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11/04/2001 - 03h34

Descaso com a lei estimula tortura em prisões brasileiras, diz ONU

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LISANDRA PARAGUASSÚ, da Folha de S.Paulo, em Brasília

Relatório preparado pela ONU (Organização das Nações Unidas) após visita a estabelecimentos do sistema prisional brasileiro aponta que o país ignora a Lei da Tortura, aprovada há quatro anos, e não cumpre a legislação penal.

O documento constata que surras, pau-de-arara e outras formas de violência se transformaram em instrumentos comuns para obter informações e confissões de presos ou de acusados.

O texto foi produzido pelo relator especial do Comitê de Direitos Humanos da ONU, Nigel Rodley, que esteve no Brasil em agosto passado.

Seu conteúdo será apresentado oficialmente hoje à tarde durante reunião do órgão em Genebra, na Suíça.

Após visitar cinco Estados -São Paulo, Rio de Janeiro, Pernambuco, Pará e Minas Gerais- a convite do governo brasileiro, Rodley classificou de "apavorante" e "indescritível assalto aos sentidos" a situação nos presídios e delegacias.

Para ele, a falta de treinamento dos policiais e o excesso de poder dos delegados nas investigações também estão entre os problemas. "Uma cultura de brutalidade e, frequentemente, de corrupção é generalizada", escreve o relator.

Casos
Rodley anexou ao documento uma lista com 349 histórias de pessoas que se dizem vítimas de tortura por parte de policiais civis. Em alguns casos, nada foi feito. Em outros foram abertos inquéritos, mas o relator cobra do governo brasileiro os resultados.

O Ministério da Justiça pretende utilizar o relatório da ONU para cobrar dos Estados investigações das denúncias (leia texto na pág. C 3).

No final do documento, Rodley chega a fazer recomendações. O Ministério da Justiça informou que está fazendo um levantamento das providências tomadas pelos Estados. As informações serão repassadas à ONU.

Pontos positivos
O relator fez um elogio ao país: "Existem muitos aspectos positivos na legislação brasileira". Mas completou: "Só que eles são largamente ignorados".

Seriam três os pontos positivos. Entre eles estão a legislação, considerada moderna e adequada, e o presídio Nelson Hungria, em Minas Gerais, avaliado como relativamente moderno.

O projeto Delegacias Legais (RJ) -que pretende funcionar mais como posto de serviços que prisão- também foi tido como uma boa iniciativa, mas ainda com alguns problemas.

Objetivo
A convite do governo brasileiro, Rodley esteve no Brasil para verificar a ocorrência de tortura no sistema de segurança do país, mas também resolveu avaliar a situação do encarceramento por considerar que as condições das prisões representam uma forma de tortura, semelhante às surras a que os presos são submetidos.

A pior situação entre os locais visitados, segundo o relator, estava no 2º Distrito Policial de São Paulo. "Acredito que os detentos esperando para ser julgados nessas condições subumanas só podem aparecer em frente ao juiz como perigosos", escreveu.

No dia da visita, mais de 200 presos estavam amontoados quase sem roupas em um corredor de 40 metros por 1,5 metro. Os buracos que serviam de banheiros estavam todos entupidos e o cheiro, segundo Rodley, era insuportável.

No 2º DP de São Paulo, assim como em todos os outros lugares visitados pelo relator, as queixas de tortura e surras são comuns.

Os depoimentos relatados por Rodley foram considerados consistentes -alguns presos tinham marcas das surras e os ferros e paus usados foram encontrados.

O relator da ONU conclui que, apesar de os governos federal e estaduais adotarem um discurso em favor do cumprimento da lei, a prática é diferente. "A assessoria jurídica gratuita, obrigatória por lei, é ilusória para os 85% dos presos que precisam dela".

Segundo Rodley, a maior parte dos juízes prefere enquadrar os crimes
como lesões ou abuso de autoridade, não como tortura.

O relatório estará disponível, a partir das 8h45 (horário de Brasília), no site do Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (http://www.undp.org.br).

Leia mais:

  • Governo federal reconhece dificuldades em cumprir leis

  • Relator da ONU defende mudança no sistema prisional

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