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02/01/2002 - 21h13

Programa pode ser aprovado com apoio à união de homossexuais

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ANDRÉA MICHAEL
da Folha de S.Paulo, em Brasília

A nova versão do Programa Nacional de Direitos Humanos do governo, submetida a consulta pública até o próximo dia 10, tira a referência preconceituosa aos homossexuais nas Forças Armadas e apóia a união civil entre pessoas do mesmo sexo.

A proposta manda excluir o termo "pederastia" do artigo 235 do Código Penal Militar, que caracteriza, entre os crimes sexuais, "praticar ou permitir o militar que com ele se pratique ato libidinoso, homossexual ou não, em lugar sujeito à administração militar".

Não há atualmente uma proibição explícita para o ingresso de homossexuais nas Forças Armadas, nem o Programa Nacional de Direitos Humanos vai liberar a presença de homossexuais nos serviços militares.

Mas, no entendimento de grupos militantes, a menção à pederastia, presente hoje no código, revela o preconceito existente na cultura militar em relação a qualquer opção que não seja a heterossexual. O Código Penal Militar é de 1969.

O caso mais famoso de homossexualismo entre militares aconteceu em 1996 e foi protagonizado pelo tenente-coronel Sérgio Carlos Zani Maia, então comandante do Regimento Sampaio, no Rio de Janeiro.

Maia foi flagrado mantendo relações sexuais dentro de seu próprio carro com um comerciante no subúrbio do Rio de Janeiro. O Regimento Sampaio funcionou em escala especial hoje e não foi informada à reportagem a atual condição de Maia. O telefone dele não consta na lista de assinantes a seu pedido.

Tramitação
A proposta de revisão do Programa Nacional de Direitos Humanos chegou às mãos do presidente Fernando Henrique Cardoso no dia 19 de dezembro. O texto estará disponível para consulta pública e apreciação dos interessados no site do Ministério da Justiça (www.mj.gov.br) até o dia 10.

Ao todo, são 500 propostas, das quais cinco tratam especificamente da orientação sexual. O termo conceitua a opção de sexo como uma preferência que independe da condição biológica da pessoa. No capítulo sobre o direito à liberdade, há outros dez itens relacionados aos homossexuais.

"Isso [excluir o termo pederastia do Código Penal Militar] seria inovação se fosse em 1911. Estamos falando de uma proposta que reflete o entendimento da sociedade civil e deverá ser avaliada pelos militares", afirmou Paulo Sérgio Pinheiro, secretário nacional de Direitos Humanos do Ministério da Justiça.

Segundo Pinheiro, até o Carnaval, vai-se trabalhar um texto final que será transformado em decreto presidencial com as diretrizes gerais do novo programa.

"A gente espera que o presidente Fernando Henrique, no seu último ano de governo, seja mais solidário com os homossexuais, que discuta e encaminhe essas mudanças", declarou Marcelo Cerqueira, vice-presidente do Grupo Gay da Bahia.

O texto contempla a parceria civil entre pessoas do mesmo sexo, um projeto apresentado pela hoje prefeita de São Paulo, Marta Suplicy. Em tramitação na Câmara, a idéia enfrenta resistência nas bancadas católica e evangélica.

Pretende-se também aperfeiçoar a legislação penal, incluindo, por exemplo, a orientação sexual como fator agravante das penalidades. A repressão à discriminação racial segue essa linha, que já é adotada pela legislação dos Estados Unidos.

Perseguição
O cabeleireiro V.E.C., 33, deixou a Aeronáutica em 1991. Nascido em Ilhéus (BA), durante quatro anos serviu à Força na Base Aérea de Salvador. "Eles me perseguiram porque eu sou homossexual, pediram minha farda e eu entreguei", afirma V.E.C.

Filho de família pobre, tornar-se um militar era, além de um sonho, a garantia de um futuro melhor para a família. "Se eu tivesse dinheiro para contratar um bom advogado e enfrentar os militares, eu voltaria. Poderia ser até um sargento hoje."

V.E.C. conta que, ao deixar a Base Aérea de Salvador, estava na fase final do curso preparatório para cabos, em 1990. Foi então convocado para depor durante as investigações sobre a conduta de um de seus amigos, também homossexual.

"Eles me perguntaram se eu sabia de alguma coisa, se eu também era [homossexual]. Eu neguei. O meu amigo foi flagrado fazendo sexo em serviço, eu não. Sempre tive boas notas. Era um soldado disciplinado."

V.E.C. não contou à família as razões pelas quais deixou a Aeronáutica. Para ganhar a vida, foi segurança e vigia de casas comerciais. Só depois optou pela carreira nos salões de beleza de Ilhéus.

A história de V.E.C. é conhecida na cúpula do Grupo Gay da Bahia. Por indicação da entidade, a reportagem chegou a ele.

Mais conhecido que o caso de V.E.C. é o do ex-cabo carioca Flávio Alves, 31. Depois de servir a Marinha por uma década, ele deixou a farda, mudou-se para os Estados Unidos e passou a se dedicar à defesa dos direitos dos homossexuais.


 

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