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26/09/2005 - 09h13

São Paulo ganha santuário de chimpanzés

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REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo

Antropólogos da USP estão se preparando para assistir de camarote aos primeiros passos de uma história fascinante de alianças, intrigas, amizade e traição --e nem vão precisar acompanhar a próxima novela das oito para isso. A idéia é monitorar a formação de um dos primeiros grupos sociais de chimpanzés em cativeiro no Brasil, num santuário de grandes primatas perto de Sorocaba criado pelo empresário e microbiólogo Pedro Ynterian.

Além de ajudar a responder a algumas das incógnitas que ainda pairam sobre a vida em sociedade da espécie, o esforço pode ajudar na reintrodução de alguns dos 37 chimpanzés do santuário em seu ambiente natural --coisa que, infelizmente, ninguém ainda sabe direito como fazer. A iniciativa vem numa das piores horas da história da espécie: sua população selvagem pode estar encolhendo para apenas dezenas de milhares de indivíduos.

O antropólogo Rui Murrieta, do Instituto de Biociências da USP, conta que a idéia é ser o menos invasivo possível. "A gente deve passar os primeiros seis meses do ano que vem acompanhando a formação desse grupo sem nenhum tipo de intervenção. Queremos ver como se dão as alianças, os conflitos e também verificar qual o papel da presença humana no comportamento deles. Depois, pouco a pouco, a idéia é introduzir estímulos que possam aumentar a coesão entre o grupo e o encoraje à resolução de problemas."

O elenco da novela símia deverá ser composto principalmente pelas crianças e adolescentes do santuário, os quais têm mais chance de desenvolver vida social saudável de acordo com os padrões da espécie. Vários dos bebês chimpanzés, como Guga, 6, Emílio, 4, e Carlos, 5, já passam a maior parte do dia brincando juntos, num dos recintos com cerca elétrica do sítio Velho Jatobá.

Juventude primata

Guga, aliás, foi o estopim que levou Pedro Ynterian, de origem cubana, a idealizar o santuário, há seis anos. "O Guga tinha sido rejeitado pela mãe, e nós o trouxemos para morar conosco em São Paulo quando ele tinha três meses", conta Ynterian, caminhando por entre os vários recintos do complexo. "Foi aí que eu percebi o erro que tinha cometido." Por mais fofos que sejam, filhotes de chimpanzé começam a revirar a casa muito mais cedo que bebês humanos, e logo ganham uma força desproporcional em relação ao seu tamanho.

Sem saber o que fazer com Guga, Ynterian pôs-se a estudar tudo sobre a espécie e acabou decidindo transformar o criatório conservacionista que já tinha (com animais brasileiros) num refúgio para chimpanzés maltratados em circos e zoológicos. Por conta dos maus-tratos, vários dos adultos têm problemas de comportamento.

"Numa espécie como essa, que é altamente social e que depende de um longo período de aprendizado, como nós, a vida em isolamento ou na companhia apenas de humanos acaba causando problemas terríveis", explica Murrieta. É por isso que as maiores esperanças de criar um grupo social estável são depositadas nos filhotes do santuário.

Para Murrieta, a pesquisa sobre o comportamento dos chimpanzés está entrando numa nova fase, e o santuário em Sorocaba pode fazer parte desse avanço. "Até agora, nós tivemos dados sobre alguns grupos na natureza e em cativeiro, mas relativamente pouca comparação entre grupos", analisa. Em alguns casos, isso pode ter favorecido algumas análises forçadas, ou que não refletem de forma adequada a diversidade de comportamento da espécie.

Os estudos das últimas décadas têm apontado um conjunto impressionante de estratégias sociais, tecnológicas e culturais. O uso de ferramentas parece ser generalizado, mas varia de forma significativa de região para região, e até de bando para bando. Fala-se na formação de coalizões entre membros subordinados de um grupo para "derrubar do poder" o macho que os domina.

Há também debates sobre o grau de agressividade e xenofobia inato aos chimpanzés, que poderia abrir uma janela sobre a origem desse tipo de instinto em humanos. Ainda há que conteste, por exemplo, a existência de "guerras" entre grupos da espécie. "A gente está no momento de pegar essa plêiade de questões e tentar sair do universo hipotético", conclui Murrieta.

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