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14/06/2006
-
10h47
GILMAR PENTEADO
ANDRÉ CARAMANTE
FABIANE LEITE
da Folha de S.Paulo
Dos mortos pela polícia de São Paulo entre os dias 12 e 20 de maio, em supostos casos de resistência, 94% foram atingidos por tiros na cabeça e no peito. O alto índice de acerto em áreas consideradas letais pode ser mais um indício de abuso policial, segundo a comissão independente que apura as ações da polícia no período.
De acordo com levantamento do Ministério Público Estadual, 126 pessoas morreram em confrontos com a polícia paulista durante a crise provocada pelos ataques da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Os laudos necroscópicos do IML (Instituto Médico Legal) de 122 desses mortos foram entregues por promotores de Justiça à comissão independente, formada por órgãos e organizações não-governamentais de direitos humanos.
Segundo essa documentação, dos 122 mortos, 25 (20,49%) receberam tiros na cabeça --média de um em cada cinco mortos. Em pelo menos três casos, o disparo foi feito por trás e atingiu a nuca da vítima.
Uma grande parte dos mortos também foi atingida por tiros no peito, nas proximidades da região mamária, segundo os mesmos laudos. Dos 122, 90 (73,7%) receberam tiros nessas regiões. O número de mortos com disparos em áreas letais --cabeça e peito-- soma 115 pessoas (94%).
"Esses números mostram que, por detrás dos chamados casos de resistência seguida de morte, ocorreram execuções sumárias", afirmou Ariel de Castro Alves, do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
"Se a preocupação da polícia fosse uma ação repressiva e preventiva, os tiros deveriam ser, na maioria, em locais não-vitais", disse Alves.
Ele afirmou que o governo, durante a reação aos ataques do PCC, chegou a anunciar um número de presos que hoje se aproxima do número de mortos em confrontos --no levantamento até 24 de maio, eram 135 presos suspeitos de participar dos ataques do PCC.
"O número de presos e o número de mortos são bem semelhantes, o que mostra que havia um intuito deliberado de matar", afirmou Alves.
Abuso
O advogado Lúcio França, da comissão de direitos humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, também afirmou que a localização dos tiros revela um indício de abuso policial.
"Tiros no abdômen e nas pernas podem até matar, mas mostram que houve pelo menos uma intenção de evitar a morte", disse França.
Na edição de ontem, a Folha revelou outro indício de abuso policial: cerca de 60% dos mortos receberam tiros com a trajetória de cima para baixo --que demonstrariam que a vítima estava rendida, de joelhos ou no chão-- e disparos pelas costas. "A trajetória dos disparos, de cima para baixo, é outra evidência de que as ações teriam sido execuções sumárias", afirmou França.
Outro lado
Em nota oficial, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que, "quanto à investigação das mortes, não cabe à SSP fazer comentários e sim aguardar a conclusão dos inquéritos policiais. A investigação, através dos inquéritos em andamento, é o único caminho para o esclarecimento de cada morte".
Questionada, a pasta não respondeu em quais partes do corpo foram atingidos os 42 membros das forças de segurança mortos em ataques do PCC. Na mesma nota, o órgão disse que a orientação aos policiais é a utilização do "Método Giraldi de Tiro para Preservação da Vida" --tido como um dos melhores do mundo e recomendado pela ONU.
"O "Método Giraldi" preconiza que o gerenciamento de crises se resolva, preferencialmente, sem o disparo da arma de fogo. Ressalta procedimentos e não tiros. A arma é usada como instrumento de dissuasão. A orientação é só usar a arma como instrumento de defesa e garantia da vida. O disparo só ocorre quando o agressor ameaça a vida do policial ou de um terceiro."
"Quanto aos treinamentos práticos de tiro nas academias, a orientação é atingir o agressor --e não uma parte de seu corpo em especial-- para interromper uma ameaça", afirmou a nota da secretaria.
O secretário da Segurança Pública, Saulo de Castro Abreu Filho, foi procurado ontem, mas não se pronunciou. O governador Cláudio Lembo (PFL) afirmou ontem que Saulo foi destemido e, por isso, defendeu sua permanência no cargo até o fim do governo. Anteontem, a comissão independente que apura 492 homicídios durante a guerra entre o Estado e o PCC passou a pedir a saída dele do cargo.
Especial
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Tiros da polícia em guerra do PCC atingiram cabeça e peito
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ANDRÉ CARAMANTE
FABIANE LEITE
da Folha de S.Paulo
Dos mortos pela polícia de São Paulo entre os dias 12 e 20 de maio, em supostos casos de resistência, 94% foram atingidos por tiros na cabeça e no peito. O alto índice de acerto em áreas consideradas letais pode ser mais um indício de abuso policial, segundo a comissão independente que apura as ações da polícia no período.
De acordo com levantamento do Ministério Público Estadual, 126 pessoas morreram em confrontos com a polícia paulista durante a crise provocada pelos ataques da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Os laudos necroscópicos do IML (Instituto Médico Legal) de 122 desses mortos foram entregues por promotores de Justiça à comissão independente, formada por órgãos e organizações não-governamentais de direitos humanos.
Segundo essa documentação, dos 122 mortos, 25 (20,49%) receberam tiros na cabeça --média de um em cada cinco mortos. Em pelo menos três casos, o disparo foi feito por trás e atingiu a nuca da vítima.
Uma grande parte dos mortos também foi atingida por tiros no peito, nas proximidades da região mamária, segundo os mesmos laudos. Dos 122, 90 (73,7%) receberam tiros nessas regiões. O número de mortos com disparos em áreas letais --cabeça e peito-- soma 115 pessoas (94%).
"Esses números mostram que, por detrás dos chamados casos de resistência seguida de morte, ocorreram execuções sumárias", afirmou Ariel de Castro Alves, do Movimento Nacional de Direitos Humanos.
"Se a preocupação da polícia fosse uma ação repressiva e preventiva, os tiros deveriam ser, na maioria, em locais não-vitais", disse Alves.
Ele afirmou que o governo, durante a reação aos ataques do PCC, chegou a anunciar um número de presos que hoje se aproxima do número de mortos em confrontos --no levantamento até 24 de maio, eram 135 presos suspeitos de participar dos ataques do PCC.
"O número de presos e o número de mortos são bem semelhantes, o que mostra que havia um intuito deliberado de matar", afirmou Alves.
Abuso
O advogado Lúcio França, da comissão de direitos humanos da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo, também afirmou que a localização dos tiros revela um indício de abuso policial.
"Tiros no abdômen e nas pernas podem até matar, mas mostram que houve pelo menos uma intenção de evitar a morte", disse França.
Na edição de ontem, a Folha revelou outro indício de abuso policial: cerca de 60% dos mortos receberam tiros com a trajetória de cima para baixo --que demonstrariam que a vítima estava rendida, de joelhos ou no chão-- e disparos pelas costas. "A trajetória dos disparos, de cima para baixo, é outra evidência de que as ações teriam sido execuções sumárias", afirmou França.
Outro lado
Em nota oficial, a Secretaria da Segurança Pública afirmou que, "quanto à investigação das mortes, não cabe à SSP fazer comentários e sim aguardar a conclusão dos inquéritos policiais. A investigação, através dos inquéritos em andamento, é o único caminho para o esclarecimento de cada morte".
Questionada, a pasta não respondeu em quais partes do corpo foram atingidos os 42 membros das forças de segurança mortos em ataques do PCC. Na mesma nota, o órgão disse que a orientação aos policiais é a utilização do "Método Giraldi de Tiro para Preservação da Vida" --tido como um dos melhores do mundo e recomendado pela ONU.
"O "Método Giraldi" preconiza que o gerenciamento de crises se resolva, preferencialmente, sem o disparo da arma de fogo. Ressalta procedimentos e não tiros. A arma é usada como instrumento de dissuasão. A orientação é só usar a arma como instrumento de defesa e garantia da vida. O disparo só ocorre quando o agressor ameaça a vida do policial ou de um terceiro."
"Quanto aos treinamentos práticos de tiro nas academias, a orientação é atingir o agressor --e não uma parte de seu corpo em especial-- para interromper uma ameaça", afirmou a nota da secretaria.
O secretário da Segurança Pública, Saulo de Castro Abreu Filho, foi procurado ontem, mas não se pronunciou. O governador Cláudio Lembo (PFL) afirmou ontem que Saulo foi destemido e, por isso, defendeu sua permanência no cargo até o fim do governo. Anteontem, a comissão independente que apura 492 homicídios durante a guerra entre o Estado e o PCC passou a pedir a saída dele do cargo.
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