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23/04/2001 - 04h23

Viaduto se torna casa para "órfão" do programa SOS Criança

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da Folha de S.Paulo

F. D., 17, foi uma das jovens que sobraram no SOS Criança e que, com o fechamento do programa, voltou para a rua.

Com 11 passagens pela Febem, F. diz ter perdido a conta de quantas vezes esteve no SOS. Grávida de dois meses, mora com o namorado com mais dois casais numa casa abandonada, que eles invadiram.

"Nos conhecemos em outro "mocó" e ficamos juntos", disse. Mocó é a moradia improvisada onde eles se amontoam. Pode ser casa abandonada, buraco em viaduto ou barraco.

Ela diz não sentir falta do SOS. "Era ruim lá. Os monitores tratavam a gente mal, e, mesmo dizendo que era aberto, nós ficávamos presos", disse.
Na atual casa, ela diz não ter também sossego. "A polícia aparece, bate na gente, manda todo mundo sumir de lá".

F.D. não sabe ainda o que vai fazer após o nascimento do filho. Ela está tentando um trabalho em uma cantina.

"Trabalho? Já desisti", rebate J.R.P.P., 15, que saiu de casa com o irmão gêmeo aos seis anos. Falando rápido, ele confessa que vive de pequenos furtos no centro. "Queria mesmo é voltar a estudar", diz o menino, que fez até a quarta série do ensino fundamental e tem duas passagens pela Febem.

J. dorme sob um viaduto no parque Dom Pedro, mas diz viver preocupado, porque batidas da polícia e brigas e facadas entre meninos são comuns.

Uma das poucas meninas entre os 20 jovens que vivem sob o viaduto, F.A.S., 17, também foi "despejada" do SOS Criança. Ela não sabe se tem parentes; a mãe, doente, e o pai, assassinado por traficantes, morreram quando F. tinha 5 anos.

Desde então, mora na rua. Com fama de brava, diz que os meninos não mexem com ela. "Já passei a faca em um, posso passar em outro", diz F., com oito passagens na Febem (roubo, tráfico e uso de drogas).

Entre os entrevistados pela Folha, o menino F.S.R., 16, é um dos poucos que tem contato com a mãe. Ele alterna períodos na rua e em casa desde os sete anos. Jurado de morte por traficantes há dois meses, perambula de uma entidade assistencial para outra. "Eles (traficantes) me culparam de uma batida da polícia, este ano".

Com exceção da menina que perdeu os pais, os outros jovens culpam padrastos por estarem na rua.

O menino F. disse que e matou o primeiro padrasto a porretadas, por não aguentar ver a mãe apanhar, e, pelo mesmo motivo, esfaqueou o segundo. "Foram 40 pontos".

A grávida F.D., que saiu de casa aos oito anos por apanhar do padrasto alcoólatra, diz que não sabe qual será o futuro de seu filho. "Só não quero duas coisas pra ele: um padrasto e essa vida que eu levo".

M. é o único que fala de um grupo de crianças que vive na avenida Ipiranga (centro de São Paulo). Pedindo dinheiro na rua, eles se queixam de ter interrompido a oportunidade de aprender uma profissão.

Seja dedo queimado ou olho roxo, todos têm marcas de violência. Não querem se identificar nem ser encontrados. Têm medo da família, dizem.

M. fazia curso de padeiro no SOS. Quando soube que o programa ia acabar, retornou à rua. "Não quero voltar para casa, porque apanho do padrasto", diz, com a orelha ferida.

Os meninos preferem a rua a um albergue. "A gente quer sair da rua para aprender uma profissão", afirma M.
(EM)
 

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