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31/12/2000 - 04h10

"Falta ao país uma política para as cidades", diz Conde

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MARCELO BERABA e ANTONIO CARLOS DE FARIA, da Folha de S.Paulo, no Rio

As grandes cidades e regiões metropolitanas brasileiras deveriam ter representação própria no Congresso Nacional.

Esta é a opinião do arquiteto Luiz Paulo Conde, que deixa a Prefeitura do Rio após oito anos de experiência administrativa, primeiro como secretário de Urbanismo e depois como prefeito.

Na sua opinião, falta ao país uma política para as cidades, que crescem sem racionalidade e sem infra-estrutura.

Conde, vice-presidente do PFL, passa a dirigir uma ONG especializada em questões urbanas e pretende se dedicar à campanha sucessória do presidente Fernando Henrique Cardoso.

Ele se declara disponível para assumir um cargo no governo federal.
Leia a seguir, trechos de sua entrevista, concedida na última quarta-feira.

Folha - Como deve funcionar a ONG que o senhor está criando para discutir os problemas urbanos?
Luiz Paulo Conde -
Ela vai se chamar Cidades. Terá sede no Rio, com representações em São Paulo, em outras cidades do Brasil e no exterior. Durante os últimos oito anos, esse grupo discutiu os problemas do Rio. Criamos uma prática diante dos problemas da cidade, que ampliou em muito nossa visão formada no mundo acadêmico. Agora, vamos usar esse conhecimento para auxiliar o planejamento e resoluções dos problemas das cidades.

No Brasil, sempre que se fala em plano habitacional, dá-se prioridade à construção de habitações. Essa política tem falhado muito porque não vê a necessidade do desenvolvimento da infra-estrutura, onde se inclui a construção de ruas, escolas, creches, hospitais, saneamento, equipamentos necessários à cidade.

Folha - O senhor acha que as cidades brasileiras vivem uma crise?
Conde -
O país há muito tempo não traça políticas urbanas. Continuamos expandindo as cidades de forma errada, para as periferias, em detrimento dos vazios urbanos mais próximos das regiões centrais. A solução é promover um adensamento organizado das áreas que já têm essa infra-estrutura. Aqui no Rio, fizemos o Favela Bairro, que dá infra-estrutura para áreas carentes já ocupadas. Isso pode significar o crescimento organizado delas.

Folha - O conjunto Nova Sepetiba, construído pelo governador Anthony Garotinho na zona oeste do Rio, com previsão de abrigar 10 mil pessoas longe do centro, é um exemplo desse tipo de erro de planejamento?
Conde -
Eu acho errado. Acredito que hoje em dia ele não faria mais. Às vezes um político comete erros, que são avaliados depois num raciocínio mais calmo. Até hoje temos problemas com Vila Kennedy, Cidade de Deus, conjuntos habitacionais construídos no passado, longe do centro, sem infra-estrutura.

Folha - O que deve ser feito para que sejam estabelecidas políticas urbanas?
Conde -
Nossa Constituição não faz distinção diante do tamanho das cidades. O tratamento de São Paulo ou Rio, que têm o terceiro e oitavo Orçamento do país, é igual ao de uma cidade pequena. Isso cria dificuldade para a articulação política.

Um governador, quando é eleito, elege senador, deputados federais e estaduais, prefeitos de cidades do interior, uma estrutura política que permite que ele tenha articulação em nível federal. Já um prefeito do Rio e São Paulo só elege vereadores. Como é que ele pode defender os interesses de sua cidade diante do país? Temos que mudar a Constituição para que as cidades grandes tenham representação nos Legislativos estadual e federal.

Folha - Como a falta de planejamento afeta o sistema de transportes?
Conde -
Nesse setor vivemos um caos, que afeta as grandes cidades brasileiras. Tentamos implantar um projeto chamado Riobus, para racionalizar o sistema.

Folha - Por que o projeto não foi levado à frente?
Conde -
Esperávamos criar uma agência metropolitana de transportes, para implantar um sistema integrado com cidades limítrofes. Embora a idéia tenha sido discutida com representantes de todos os setores, do governo estadual, do metrô, dos trens, das barcas, houve resistências.

Folha - Qual a solução, se não há consenso?
Conde -
Acho que o BNDES só deveria financiar projetos urbanos que tivessem essa perspectiva de planejamento global definida.

Folha - Quando se discutem nossas cidades, se fala nos fenômenos da violência e da exclusão.
Conde -
É um fenômeno mundial. No Brasil, toma acentos sempre mais fortes por uma desigualdade grande. Qual a maior preocupação do administrador? Diminuir a pobreza e aumentar a inclusão. Quando a gente fala em agenda urbana, é para aumentar a inclusão e diminuir a violência. Se hoje os índices de violência diminuíram no Rio e aumentaram em São Paulo, isso se deve a algum fenômeno.

Folha - Mas nós já mostramos numa reportagem que o tráfico permaneceu mesmo nas favelas beneficiadas pelo programa Favela Bairro.
Conde -
O tráfico permanece em Nova York, toma conta de bairros onde você não entra, e não é favela. Em São Paulo há bairros dominados pelo tráfico. A Cidade de Deus (favela e conjunto habitacional da zona oeste do Rio) é um bairro com ruas, praças, e o tráfico domina. Não é uma função do Favela Bairro expulsar o tráfico.

Folha - Como uma política para as cidades, como o senhor defende, deve encarar a questão do tráfico?
Conde -
São três fatores importantes: educação, educação e educação. E uma ação policial mais inteligente.

Folha - O senhor percebe nas cidades em geral essa ação inteligente da polícia?
Conde -
Não. Acho também que o governo federal acordou um pouquinho tarde. Agora é que começa a pensar no problema da segurança como um problema nacional. A minha geração foi criada pensando no futuro, sempre pensando no futuro. A gente sabia que tinha de progredir na vida. Hoje é muito diferente.

Folha - Mas qual a diferença da sua geração para a atual?
Conde -
Tem o famoso discurso do Clinton em que ele fala que a idade do crime diminuiu nos Estados Unidos. E diminuiu no Brasil também.

Folha - Mas o que fazer?
Conde -
A prevenção é a melhor coisa. Programas de ações de prevenção às drogas. E temos de criar para os jovens uma expectativa de futuro. Quando me formei, minha turma tinha 140 alunos e todos já estagiavam em algum escritório. Hoje isso é muito difícil. A juventude hoje, mesmo a classe mais alta, tem mais dificuldades e tenta prolongar a vida escolar para atrasar a entrada no mercado de trabalho.

Folha - E o que o senhor pretende fazer na política?
Conde -
Vou me engajar na sucessão do presidente Fernando Henrique, como membro do PFL, numa chapa com o PSDB, para dar continuidade a essa política, que ainda é o melhor para o Brasil. Não vejo outras propostas. Acho o José Serra (ministro da Saúde, PSDB), a Roseane Sarney (governadora do Maranhão, PFL) e o Jayme Lerner (governador do Paraná, PFL) muito competentes.

Folha - E essa história de que haveria uma articulação para o senhor assumir um ministério?
Conde -
Se me convidarem, eu aceito.

Folha - O senhor é candidato em 2002?
Conde -
Sou, mas ainda não sei a quê.
 

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