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22/09/2002 - 03h56

Confessionário da catedral da Sé atrai desesperado anônimo

da Folha de S.Paulo

Entre os vários párocos que passaram pela Sé, costuma-se dizer que a catedral é o refúgio dos desesperados. A rotatividade é grande na igreja e, ao ser designado, é preciso se preparar para missas diárias pouco prestigiadas e atendimento pastoral agitado.

"Nessas horas, é possível conferir o drama da vida das pessoas", conta o monsenhor Dario Bevilacqua, 70, da igreja da Consolação, um dos párocos que por mais tempo ficou na Sé, de 1981 a 1992.

"Pela localização central, a catedral atrai essas pessoas por uma questão de anonimato. Às vezes, no bairro, elas são conhecidas do vigário e se acanham", diz o monsenhor, que já ouviu histórias de crises financeiras, amor e brigas, sempre "dramáticas".

Casamentos, batizados e outras cerimônias litúrgicas são raras na Sé. No caso dos matrimônios, há duas dificuldades: o desembarque da noiva na praça e a falta de estacionamento. Já as grandes celebrações internas da arquidiocese são constantes -até porque é a igreja onde fica a cátedra (por isso "catedral") do arcebispo.

A igreja-mãe também é muito visitada por turistas, brasileiros e estrangeiros. "Os que vêm do interior costumam visitar a matriz da cidade, e a Sé é isso", diz.

Essa característica complica um pouco a vida dos paroquianos. Há poucos, porém aguerridos. Exemplo são os membros da Irmandade do Santíssimo Sacramento, uma das associações de leigos mais antigas de São Paulo, com sede na catedral da Sé.

A irmandade foi fundada por volta de 1745, quando, segundo os arquivos da arquidiocese, "havia 800 casais" no município.

"No passado, tinha muita gente, mas as senhoras de idade morreram, e o pessoal jovem não quer entrar", diz a funcionária pública aposentada Eugênia Santos Fontana, 84, membro da irmandade.

Eugênia sente falta da capela do Santíssimo, que ficava na Sé, onde a irmandade se reunia às quintas-feiras. Ela frequenta a catedral desde que foi inaugurada, em 1954. "Na verdade, desde que a matriz provisória funcionava na igreja da Boa Morte", conta.

Como a catedral levou 41 anos para ser construída, do início das obras à inauguração, alguns paroquianos assistiam missas na cripta, pequena igreja que fica embaixo do altar-mór da catedral.

"Papai gostava de passear pela praça da Sé e ficar observando os mestres de cantaria e escultores fazendo os relevos da igreja. Muita gente fazia isso", conta a dona-de-casa Elza Duprá, 84, outra integrante da irmandade.

Desse capítulo da história da catedral, o paraibano Geraldo Soares de Medeiros, 42, sacristão da Sé há 23 anos, não pode falar. Já sobre o período de agitação política, ele guarda muitas histórias.

Foi Medeiros o responsável por cuidar do plano de fuga de lideranças políticas, em caso de repressão policial, no grande comício das Diretas Já, realizado em frente à catedral, em 1984. "Eles entrariam pela porta principal e sairiam pelos fundos", afirma.

Segundo o sacristão, não é fácil trabalhar na Sé. Uma de suas funções é a revisão da noite. Antes de fechar a catedral, ele tem de olhar confessionários, cripta e outros esconderijos para ver se não há ninguém dormindo no local. "Mesmo assim, sempre fica um."
 

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