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04/03/2001
-
09h34
ALESSANDRO SILVA
SERGIO DURAN
da Folha de S.Paulo
O tráfico de drogas é o ''motor'' da corrupção dentro das prisões de São Paulo, onde o PCC (Primeiro Comando da Capital) domina. É como se a cadeia tivesse se tornado um morro do Rio de Janeiro, dominado por traficantes, que lidam com armas, fazem ''justiça'' por conta e corrompem.
A Folha mapeou, a partir de conversas com presos, familiares e funcionários, como esse comércio funciona no complexo do Carandiru, zona norte de São Paulo, o maior do país, onde vivem cerca de 9.500 condenados.
Lá, traficantes afirmam que chegam a faturar cerca de R¹ 2.000 por dia vendendo drogas como maconha, crack e cocaína, pelo dobro do preço em relação ao que é cobrado do lado de fora das muralhas.
"Aqui o maluco pode ganhar muito mais. Primeiro, porque a droga custa mais caro, e, segundo, porque aqui todo mundo já conhece o barato. E, na cadeia, a fissura é muito maior", afirma S., 24, chefe em um dos pavilhões da Penitenciária do Estado e que se diz membro do PCC. O traficante afirma entregar à facção parte do que arrecada lá dentro.
O esquema para transportar a droga para dentro do presídio depende do pagamento de funcionários, de visitas e até de estranhos contratados nas ruas.
Os funcionários cobram, segundo presos, cerca de 10% do valor que do que será arrecadado com a droga. Por exemplo: se 1 kg de maconha render R$ 10 mil, o funcionário embolsa R$ 1.000.
Durante a semana, a polícia prendeu um rapaz de 15 anos que receberia R$ 100 para jogar, por cima do muro, para dentro do pavilhão oito da Casa de Detenção, uma sacola com maconha (20 saquinhos) e carregadores de bateria de celular.
Esquema
S. disse à Folha que, até a megarrebelião do dia 18, seis gerentes dividiam a Penitenciária do Estado por áreas de atuação, que correspondem aos pavilhões
Hoje, a unidade tem cerca de 1.700 presidiários _800 a menos do que há duas semanas, por causa da série de transferências para desarticular a liderança do PCC.
Quando falou com a Folha, por celular, S., que cumpre pena por tráfico, estava ''chateado'' porque seria transferido com os demais membros do PCC. Ele deixaria na unidade cerca de R$ 10 mil em drogas estocadas.
Pelas regras da cadeia, seu substituto ficaria responsável por vender o produto e depositar o dinheiro na conta da sua mulher, que mora na zona sul. Segundo ele, o ''abastecimento das prisões é uma preocupação dos líderes que estão nas ruas''.
"O sistema induz à corrupção porque o Estado paga um salário miserável", diz Nilson de Oliveira, presidente do sindicato dos funcionários do sistema prisional de São Paulo (Sifuspesp).
Para o sindicalista, os funcionários não podem ser os únicos alvos das suspeitas. "Em uma prisão como a Detenção, é um entra-e-sai de caminhões de abastecimento, de organizações não-governamentais, advogados e outros", afirma Oliveira.
Prisão
A maior apreensão de drogas feita este ano nos presídios de São Paulo levou à prisão o agente carcerário José Carlos Dias, 39, e uma parente de um dos presos da Casa de Detenção, a costureira Silvana Rita dos Santos, 30. Ela havia sido revistada por ele, mas acabou barrada, em uma nova inspeção surpresa, levando oito quilos de maconha e dois celulares.
A explicação para os esquemas que a Folha encontrou pode estar relacionada com a expansão de organizações criminosas.
''O crime se organizou fora dos presídios e levou essa estrutura para dentro das prisões'', afirma o sociólogo Túlio Kahn, do Ilanud (Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e do Delinquente).
Quem não faz parte do esquema corre até risco de morte. Segundo Julia, 30, mulher de detento do complexo, o preso que não consome nenhum produto ou serviço do presídio, como drogas ou celulares, acaba sendo visto como "laranjão".
"É o cara que não vale nada para ninguém, nem para o preso traficante nem para o funcionário safado. Esses são os primeiros a morrer."
Morte
Quem deve, morre. O Carandiru é mais violento que a Colômbia, país com a maior taxa de mortalidade por homicídios da América Latina em razão da guerra entre traficantes, guerrilheiros e grupos paramilitares. No ano passado, o complexo paulista registrou 26 assassinatos por 10 mil "habitantes", enquanto a Colômbia teve 7,8.
No Carandiru, a maioria das vítimas morreu após ser atingida por ''armas brancas'', como são chamadas as facas e estiletes improvisados.
A última megarrevista feita na Casa de Detenção, no último dia 16, realizada em apenas dois pavilhões _onde estão 3,5 mil presos do complexo_, apreendeu um quilo de maconha, 300 pedras de crack e cinco balanças de precisão. Além disso, um preso tinha R$ 2.010 no bolso. O condenado não pode ter dinheiro na unidade.
De cada cinco detentos desses pavilhões, um estava armado com estilete. Após oito horas de revista, a polícia recolheu 793 facas improvisadas, feitas com pedaços de barras de ferro.
Tráfico impulsiona corrupção em prisões
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SERGIO DURAN
da Folha de S.Paulo
O tráfico de drogas é o ''motor'' da corrupção dentro das prisões de São Paulo, onde o PCC (Primeiro Comando da Capital) domina. É como se a cadeia tivesse se tornado um morro do Rio de Janeiro, dominado por traficantes, que lidam com armas, fazem ''justiça'' por conta e corrompem.
A Folha mapeou, a partir de conversas com presos, familiares e funcionários, como esse comércio funciona no complexo do Carandiru, zona norte de São Paulo, o maior do país, onde vivem cerca de 9.500 condenados.
Lá, traficantes afirmam que chegam a faturar cerca de R¹ 2.000 por dia vendendo drogas como maconha, crack e cocaína, pelo dobro do preço em relação ao que é cobrado do lado de fora das muralhas.
"Aqui o maluco pode ganhar muito mais. Primeiro, porque a droga custa mais caro, e, segundo, porque aqui todo mundo já conhece o barato. E, na cadeia, a fissura é muito maior", afirma S., 24, chefe em um dos pavilhões da Penitenciária do Estado e que se diz membro do PCC. O traficante afirma entregar à facção parte do que arrecada lá dentro.
O esquema para transportar a droga para dentro do presídio depende do pagamento de funcionários, de visitas e até de estranhos contratados nas ruas.
Os funcionários cobram, segundo presos, cerca de 10% do valor que do que será arrecadado com a droga. Por exemplo: se 1 kg de maconha render R$ 10 mil, o funcionário embolsa R$ 1.000.
Durante a semana, a polícia prendeu um rapaz de 15 anos que receberia R$ 100 para jogar, por cima do muro, para dentro do pavilhão oito da Casa de Detenção, uma sacola com maconha (20 saquinhos) e carregadores de bateria de celular.
Esquema
S. disse à Folha que, até a megarrebelião do dia 18, seis gerentes dividiam a Penitenciária do Estado por áreas de atuação, que correspondem aos pavilhões
Hoje, a unidade tem cerca de 1.700 presidiários _800 a menos do que há duas semanas, por causa da série de transferências para desarticular a liderança do PCC.
Quando falou com a Folha, por celular, S., que cumpre pena por tráfico, estava ''chateado'' porque seria transferido com os demais membros do PCC. Ele deixaria na unidade cerca de R$ 10 mil em drogas estocadas.
Pelas regras da cadeia, seu substituto ficaria responsável por vender o produto e depositar o dinheiro na conta da sua mulher, que mora na zona sul. Segundo ele, o ''abastecimento das prisões é uma preocupação dos líderes que estão nas ruas''.
"O sistema induz à corrupção porque o Estado paga um salário miserável", diz Nilson de Oliveira, presidente do sindicato dos funcionários do sistema prisional de São Paulo (Sifuspesp).
Para o sindicalista, os funcionários não podem ser os únicos alvos das suspeitas. "Em uma prisão como a Detenção, é um entra-e-sai de caminhões de abastecimento, de organizações não-governamentais, advogados e outros", afirma Oliveira.
Prisão
A maior apreensão de drogas feita este ano nos presídios de São Paulo levou à prisão o agente carcerário José Carlos Dias, 39, e uma parente de um dos presos da Casa de Detenção, a costureira Silvana Rita dos Santos, 30. Ela havia sido revistada por ele, mas acabou barrada, em uma nova inspeção surpresa, levando oito quilos de maconha e dois celulares.
A explicação para os esquemas que a Folha encontrou pode estar relacionada com a expansão de organizações criminosas.
''O crime se organizou fora dos presídios e levou essa estrutura para dentro das prisões'', afirma o sociólogo Túlio Kahn, do Ilanud (Instituto Latino Americano das Nações Unidas para a Prevenção do Delito e do Delinquente).
Quem não faz parte do esquema corre até risco de morte. Segundo Julia, 30, mulher de detento do complexo, o preso que não consome nenhum produto ou serviço do presídio, como drogas ou celulares, acaba sendo visto como "laranjão".
"É o cara que não vale nada para ninguém, nem para o preso traficante nem para o funcionário safado. Esses são os primeiros a morrer."
Morte
Quem deve, morre. O Carandiru é mais violento que a Colômbia, país com a maior taxa de mortalidade por homicídios da América Latina em razão da guerra entre traficantes, guerrilheiros e grupos paramilitares. No ano passado, o complexo paulista registrou 26 assassinatos por 10 mil "habitantes", enquanto a Colômbia teve 7,8.
No Carandiru, a maioria das vítimas morreu após ser atingida por ''armas brancas'', como são chamadas as facas e estiletes improvisados.
A última megarrevista feita na Casa de Detenção, no último dia 16, realizada em apenas dois pavilhões _onde estão 3,5 mil presos do complexo_, apreendeu um quilo de maconha, 300 pedras de crack e cinco balanças de precisão. Além disso, um preso tinha R$ 2.010 no bolso. O condenado não pode ter dinheiro na unidade.
De cada cinco detentos desses pavilhões, um estava armado com estilete. Após oito horas de revista, a polícia recolheu 793 facas improvisadas, feitas com pedaços de barras de ferro.
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