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27/01/2002 - 08h46

Vinhedo adota segurança municipalizada

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RICARDO KOTSCHO
da Folha de S.Paulo, em Vinhedo

Polícias Civil e Militar trabalhando juntas, com veículos e instalações mantidos em boas condições pela prefeitura.

Investimentos em pessoal e equipamentos para a Guarda Municipal, oferecendo bons salários e cursos de formação e de aperfeiçoamento. Instalação de câmeras de vídeo eletrônicas e postos de policiamento comunitário por toda a cidade.

Comando unificado, participação da comunidade na elaboração do Orçamento e contatos permanentes entre os responsáveis pela segurança pública e a prefeitura.

Quase tudo o que vem sendo proposto por especialistas em segurança pública para enfrentar a crescente onda de violência nos últimos dias, depois da porta arrombada, já existe e funciona em Vinhedo, cidade de colonização italiana com 47 mil habitantes, a apenas 76 km de São Paulo e 17 km de Campinas.

O melhor de tudo: devolver a sensação de segurança à população e zelar por essa ilha de relativa tranquilidade na convulsionada região metropolitana de Campinas custa muito pouco.

A despesa mensal da prefeitura com a Guarda Municipal, que conta com 86 homens armados e 19 veículos, mais do que as estaduais polícias Civil e Militar juntas, é de R$ 250 mil, ou seja, algo em torno de R$ 5 por habitante.

Políticos do governo e da oposição interessados em saber qual é a receita do modelo de Vinhedo -que fez cair em 60% o número de furtos e roubos de veículos entre 1999 e 2001 e reduziu a dois os homicídios no ano passado, sem nenhum registro de sequestro desde 1999- podem alugar juntos um ônibus para conhecê-la.

São apenas 40 minutos de viagem de São Paulo. Em Vinhedo, basta procurar o engenheiro projetista Milton Serafim, 51, do PSDB, prefeito reeleito em 2000, com 72% dos votos.

Quando assumiu pela primeira vez a prefeitura, em 1997, a primeira providência de Serafim foi investir pesado na educação e na saúde, principais reivindicações apresentadas nas primeiras reuniões do orçamento participativo.

Nomeou o seu vice, professor Élsio Boccaletto, do PT, para a Secretaria da Educação, municipalizou todas as 11 escolas de ensino fundamental (antes, só havia uma da prefeitura), hoje com 7.000 alunos, e o pronto-socorro municipal, que pertencia à Santa Casa. O índice de mortalidade infantil é de 7,5 por 1.000 crianças até um ano de idade -o índice do Brasil é 34,6, segundo os dados mais recentes do Ministério da Saúde, que são de 1996.

A cidade não tem favelas, nem sequer um barraco. O único que apareceu, em 1998, não durou mais do que um dia e uma noite. A mulher do prefeito, Neusa, presidente do Fundo Social de Solidariedade, foi lá, conversou com a família e deu um jeito de providenciar um teto decente.

Os resultados não demoraram. Entre os 5.507 municípios brasileiros, Vinhedo está em quinto lugar no item melhor atendimento à infância, segundo levantamento feito pelo Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância), a pedido da ONU.

A grande virada na área da segurança só se deu em outubro de 1999, quando o prefeito começou a ouvir muitas queixas sobre o policiamento da cidade, e a segurança se tornou prioridade.

'Nós temos um estilo muito prático. Nasci e sempre vivi aqui. Conheço bem o município e suas necessidades. Percebi que algo não ia bem', diz o prefeito, ao falar sobre as novas providências.
Em primeiro lugar, pediu ao governo do Estado a transferência de dois veteranos e acomodados delegados, substituídos por policiais dispostos a irem para a rua mostrar serviço.

Chamou os novos delegados e perguntou a eles o que precisavam para a Polícia Civil cumprir bem a sua função. O prédio, que estava caindo aos pedaços, foi reformado, assim como aconteceu com os veículos, tudo por conta da prefeitura, que também forneceu funcionários para liberar policiais do serviço burocrático.

Em troca, Serafim pediu que os delegados prestassem contas do trabalho diretamente a ele. Fez o mesmo com a Polícia Militar. O sistema de rádio das três corporações policiais funciona na mesma frequência. Quer dizer, na prática, o prefeito municipalizou e unificou o comando da segurança.

"De olho no piolho"

O secretário da Segurança Pública e dos Transportes, Antonio Luiz Falsarella, 39, advogado, empresário e tenente da reserva do Exército, reestruturou a Guarda Municipal, dobrando o efetivo e triplicando o número de veículos. O piso salarial é de R$ 1.200.

Com tudo isso, a maior preocupação na área de segurança em Vinhedo hoje, diz Falsarella, é a violência que existe em volta dela. 'Precisamos evitar que ela entre na cidade. É como meu pai fala: tem de ficar de olho no piolho.'

O passo seguinte foi instalar 41 câmeras eletrônicas, que são monitoradas 24 horas por dia nos cinco PAC (Postos de Atendimento Comunitário), outra iniciativa do prefeito. É praticamente impossível entrar e sair de Vinhedo sem ter a imagem gravada.

Os 17 acessos à cidade são permanentemente vigiados, com bloqueios quase diários promovidos em conjunto pelas três corporações. As câmeras de vídeo servem também para impedir a permanência de pedintes ou flanelinhas nos cruzamentos, que costumam facilitar a ação de marginais nas grandes cidades.

Se aparecer algum deles nas imagens das ruas e for morador da cidade, é levado ao Conselho Tutelar ou ao Serviço de Assistência Social; se for de fora, é convidado a ir embora, mesmo que a prefeitura tenha de fornecer a passagem.

'Precisávamos dar uma resposta rápida para ganhar a confiança da população', diz o sargento Márcio Luiz Aprígio, 35, emprestado pela Polícia Militar à Prefeitura de Vinhedo para comandar a Guarda Municipal.

Resultado: o registro de ocorrências de roubos e furtos de veículos caiu de 223, em 1999, para 109, em 2001, o que corresponde ao número de um final de semana na cidade de Campinas.

Traficantes presos

Em apenas quatro meses, após a implantação da nova proposta de segurança unificada, foram colocadas atrás das grades três quadrilhas de traficantes que agiam na cidade e que até agora não foram substituídas.

O que dá mais trabalho aos policiais de Vinhedo são os acidentes de trânsito sem vítimas, segundo o delegado Álvaro Santucci Noventa Júnior, 37, e o tenente José Ricardo Trevisan Arantes, 32, comandante do pelotão da Polícia Militar de Vinhedo.

Com 25 mil veículos cadastrados, a cidade conta com um para cada dois moradores, sem falar nos carros da população flutuante de 15 mil pessoas que invade o município nos finais de semana em busca de lazer. Além disso, para fugir do posto de pedágio, cerca de 1.500 carros e caminhões cruzam a cidade em horários de pico.

O delegado e o tenente, trabalhando em prédios próximos e com o discurso afinado, atribuem a queda dos índices de criminalidade em Vinhedo ao entrosamento entre os policiais das três corporações e aos investimentos em segurança feitos pelo prefeito.

Prova disso é que a cadeia pública foi interditada há três anos e ninguém está sentindo falta dela. Quando prendem alguém, mandam para Campinas. 'Os bandidos geralmente são de lá mesmo. Estamos só devolvendo', afirma o delegado Noventa Júnior.

A voz das ruas

Em Vinhedo, não só lugar de polícia é nas ruas, mas o do prefeito também. Quarto-zagueiro do time de veteraníssimos do Esporte Clube Capela, Serafim gosta de andar pelas ruas e pelas praças da cidade, entrar nos botecos, conversar com os moradores e não costuma perder convites para um bom churrasco.

"Prefeito que ouve bastante erra menos', diz. 'Quantidade não faz qualidade. Não adianta só colocar mais policiais nas ruas e pagar um bom salário. O policial tem que trabalhar contente, ser bem equipado, ter boas condições de trabalho. Tudo o que o governo agora está falando já estamos fazendo aqui há anos.'

As conquistas de Vinhedo na área da segurança atraíram o interesse de cidades vizinhas e até de outros Estados. Quase toda semana, chegam representantes de outras prefeituras em busca do know-how da cidade no combate à violência.

No final do ano passado, Serafim foi eleito presidente do recém-criado CDR (Conselho de Desenvolvimento da Região Metropolitana de Campinas). Agora, ele quer espalhar a experiência de Vinhedo para os outros 18 municípios que compõem a região, onde vivem 2,3 milhões de pessoas.

Serafim sabe que não é fácil aplicar o modelo em outras cidades. Vinhedo tem características muito especiais, que facilitam o seu trabalho, como a pequena área territorial do município -apenas 82 km2- por onde se espalham 20 condomínios com esquemas próprios de segurança. O maior empregador da cidade, por exemplo, é o condomínio Marambaia, com 1.817 lotes, que dá trabalho para mais de 1.500 pessoas -entre elas, 120 seguranças.

Mas ele não abre mão de levar à próxima reunião do CDR, no próximo dia 9, a receita que aplicou em Vinhedo e deu certo. 'A única saída é a educação. É por aí que começa toda transformação. Na área de segurança, é preciso ter comando e se cercar de pessoas que sejam do ramo.'

Em pleno período de recesso, Serafim deu um exemplo desse poder de comando ao reunir em seu gabinete, na quarta-feira, 12 dos 15 vereadores do município para discutir a nova Lei de Incentivo às Empresas.

Com 200 indústrias e 1.410 empresas nos setores comercial e de prestação de serviços instaladas na cidade, o prefeito tem de ficar atento para manter o nível de emprego, outro ingrediente básico da receita que garante a segurança de Vinhedo.

 

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