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02/12/2005 - 09h32

Pobre brasileiro vive "encurralado", diz Anistia Internacional

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FABIO SCHIVARTCHE
da Folha de S.Paulo

Relatório da Anistia Internacional a ser divulgado hoje afirma que os moradores de favelas e de áreas pobres das grandes cidades brasileiras vivem "encurralados" entre grupos criminosos e uma polícia violenta --que fracassa em protegê-los.

Num processo que a entidade chama de "criminalização da pobreza", esses cidadãos são excluídos dos planos de segurança pública pelos governantes. Vivem no vácuo da proteção legal, sofrendo violências das facções criminosas e da própria polícia.

Para Tim Cahill, coordenador do estudo, o caso do ônibus da linha 350, no Rio de Janeiro, incendiado por traficantes que reagiram à morte de um de seus comparsas após confronto com a PM, é um bom exemplo do "círculo vicioso da violência".

"A polícia costuma agir episodicamente e de forma repressiva, usando a força armada para dar uma resposta visível à sociedade, sedenta por vingança. Mas essas invasões têm efeito prático de curto prazo, pois logo depois o problema retorna. É no vácuo da polícia, ausente no dia-a-dia da favela, que o traficante se sente no direito de fazer justiça com as própria mãos, como no caso do ônibus", diz Cahill, pesquisador permanente da Anistia, uma das ONGs de direitos humanos mais renomadas do mundo.

Intitulado "Eles entram atirando - policiamento de comunidades socialmente excluídas", o trabalho enfoca a violência sofrida na própria comunidade, principalmente a gerada pelas ações policiais. Há diversos relatos de pessoas agredidas, presas arbitrariamente e até mesmo assassinadas.

Um dos casos ocorreu em 28 de agosto deste ano, quando a polícia paulista invadiu o Jardim Elba, uma favela na zona leste de São Paulo, com helicópteros e cavalos. Há duas visões para o que aconteceu lá naquela madrugada.

Para a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo, foi a chamada operação Saturação, que tinha dois objetivos: reprimir o tráfico de drogas na região e aproximar a comunidade da polícia.

Já para a vendedora C., 50, e outros onze moradores que formalizaram queixa à Corregedoria da PM paulista, a operação se transformou numa seqüência de abusos, agressões e roubos.

"Os policiais entraram que nem o capeta na favela. Quebraram tudo na minha casa, até a televisão", diz. Ela conta que um dos tenentes ainda cuspiu no seu rosto e a chamou de "macaca fedorenta", antes de levar seu filho preso por supostamente fazer parte de uma quadrilha de traficantes --ele ficou detido por dois meses em uma cadeia de Santo André.

"As famílias se sentiram torturadas", diz Elizabete Silvério, coordenadora do Centro de Direitos Humanos do Sapopemba.

Karina Sposato, diretora-executiva do Instituto Latino-Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, diz que o relatório da Anistia toca no cerne do problema. "A polícia brasileira prefere comprar viaturas e fazer invasões a favelas. Ações preventivas, como o policiamento comunitário, ficam em segundo plano."

Já o advogado Theodomiro Dias Neto, professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo e especialista em segurança, critica ações como a realizada no Jardim Elba, que durou cerca de um mês. "A polícia sai e o problema volta, porque as condições sociais que o geraram ainda estão presentes."

Outro lado

O secretário nacional da Segurança Pública, Luiz Fernando Corrêa, afirma que o governo federal está tentando "virar o jogo". "Historicamente, a polícia brasileira adota uma prática baseada somente na repressão. O que temos buscado é o equilíbrio entre a repressão qualificada e a prevenção que envolva ativamente o cidadão", afirmou Corrêa, que ainda não leu o relatório da Anistia.

Ele afirma que a secretaria está incentivando ações de formação de lideranças comunitárias. "Com uma sociedade organizada, fica mais fácil trabalhar o policiamento comunitário. Mas ainda temos um longo caminho pela frente. Quebrar paradigmas é um processo demorado", disse Corrêa.

A Secretaria da Segurança Pública do Estado de São Paulo diz que as afirmações do relatório da Anistia não se aplicam à polícia paulista, pois ela "atua em todas as áreas da cidade por meio de um mapeamento de criminalidade", inclusive em regiões de favelas.

Sobre a operação no Jardim Elba, diz que foi bem-sucedida, após 66 flagrantes relativos a entorpecentes e 81 prisões.

A Secretaria da Segurança Pública do Estado do Rio diz que somente após ter acesso ao teor do relatório poderá se manifestar sobre o documento. Afirma, no entanto, que no atual governo foram reduzidos os índices de homicídios e de autos de resistência.

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