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21/12/2005 - 22h34

Fiocruz culpa tradução incompleta por experimento com iscas humanas

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JANAINA LAGE
da Folha Online, no Rio
GABRIELA MANZINI
da Folha Online

A tradução incompleta do texto de uma pesquisa de malária para o português possibilitou a ocorrência de um experimento com iscas humanas na comunidade de São Raimundo do Pirativa, no Amapá, informou nesta quarta-feira a Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).

Na quarta-feira da semana passada, o Conselho Nacional de Saúde suspendeu a pesquisa após denúncias de que ribeirinhos estariam recebendo para serem picados pelos mosquitos. O Conselho afirmou que quando o projeto foi aprovado não previa a utilização de sujeitos de pesquisa como isca humana e tampouco o pagamento para a participação.

De acordo com a Fiocruz, o problema estava na tradução do texto da pesquisa. A tradução para o português ficou a cargo do holandês Jaco Voorham, que, de acordo com a Fiocruz, era professor-adjunto visitante da USP (Universidade de São Paulo). Ele não vive mais no Brasil.

A tradução submetida ao comitê de ética da Fiocruz e ao Conep (Conselho Nacional de Ética em Pesquisa) excluiu a seguinte frase: "Mosquitos captured from human landing counts will be blood-fed on team member volunteers who have taken the recommended Ministry of Health malaria properylaxis for the region."

Em português, ela informaria que mosquitos capturados no campo seriam alimentados com sangue de voluntários que tivessem tomado as medidas preventivas recomendadas pelo Ministério da Saúde para a região.

Capturadores

O experimento ocorreu no início de junho de 2003 e foi interrompido depois que a USP informou aos pesquisadores que ele não estava de acordo com a legislação brasileira. Os mosquitos eram marcados com pó especial nas asas, levemente anestesiados, colocados num copo e depois no braço dos voluntários para se alimentarem. Dessa foram, eles picavam as pessoas.

Segundo a Fiocruz, as 12 pessoas que se submeteram ao experimento haviam sido treinadas para trabalhar como capturadores do mosquito. Elas recebiam pelo serviço uma diária de R$ 20 cada um. A diferença entre os dois procedimentos era que os capturadores são treinados para capturar o mosquito antes que ele consiga dar a picada.

Segundo Silvio Vale, coordenador dos cursos de biossegurança da Fiocruz, esse tipo de procedimento já tem precedente na Conep e não é eticamente correto. "Qualquer experimento que coloque em risco o sujeito da pesquisa não é aceito, mas o grave é que estava claro que haveria remuneração para o sujeito da pesquisa, o que não é permitido no Brasil", disse.

O trabalho em campo foi acompanhado pelo pesquisador americano Robert Zimmerman, que alega que não estava ciente da legislação brasileira. Nos EUA, a prática é permitida.

Consentimento

O tradutor do texto da pesquisa, Jaco Voorham, foi responsável também pela elaboração do termo de consentimento assinado pelos moradores da comunidade, que informava: "Você será solicitado como voluntário para alimentar 100 mosquitos no seu braço ou perna para estudos de marcação-recaptura. Isso ocorrerá duas vezes ao ano."

A epidemiologista Mércia Arruda, responsável pela análise de dados epidemiológicos deixou de acompanhar a pesquisa em maio de 2003 depois de ter sofrido um hematoma cerebral agudo e não foi substituída. "É impossível às vezes substituir um epidemiologista, inclusive porque eu ia só fazer análise epidemiológica", afirmou.

Malária

Em 2003 foram verificados na região 129 casos de malária. Deste total, 13 eram de capturadores. A Fiocruz afirma que os técnicos da pesquisa foram submetidos aos mesmos procedimentos adotados pelos capturadores. A fundação destaca que apóia as investigações e que se existirem culpados, eles deverão ser punidos.

O projeto foi financiado pelo Instituto Nacional de Saúde dos EUA, em parceria da Universidade da Flórida, da USP e da Fiocruz. O financiamento foi de US$ 1 milhão e os recursos eram usados para diárias, passagens e combustível sob a guarda da Universidade da Flórida.

Outro lado

Por meio de sua assessoria de imprensa, a USP informou que o holandês Jaco Voorham foi aluno da pós-graduação da instituição, e não professor visitante, como afirmou a Fiocruz. Ele sequer chegou a concluir a pesquisa que realizava sobre a malária.

Os professores que deram informações sobre Voorham, inclusive, duvidaram que ele pudesse ter conduzido uma tradução importante sozinho, pois não era fluente em português.

De acordo com a assessoria, Zimmerman afirmou, em e-mail à USP, que a tradução foi conduzida por Voorhan, por outra aluna da pós-graduação e epidemiologista Mércia Arruda, representante da Fiocruz.

Conforme informou à assessoria, a Faculdade de Saúde Pública confirma a versão da Fiocruz de que o trecho que mencionada o uso de iscas humanas não constava do texto oficialmente aprovado.

"Um convênio em desacordo com a legislação brasileira jamais seria aprovado pela universidade", afirmou a assessoria.

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