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17/11/2005
-
09h36
REINALDO JOSÉ LOPES
da Folha de S.Paulo
O velho Charles Darwin (1809-1882) sempre foi sinônimo de polêmica, mas pesquisadores brasileiros estão prestes a aplicar a teoria evolutiva, desenvolvida inicialmente por ele, num tema ainda mais litigioso: a escolha dos parceiros e a criação dos filhos. Não se trata de usar o naturalista inglês como terapeuta de casais, mas sim de entender como os milhões de anos de evolução humana influenciam a vida familiar das pessoas de hoje.
A idéia recebeu impulso com a recente aprovação de um projeto de psicologia evolucionista --o campo que tenta aplicar a lógica darwinista ao comportamento e à mente humana-- pelos Institutos do Milênio, programa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Durante os próximos três anos, 17 pesquisadores coordenados por Maria Emilia Yamamoto, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), terão verba de cerca de R$ 1 milhão para investigar, do ponto de vista da evolução, problemas como a depressão pós-parto, as agressões a crianças e até o "ensino" do uso de ferramentas entre macacos-pregos (Cebus apella).
Investindo na prole
"Um dos principais aspectos que queremos estudar são os padrões reprodutivos e de investimento parental", conta Yamamoto. Trocando em miúdos: como qualquer animal, os seres humanos, ao longo do tempo evolutivo, teriam desenvolvido estratégias para terem o máximo sucesso em se reproduzir --afinal, é isso o que os seres vivos fazem. E isso necessariamente envolve "decidir" (nem sempre de forma consciente) quanto pais e mães vão investir na criação de seus filhos.
No caso das pessoas, existe, é claro, um complicador aí: a cultura humana, que às vezes parece levar a decisões que vão na contramão da tendência a se reproduzir ao máximo. "O nome do projeto é "O moderno e o ancestral", e a idéia é justamente entender essa dicotomia, esse aparente descompasso entre biologia e cultura", conta Yamamoto.
A própria depressão pós-parto, um fenômeno que parece ser totalmente não-adaptativo --já que a mãe pode deixar de cuidar do bebê e perdê-lo--, poderia ser explicada dentro da lógica da psicologia evolucionista. "Nós vamos testar uma hipótese lançada há alguns anos, segundo a qual, na depressão pós-parto, a mãe se enxerga como não tendo condições de criar o bebê e sem alguém para ajudá-la", diz a pesquisadora.
Questões como essa vão depender, obviamente, do ambiente familiar estudado. É por isso que várias das linhas de pesquisa do grupo tentarão comparar o impacto de ambientes diferentes --urbanos ricos e pobres e aldeias indígenas caiovás, no Mato Grosso do Sul, por exemplo. "As pessoas têm predisposições biológicas, mas o próprio termo "predisposição" mostra que elas podem ser moldadas pelo ambiente."
A psicologia evolucionista conta tanto com grandes defensores quanto com detratores entre os cientistas. Há quem diga que o campo propõe explicações que não explicam muita coisa --qualquer tipo de comportamento, por mais que parecesse não-adaptativo, ganharia uma explicação evolutiva na marra.
"Eu não desprezo essas críticas, que são verdadeiras para algumas circunstâncias", afirma a pesquisadora. "Se você tem uma teoria, é claro que ela precisa ser testada. Além disso, nós também precisamos separar os fatores que são importantes durante a vida do indivíduo e os que valem para escalas maiores de tempo."
Em última instância, os psicólogos evolucionistas deveriam ser capazes de propor soluções para os fenômenos observados. Yamamoto cita o caso da neofobia alimentar --a velha mania das crianças recusarem comida que nunca viram antes. "Isso já foi um comportamento adaptativo, porque um alimento desconhecido poderia levar à morte", diz ela. Compreender o porquê poderia até sugerir táticas também evolutivas para que as mães vencessem a ojeriza dos filhos.
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da Folha de S.Paulo
O velho Charles Darwin (1809-1882) sempre foi sinônimo de polêmica, mas pesquisadores brasileiros estão prestes a aplicar a teoria evolutiva, desenvolvida inicialmente por ele, num tema ainda mais litigioso: a escolha dos parceiros e a criação dos filhos. Não se trata de usar o naturalista inglês como terapeuta de casais, mas sim de entender como os milhões de anos de evolução humana influenciam a vida familiar das pessoas de hoje.
A idéia recebeu impulso com a recente aprovação de um projeto de psicologia evolucionista --o campo que tenta aplicar a lógica darwinista ao comportamento e à mente humana-- pelos Institutos do Milênio, programa do CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico). Durante os próximos três anos, 17 pesquisadores coordenados por Maria Emilia Yamamoto, da UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte), terão verba de cerca de R$ 1 milhão para investigar, do ponto de vista da evolução, problemas como a depressão pós-parto, as agressões a crianças e até o "ensino" do uso de ferramentas entre macacos-pregos (Cebus apella).
Investindo na prole
"Um dos principais aspectos que queremos estudar são os padrões reprodutivos e de investimento parental", conta Yamamoto. Trocando em miúdos: como qualquer animal, os seres humanos, ao longo do tempo evolutivo, teriam desenvolvido estratégias para terem o máximo sucesso em se reproduzir --afinal, é isso o que os seres vivos fazem. E isso necessariamente envolve "decidir" (nem sempre de forma consciente) quanto pais e mães vão investir na criação de seus filhos.
No caso das pessoas, existe, é claro, um complicador aí: a cultura humana, que às vezes parece levar a decisões que vão na contramão da tendência a se reproduzir ao máximo. "O nome do projeto é "O moderno e o ancestral", e a idéia é justamente entender essa dicotomia, esse aparente descompasso entre biologia e cultura", conta Yamamoto.
A própria depressão pós-parto, um fenômeno que parece ser totalmente não-adaptativo --já que a mãe pode deixar de cuidar do bebê e perdê-lo--, poderia ser explicada dentro da lógica da psicologia evolucionista. "Nós vamos testar uma hipótese lançada há alguns anos, segundo a qual, na depressão pós-parto, a mãe se enxerga como não tendo condições de criar o bebê e sem alguém para ajudá-la", diz a pesquisadora.
Questões como essa vão depender, obviamente, do ambiente familiar estudado. É por isso que várias das linhas de pesquisa do grupo tentarão comparar o impacto de ambientes diferentes --urbanos ricos e pobres e aldeias indígenas caiovás, no Mato Grosso do Sul, por exemplo. "As pessoas têm predisposições biológicas, mas o próprio termo "predisposição" mostra que elas podem ser moldadas pelo ambiente."
A psicologia evolucionista conta tanto com grandes defensores quanto com detratores entre os cientistas. Há quem diga que o campo propõe explicações que não explicam muita coisa --qualquer tipo de comportamento, por mais que parecesse não-adaptativo, ganharia uma explicação evolutiva na marra.
"Eu não desprezo essas críticas, que são verdadeiras para algumas circunstâncias", afirma a pesquisadora. "Se você tem uma teoria, é claro que ela precisa ser testada. Além disso, nós também precisamos separar os fatores que são importantes durante a vida do indivíduo e os que valem para escalas maiores de tempo."
Em última instância, os psicólogos evolucionistas deveriam ser capazes de propor soluções para os fenômenos observados. Yamamoto cita o caso da neofobia alimentar --a velha mania das crianças recusarem comida que nunca viram antes. "Isso já foi um comportamento adaptativo, porque um alimento desconhecido poderia levar à morte", diz ela. Compreender o porquê poderia até sugerir táticas também evolutivas para que as mães vencessem a ojeriza dos filhos.
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