRISTOFOLETTI
da Folha de S.Paulo
Luiz Inácio Lula da Silva e o presidente nacional do PT, José Dirceu, receberam doações em 1998 do empreiteiro argentino Santiago Crespo, mas o nome dele não aparece nas prestações de conta apresentadas à Justiça Eleitoral pelas duas campanhas petistas.
Até junho último, Crespo dirigia a empresa Cliba, contratada em abril pela Prefeitura de São Paulo para fazer a coleta de lixo.
A identidade do real colaborador de campanha foi revelada pela própria pessoa que aparece como "doadora" nos papéis entregues pelo PT à Justiça Eleitoral: o técnico em contabilidade José Carlos Barreira, 42, e confirmada pelo empreiteiro.
Advogados consultados pela Folha disseram que, em tese, a suposta omissão do nome do doador não poderá ser apurada pela Justiça Eleitoral, porque o prazo para tal já prescreveu.
O empreiteiro abriu uma conta bancária conjunta com o seu contador, mas ela era toda controlada pelo empresário, que assinava todos os cheques, segundo informou Barreira. Nas listas dos doadores encaminhadas ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral) e ao TRE (Tribunal Regional Eleitoral) aparece apenas o nome do contador, e não o do empresário.
Barreira, que trabalhou para a empresa do argentino, foi localizado em São Carlos (SP), onde trabalha e mora atualmente, para que confirmasse quatro doações que teria feito em cheques, no valor total declarado de R$ 20 mil (R$ 15 mil para a campanha de Dirceu e R$ 5 mil para a de Lula).
As doações de Crespo para Dirceu são a segunda maior da campanha do deputado, ao lado da da empresa Cardsystem.
Barreira primeiro negou as doações: "Não doei, com certeza. De alguma forma me envolveram nisso aí". Depois, Barreira disse ter descoberto o que teria ocorrido. Contou que Crespo usou uma conta conjunta, na qual o argentino tinha o poder de assinar os cheques. O contador diz nunca ter recebido extrato dessa conta nem ter sabido de novos gastos. Explicou que não conseguia emitir nenhum cheque apenas com a sua própria assinatura.
O empresário pediu então, em 98, para usar o CPF de Barreira para fazer doações a um partido.
Crespo é gerente-delegado da Benito Roggio & Hijos do Brasil, proprietária, até junho último, da empresa de coleta de lixo Cliba, contratada pela gestão Marta Suplicy (PT) em São Paulo e que doou R$ 251 mil para a então candidata a prefeita no ano de 2000.
A Cliba foi comprada em junho por Romero Niquini, que tem empresas presididas por Willian Chaim, ex-assessor de Dirceu.
A Cliba também trabalhou para a gestão Celso Pitta e foi condenada, em primeira instância, por supostas irregularidades no aditamento de contratos.
A primeira reação de Barreira, ao ser perguntado sobre as doações, por telefone, na manhã da última quarta-feira por telefone, foi definitiva. Após ler para ele seu nome e CPF, a reportagem manteve o seguinte diálogo:
Folha - O sr. aparece como doador da campanha de Dirceu em 98...
Barreira - Não.
Folha - O sr. nunca doou?
Barreira - Nunca, nunca, com certeza. É meu nome, meu CPF, mas nunca trabalhei com política.
Folha - O sr. conhece José Dirceu?
Barreira - Não conheço, nada.
Folha - É uma surpresa, isso?
Barreira - É, de alguma forma me envolveram aí.
Folha - A doação foi registrada...
Barreira - Quer dizer, usaram meu nome para... uma pessoa pode ter doado e, por algum motivo, usado meu nome e CPF?
Folha - Aparentemente, sim.
Barreira - O valor é alto?
Folha - R$ 15 mil.
Barreira - [Rindo] Que legal.
Folha - Qual é o seu salário?
Barreira - Hoje eu estou com R$ 4.800. Eu não iria dispor de R$ 15 mil para fazer uma doação.
Folha - Seu nome também está na declaração de Lula.
Barreira - [Rindo] Rapaz...
No segundo contato, na tarde de quarta-feira na empresa em que Barreira trabalha, a conversa foi acompanhada pelo ombudsman da empresa, Cláudio Luiz de Carvalho, e por outro colega de Barreira. O contador voltou a negar as doações para Lula e Dirceu.
Disse que em 1998 tinha uma microempresa na periferia de São Paulo e prestava serviços para a empreiteira Benito Roggio. Contou que teve contas no HSBC e no Itaú. Os cheques das doações, conforme o TRE informou depois, são do banco Sudameris.
O contador disse que iria apurar a razão de seu nome aparecer como doador. Na sexta-feira, Barreira, em novo contato,disse ter telefonado para o empreiteiro, que teria lhe dado explicações.
Segundo o contador, Crespo lembrou-lhe que em 98 pediu uma autorização para usar seu CPF para um recibo de doação. Barreira recordou-se do diálogo: "Ó, vou fazer um recibo de uma doação, só que não quero aparecer, então posso usar seu nome e CPF?". Eu autorizei. Eu não fiz cheque, eu não fiz absolutamente nada e ele usou essa conta", disse o contador.
A única dúvida de Barreira era a respeito do valor das doações: "Me dá a impressão que talvez eu tenha autorizado, a fazer o recibo de uns R$ 5 mil, e, no final das contas, onde passa um boi, passa uma boiada, aí fizeram outros recibos e outros cheques".
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