Saltar para o conteúdo principal

Publicidade

Publicidade

 
 
  Siga a Folha de S.Paulo no Twitter
07/07/2000 - 12h23

"Ladrão de idéia ninguém sabia que ele era", diz jornalista sobre Maluf

Publicidade

FABIANE LEITE, repórter da Folha Online

A jornalista Vânia Sarmento, 45, prestou depoimento à polícia no fim de abril, quando afirmou que a Onze, empresa de Flávio Maluf, filho do ex-prefeito Paulo Maluf, fez um vídeo para a Anhembi Turismo e Eventos sem licitação, "acobertada" por uma empresa "laranja", a Music Fest.

A Anhembi é uma sociedade anônima, em que a Prefeitura de São Paulo tem participação. O vídeo, batizado "São Paulo - Toda Emoção do Mundo", é uma fita promocional da cidade.

Documentos obtidos pela reportagem atestam que a licitação foi concluída depois do lançamento da fita.

Vânia começou como assistente técnica na Anhembi indicada por André Casquel Madrid, ligado à Onze, mas também passou por outros departamentos da empresa. Hoje ela continua trabalhando com roteiros de vídeo, como free-lancer.

A jornalista diz que teve a idéia da fita e reivindicou receber direitos autorais sobre o vídeo. Depois disto, foi demitida e diz ter sofrido pressões para cessar a luta.

A Anhembi alegou que, como funcionária da Anhembi, Vânia não teria de receber pelos direitos autorais, pois executara o serviço como contratada.

Vânia foi acusada pela Anhembi de tentar extorquir a empresa, em 96. A Anhembi denunciou à polícia que ela teria pedido R$ 300 mil para não denunciar irregularidades no vídeo a vereadores da oposição à véspera da eleição municipal daquele ano.

O processo sobre a suposta extorsão nem foi aberto. O Ministério Público Estadual e a Justiça decidiram arquivar a queixa da Anhembi.

Por outro lado, Vânia também denunciou a Anhembi em 96 por roubo de direitos autorais. Sua acusação também foi arquivada.

"Maluf roubou minha idéia", diz Vânia, que afirma também não ter mais como ser acusada de tentativa de extorsão porque os direitos que poderia ter sobre a fita já foram extintos.

A seguir, veja os principais trechos de entrevista de Vânia à Folha Online:

Vídeo: lançamento

Este vídeo foi feito, criado, produzido, apresentado em solenidade no Palácio de Convenções do Anhembi, na presença do então governador Fleury, do presidente Itamar. O Ricardo Castello Branco era presidente do Anhembi e o Maluf prefeito. Este vídeo foi apresentado em um telão, divulgando a cidade de São Paulo. Isso foi feito numa cerimônia do 7 º Cihat (Congresso Internacional de Hospedagem, Alimentação e Turismo). Foi em setembro de 94.

Eu tenho uma publicação da revista do 7º Cihat, produzida pela Abresi, com a foto da capa do vídeo, dizendo "Maluf lança vídeo, pretende traduzir", que é realmente o que ocorreu.

A licitação saiu depois do vídeo pronto. Como você contrata uma empresa para fazer uma coisa que já está pronta?

Eu respondo e aí entra o meu testemunho e outras pessoas podem ser interrogadas a respeito.

Eu era uma simples assistente técnica da Anhembi. Eu fui colocada lá pelo André Casquel Madrid, que foi diretor na Bandeirantes e na Record. Ele é malufista desde que nasceu. Eu era a única pessoa para encarar alguma coisa caso surgisse.

Ele era o colaborador do Dr. Maluf e é até hoje. Está numa produtora de vídeo que o Flávio Maluf tem. Foram eles que fizeram meu vídeo e colocaram um testa de ferro na licitação. Por isso que o vídeo estava pronto antes da licitação.

Idéia e licitação

Meu departamento não tinha credibilidade. Era a TVA, TV Anhembi, que era um caminhão com vídeo-wall que transmitia eventos em praça pública.

Mas, como funcionária, tinha aspirações. Aí tive a idéia de vídeo de turismo sobre a cidade. Coloquei no papel, e como é o que eu sei fazer, ficou convincente. Minha chefe, tinha acesso ao gabinete do Paulo Maluf.

O Maluf achou maravilhosa a idéia. Soube que ele ligou para o presidente (da Anhembi), acho que ainda era o David Raw. Na época da licitação já era o Castelo Branco. Foi no começo de 94.

Segundo soube, o Paulo Maluf ordenou a produção e quis que o Madrid dirigisse. Lá na Anhembi, todo mundo sabia.

Recebi a ordem: "pode começar a fazer o roteiro, produção".

Eu tinha contato direto com o Madrid, como era ele que iria dirigir e tinha pressa...

Ele tinha cargo na Onze. Tem até hoje. Não sei se tem registro. Ele manda na Onze. Já trabalhava lá naquela época.

Laranja

Comecei a fazer o roteiro na maior paixão. O Madrid me cobrava direto, dizia que o prefeito estava com pressa. Tenho testemunho dos porteiros do meu prédio de que ele esteve na minha casa.

O roteiro ficou perfeito. Foi produzido, eu que fiz todos os contatos com os lugares filmados. Mandava fax do Anhembi, sempre em contato com a produtora do Flávio Maluf, com a secretária.Depois que fazia o primeiro contato, o Madrid marcava.

Aí foram buscar uma empresa laranja. Tinha de haver uma licitação. Fiquei sabendo da preocupação. Todos funcionários sabiam que o vídeo era feito pelo Flávio Maluf e que tinha de se conseguir uma empresa laranja para colocar na licitação.

Foram buscar um amigo do Madrid, chamado Caetano Zammarato (dono da Music Fest), nada ligado a produção de vídeo deste porte. Ele topou. E a empresa foi a única licitada.

Direito autoral

Na qualidade de criadora do projeto, me coloco à disposição de quem quer que seja para provar que fiz. Que nos confrontem para discutir este roteiro. Eu conheço, eu fiz, eu desafio.

A Anhembi alega que se o vídeo era meu, eu era paga para isto, só que nunca me disseram qual a função de assistente técnica, que não é escrever roteiro de vídeo. Pela lei dos direitos autorais, ainda que paga, eles teriam de me dar 5% do valor do direito.

No entanto, preferiram montar um processo de extorsão contra mim. Eu torcia pelo vídeo, nunca me passou que fosse dar no que que deu.

Tenho cópia do roteiro original com minhas anotações, a empresa laranja não mudou uma vírgula, só colocou o logotipo dela.

O dono da licitada (a Music Fest) sabe que (o vídeo) é meu. Todo mundo levando vantagem e me ignorando.

Registrei o vídeo (os direitos sobre a fita) na Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro em 96.

Pressões

Numa carreata do Pitta (durante a campanha para prefeito em 96), burlei a segurança e peguei o Maluf. Ele me indicou um assessor. Acreditei que este homem poderia ter vontade de fazer justiça (segundo Vânia, ela lhe pediu que a ajudasse a conseguir os direitos autorais sobre o vídeo). Ele me deu o celular de um assessor.

Depois, contei ao assessor, que ligou na minha frente para o Castello Branco. Ele (o assessor) disse (ao Castello Branco): "Resolve, estamos na campanha. Minha função é defender a imagem do prefeito e do candidato".

O Ricardo me bipou. No gabinete dele, a portas fechadas, me disse que tinha sido um erro a minha demissão, que ficou sabendo pelo Madrid que eu tinha prestado serviço ao Maluf.

Ele disse: "Não posso te readmitir porque soaria como se estivesse querendo fraudar o fundo de garantia. Proponho que você vá trabalhar na Prodam (Companhia de Processamento de Dados do Município), porém assina um documento de que não tem nada a ver com o vídeo".

Eu disse que não assinaria nada, disse que queria meu direito autoral. Entrei com inquérito, uma queixa, no 13º DP.

Maluf

Não estou nem mais reivindicando o direito autoral. Cinco anos depois, o direito patrimonial prescreve. Ninguém pode dizer que estou tentando extorquir. Quero que se levante uma bandeira que ninguém levantou ainda. Ladrão de idéia, ninguém sabia que ele era, acrescente-se ao currículo dele.

Já que a coisa prescreveu e não podem mais mover um processo de extorsão contra mim. O Brasil é o país da arte. Ninguém dá valor para direito autoral. Se alguém rouba sua idéia, não é de interesse público.

Leia mais sobre o caso na Folha Online

Leia mais notícias de cotidiano na Folha Online

Discuta esta notícia nos Grupos de Discussão da Folha Online

 

Publicidade

Publicidade

Publicidade


Voltar ao topo da página