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06/10/2002
-
02h10
da Folha de S.Paulo
Foi um ano de reclamações de moradores e opiniões divididas, mas a réplica da escultura "Davi", de Michelangelo (1475-1564), deixará mesmo o bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo.
Após 27 anos nos quais enfeitou a frente do Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador (Ceret), a estátua retornará ao seu endereço original, no estádio do Pacaembu (zona oeste).
"Já deu para perceber que isso provocará uma reação traumática. A atitude reflete a visão da prefeitura, que enxerga na zona leste uma espécie de depósito", protesta a presidente de uma das associações de moradores do Tatuapé, Silvia Calçada. "Quando não tinham onde a colocar, aqui serviu. Agora que faz parte da paisagem e da nossa história, tchau."
Desde que saiu a notícia da mudança, não há outro comentário no bairro. O jornal "Gazeta do Tatuapé", distribuído gratuitamente há 20 anos, recebe cartas de protesto quase diariamente.
"Há um pouco de exagero. Acho que descobriram o "Davi" agora que ele está indo embora", considera a professora aposentada Suely da Costa, que mora perto do Ceret há 35 anos.
Estado x prefeitura
Na primeira tentativa de retirá-lo, há dois meses, houve confusão. Funcionários da prefeitura foram impedidos pelo diretor do Ceret, Antônio Raphael de Vita. A situação se complicou porque o centro recreativo é administrado pelo governo do Estado, e a estátua é um bem municipal.
Quem reclama os direitos pela escultura é o administrador do Pacaembu, Olívio Pires Pitta. "É um patrimônio do estádio. Nunca deveria ter saído daqui", afirma.
Segundo Pitta, o retorno de "Davi" faz parte de um projeto de resgate da memória do Pacaembu. Ele só não tentou retirar a estátua novamente porque quer evitar o trauma. "Procuro outra escultura para colocar na frente do Ceret. Sei que há outras réplicas de "Davi", mas aquela é nossa."
Segundo a socióloga Fátima Antunes, do Departamento do Patrimônio Histórico da prefeitura, a reação popular deve ser observada. "É difícil verificar esse apego", afirma. Apesar de ser o órgão competente, o DPH não foi consultado antes da decisão. O departamento é contra a transferência de esculturas. "Pelo simples fato de que uma estátua não deve andar pela cidade", explica.
A réplica do "Davi" de Michelangelo não tem valor artístico, apenas sentimental. Com 5 m de altura, como a original, que fica em Florença (Itália), a escultura foi feita em argamassa pelo Liceu de Artes e Ofícios no anos 30.
Há outras cópias de obras de Michelangelo espalhadas pela cidade, como "Moisés", na Galeria Prestes Maia. A estátua que enfeita o Ceret foi colocada no Pacaembu antes da inauguração, em 1940, pelo então prefeito Prestes Maia (1939-1945).
Tanguinha
Na pesquisa feita pela socióloga, constatou-se que "Davi" -escultura de um homem nu- constrangia um pouco os frequentadores do estádio. A estátua ficava na frente da antiga concha acústica, e foi despejada durante a construção do tobogã, em 1969.
"Nos desfiles de 7 de Setembro, feitos no estádio, cobriam a escultura com uma tanguinha", conta Fátima. Na comparação entre o "Davi" de Florença e o do Tatuapé, é possível perceber que o segundo tem o pênis consideravelmente maior. "Talvez seja por isso", diz Fátima Antunes. A vantagem do "Davi" brasileiro, porém, foi prejudicada durante os anos em que ficou na zona leste: parte da genitália foi arrancada.
Mudança da réplica da estátua de "Davi" causa polêmica no Tatuapé
SÉRGIO DURANda Folha de S.Paulo
Foi um ano de reclamações de moradores e opiniões divididas, mas a réplica da escultura "Davi", de Michelangelo (1475-1564), deixará mesmo o bairro do Tatuapé, na zona leste de São Paulo.
Após 27 anos nos quais enfeitou a frente do Centro Educativo, Recreativo e Esportivo do Trabalhador (Ceret), a estátua retornará ao seu endereço original, no estádio do Pacaembu (zona oeste).
"Já deu para perceber que isso provocará uma reação traumática. A atitude reflete a visão da prefeitura, que enxerga na zona leste uma espécie de depósito", protesta a presidente de uma das associações de moradores do Tatuapé, Silvia Calçada. "Quando não tinham onde a colocar, aqui serviu. Agora que faz parte da paisagem e da nossa história, tchau."
Desde que saiu a notícia da mudança, não há outro comentário no bairro. O jornal "Gazeta do Tatuapé", distribuído gratuitamente há 20 anos, recebe cartas de protesto quase diariamente.
"Há um pouco de exagero. Acho que descobriram o "Davi" agora que ele está indo embora", considera a professora aposentada Suely da Costa, que mora perto do Ceret há 35 anos.
Estado x prefeitura
Na primeira tentativa de retirá-lo, há dois meses, houve confusão. Funcionários da prefeitura foram impedidos pelo diretor do Ceret, Antônio Raphael de Vita. A situação se complicou porque o centro recreativo é administrado pelo governo do Estado, e a estátua é um bem municipal.
Quem reclama os direitos pela escultura é o administrador do Pacaembu, Olívio Pires Pitta. "É um patrimônio do estádio. Nunca deveria ter saído daqui", afirma.
Segundo Pitta, o retorno de "Davi" faz parte de um projeto de resgate da memória do Pacaembu. Ele só não tentou retirar a estátua novamente porque quer evitar o trauma. "Procuro outra escultura para colocar na frente do Ceret. Sei que há outras réplicas de "Davi", mas aquela é nossa."
Segundo a socióloga Fátima Antunes, do Departamento do Patrimônio Histórico da prefeitura, a reação popular deve ser observada. "É difícil verificar esse apego", afirma. Apesar de ser o órgão competente, o DPH não foi consultado antes da decisão. O departamento é contra a transferência de esculturas. "Pelo simples fato de que uma estátua não deve andar pela cidade", explica.
A réplica do "Davi" de Michelangelo não tem valor artístico, apenas sentimental. Com 5 m de altura, como a original, que fica em Florença (Itália), a escultura foi feita em argamassa pelo Liceu de Artes e Ofícios no anos 30.
Há outras cópias de obras de Michelangelo espalhadas pela cidade, como "Moisés", na Galeria Prestes Maia. A estátua que enfeita o Ceret foi colocada no Pacaembu antes da inauguração, em 1940, pelo então prefeito Prestes Maia (1939-1945).
Tanguinha
Na pesquisa feita pela socióloga, constatou-se que "Davi" -escultura de um homem nu- constrangia um pouco os frequentadores do estádio. A estátua ficava na frente da antiga concha acústica, e foi despejada durante a construção do tobogã, em 1969.
"Nos desfiles de 7 de Setembro, feitos no estádio, cobriam a escultura com uma tanguinha", conta Fátima. Na comparação entre o "Davi" de Florença e o do Tatuapé, é possível perceber que o segundo tem o pênis consideravelmente maior. "Talvez seja por isso", diz Fátima Antunes. A vantagem do "Davi" brasileiro, porém, foi prejudicada durante os anos em que ficou na zona leste: parte da genitália foi arrancada.
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