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26/05/2002
-
03h53
MARIO CESAR CARVALHO
da Folha de S. Paulo
Xapuri (AC) entrou para a história brasileira por causa da violência -o assassinato do seringueiro e líder ambientalista Chico Mendes em 1988.
Agora, a cidade pode fazer história com uma boa notícia: saiu de lá a matéria-prima para a primeira coleção de móveis ecologicamente correta feita com madeira da Amazônia.
Mais importante do que a própria coleção, que será lançada terça-feira no Museu da Casa Brasileira, talvez seja o modelo usado para produzi-la. Ela resultou de uma aliança entre ex-seringueiros, um engenheiro florestal com doutorado em Harvard e alguns dos melhores designers brasileiros, como Carlos Motta, Claudia Moreira Salles e Etel Carmona, que coordena a coleção.
O processo começou com a certificação de uma área de floresta em Xapuri, obtida em março. A certificação é uma espécie de selo verde, o qual garante que a extração da madeira é ecologicamente correta, socialmente justa e economicamente viável. Foi a primeira floresta comunitária do país a receber o selo do FCS (iniciais em inglês do Conselho de Manejo Florestal), entidade que atua em 49 países.
A certificação freou um processo de destruição da mata, conduzido pelos próprios seringueiros. Com a queda do preço da borracha, as famílias começaram a derrubar a mata para fazer roçados de feijão, milho e mandioca.
"Nós não sabíamos que estávamos agredindo a floresta", diz Duda Mendes, 42, presidente da Associação dos Moradores e Produtores do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes e primo do líder ambientalista assassinado. "Com a certificação da floresta, descobrimos que dá para ganhar mais dinheiro mantendo a mata em pé."
O engenheiro florestal Virgílio Viana, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP e doutor por Harvard, diz que, com a substituição do roçado pela madeira certificada, a renda anual das famílias deve subir de R$ 1.000 para R$ 6.000.
Viana entusiasmou-se tanto com Xapuri que decidiu abrir, em 2000, uma fábrica de móveis no Acre em sociedade com Etel Carmona. "Não adianta só falar contra o desmatamento. Temos que mostrar que há saídas ambientais e sociais para as populações da Amazônia", diz Etel.
A saída ambiental é a mata certificada. A social, segundo ela, é agregar valor à matéria-prima. Não por acaso a coleção de móveis chama-se "Jóias da Floresta" e é uma espécie de manifesto contra a idéia de que mato é praga.
Etel e Viana gastaram, há dois anos, R$ 500 mil para criar a fábrica de móveis Aver, em Xapuri, e até dezembro devem ter o retorno do investimento. Numa cidade de 11.956 habitantes, empregam 25 pessoas, que ganham dois salários mínimos por mês, um valor alto para os padrões do Acre, e um percentual de produtividade. Cerca de 50 pessoas estão envolvidas com jardinagem florestal, a forma como Viana chama o processo.
Para designers, a madeira certificada representa o fim de um mal-estar -o de usar matéria-prima de procedência desconhecida. "Comprar madeira sempre teve um lado meio criminoso para mim. Quase não dá para trabalhar quando você sabe que a procedência não é boa", diz o designer Carlos Motta, 50. Etel concorda: "Designer sem preocupação ambiental é um destruidor."
A Amazônia produz madeira certificada desde meados da década de 90, mas quase toda a produção é exportada. A procura é tão grande que o produto custa 30% a mais que a madeira comum.
Com a coleção é possível mobiliar uma casa só com móveis certificados. Custaria R$ 62.500. Os preços dos móveis variam de R$ 1.000 (cadeira) a R$ 10 mil (cama). "Sei que só a elite pode comprar porque o que faço é alta costura. Mas o meu sonho é vender móveis certificados nas Casas Bahia", afirma Etel. O sonho da exportação ela já realizou: os móveis made in Xapuri já estão à venda em Nova York.
Cidade no Acre produz coleção ecológica de móveis
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da Folha de S. Paulo
Xapuri (AC) entrou para a história brasileira por causa da violência -o assassinato do seringueiro e líder ambientalista Chico Mendes em 1988.
Agora, a cidade pode fazer história com uma boa notícia: saiu de lá a matéria-prima para a primeira coleção de móveis ecologicamente correta feita com madeira da Amazônia.
Mais importante do que a própria coleção, que será lançada terça-feira no Museu da Casa Brasileira, talvez seja o modelo usado para produzi-la. Ela resultou de uma aliança entre ex-seringueiros, um engenheiro florestal com doutorado em Harvard e alguns dos melhores designers brasileiros, como Carlos Motta, Claudia Moreira Salles e Etel Carmona, que coordena a coleção.
O processo começou com a certificação de uma área de floresta em Xapuri, obtida em março. A certificação é uma espécie de selo verde, o qual garante que a extração da madeira é ecologicamente correta, socialmente justa e economicamente viável. Foi a primeira floresta comunitária do país a receber o selo do FCS (iniciais em inglês do Conselho de Manejo Florestal), entidade que atua em 49 países.
A certificação freou um processo de destruição da mata, conduzido pelos próprios seringueiros. Com a queda do preço da borracha, as famílias começaram a derrubar a mata para fazer roçados de feijão, milho e mandioca.
"Nós não sabíamos que estávamos agredindo a floresta", diz Duda Mendes, 42, presidente da Associação dos Moradores e Produtores do Projeto de Assentamento Agroextrativista Chico Mendes e primo do líder ambientalista assassinado. "Com a certificação da floresta, descobrimos que dá para ganhar mais dinheiro mantendo a mata em pé."
O engenheiro florestal Virgílio Viana, professor da Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da USP e doutor por Harvard, diz que, com a substituição do roçado pela madeira certificada, a renda anual das famílias deve subir de R$ 1.000 para R$ 6.000.
Viana entusiasmou-se tanto com Xapuri que decidiu abrir, em 2000, uma fábrica de móveis no Acre em sociedade com Etel Carmona. "Não adianta só falar contra o desmatamento. Temos que mostrar que há saídas ambientais e sociais para as populações da Amazônia", diz Etel.
A saída ambiental é a mata certificada. A social, segundo ela, é agregar valor à matéria-prima. Não por acaso a coleção de móveis chama-se "Jóias da Floresta" e é uma espécie de manifesto contra a idéia de que mato é praga.
Etel e Viana gastaram, há dois anos, R$ 500 mil para criar a fábrica de móveis Aver, em Xapuri, e até dezembro devem ter o retorno do investimento. Numa cidade de 11.956 habitantes, empregam 25 pessoas, que ganham dois salários mínimos por mês, um valor alto para os padrões do Acre, e um percentual de produtividade. Cerca de 50 pessoas estão envolvidas com jardinagem florestal, a forma como Viana chama o processo.
Para designers, a madeira certificada representa o fim de um mal-estar -o de usar matéria-prima de procedência desconhecida. "Comprar madeira sempre teve um lado meio criminoso para mim. Quase não dá para trabalhar quando você sabe que a procedência não é boa", diz o designer Carlos Motta, 50. Etel concorda: "Designer sem preocupação ambiental é um destruidor."
A Amazônia produz madeira certificada desde meados da década de 90, mas quase toda a produção é exportada. A procura é tão grande que o produto custa 30% a mais que a madeira comum.
Com a coleção é possível mobiliar uma casa só com móveis certificados. Custaria R$ 62.500. Os preços dos móveis variam de R$ 1.000 (cadeira) a R$ 10 mil (cama). "Sei que só a elite pode comprar porque o que faço é alta costura. Mas o meu sonho é vender móveis certificados nas Casas Bahia", afirma Etel. O sonho da exportação ela já realizou: os móveis made in Xapuri já estão à venda em Nova York.
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