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26/12/2002 - 03h44

Embarcações clandestinas ameaçam segurança em rios

MAURÍCIO SIMIONATO
da Agência Folha, em Belém
KÁTIA BRASIL
da Agência Folha, em Manaus

O naufrágio do barco Dom Luiz 15-1º, ocorrido no dia 17 e que resultou na morte de 44 pessoas no Pará, expôs um problema crônico da região amazônica: a falta de segurança das embarcações que circulam na região. Com o aumento de 20% no tráfego de passageiros nos rios do Pará e do Amazonas no fim do ano, por conta de visitas a parentes, o risco de maior fatalidade em acidentes aumenta.

Superlotação, falta de fiscalização, corrupção e descaso são lugares-comuns para descrever a situação. Segundo a Capitania dos Portos, cerca de 30 mil barcos clandestinos navegam diariamente na Amazônia, a maioria no Pará e no Amazonas _Estados que concentram 75% do tráfego fluvial da região.

Não há levantamento preciso do total de embarcações na região amazônica. Em 1998, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social) estimou em mais de 100 mil, transportando 320 mil passageiros/ano, o que colocaria em cerca de um terço o total de clandestinos.

Mas a realidade pode ser pior, e por isso o governo federal está fazendo um estudo detalhado sobre o transporte na Amazônia. Os primeiros resultados deverão ser conhecidos no primeiro semestre do ano que vem, segundo a Antaq (Agência Nacional de Transportes Aquaviários).

A Antaq é uma autarquia do Ministério dos Transportes, criada em fevereiro para regulamentar e fiscalizar a operação portuária, a navegação comercial e a de passageiros no país.

"Primeiro temos que conhecer a realidade para elaborar normas e modificações", diz o assessor Eurico Batista.

Só no Pará, Estado com o maior volume de tráfego fluvial, são 20 mil embarcações não-inscritas, segundo o comandante da Capitania dos Portos da Amazônia Oriental, capitão Jaerte Bazyl.

Outras 80 mil embarcações, aproximadamente, são licenciadas, de acordo com estimativa da capitania. O órgão possui, no Estado do Pará, 14 lanchas para o trabalho de fiscalização.

O Dom Luiz 15-1º tinha licença para navegar, mas a superlotação _principal causa do naufrágio_ não foi detectada pela fiscalização. O barco tinha capacidade para 140 passageiros, mas transportava mais do que o dobro permitido _cerca de 360 pessoas. Ele fazia a rota Manaus-Santarém-Belém, que leva cinco dias de viagem, e afundou em Barcarena (120 km de Belém).

A embarcação parou em pelo menos quatro portos que não estavam na rota
para apanhar passageiros. A Capitania afirma não ter como fiscalizar essas paradas não programadas _há 50 portos clandestinos no interior.
Acidentes como esse trazem de volta à lembrança o maior naufrágio da história amazônica, em 1981, quando 430 pessoas se afogaram após o barco Novo Amapá afundar por superlotação, na baía de Marajó (Pará).

Para a Marinha, responsável pela segurança e pela fiscalização fluvial, o problema maior do sistema é a falta de consciência dos comandantes, dos armadores e dos passageiros.

"Eles preferem a clandestinidade a enfrentar uma fiscalização da inspeção naval no meio do rio", afirma o capitão-de-corveta Paulo Brito, chefe do Departamento de Segurança do Tráfego Aquaviário da Capitania dos Portos da Amazônia Ocidental, sediada em Manaus.

"O problema não é só na saída da embarcação [no porto oficial], é no trajeto. Na primeira curva do rio vai encher de gente. Todo mundo quer viajar, quer ver parentes, principalmente na época das festas de final de ano", disse.

Responsabilidades

Segundo a Marinha, a responsabilidade pela contagem dos passageiros no embarque é da empresa proprietária do barco e do comandante da embarcação.

A Capitania dos Portos, apesar de se queixar, não diz qual o total de homens disponíveis para a fiscalização. Não informa também quantas autuações foram efetuadas por causa de excesso de peso nos últimos anos.

Segundo a Antaq, assim que o estudo sobre os transportes na Amazônia estiver concluído, todas as empresas que operam no sistema atual deverão ter registro federal. "Somos um órgão muito novo, que está se estruturando para fiscalizar e para regular", disse Eurico Batista.
A Antaq também é responsável pela fiscalização das concessões públicas na área fluvial.

No caso do Dom Luiz 15-1º, o barco havia saído do porto da empresa Manaus Moderna, na capital amazonense, uma área sob concessão.

Passageiros passam em meio ao lixo e urubus para chegar às embarcações atracadas a uma grande balsa. Nenhum proprietário foi localizado para falar sobre a situação.

Cerca de 8.000 pessoas usam o serviço _o dobro dos usuários da Estação Hidroviária do Amazonas, também em Manaus, que tem guichês informatizados e praça de alimentação climatizada.

"Não embarco de lá [da estação] porque a passagem é mais cara. E o meu barco só atraca aqui [no porto da Manaus Moderna]", disse Mercedes da Silva Sampaio, 44, que pagou R$ 25 para voltar a sua cidade, Codajás (AM), no barco Monte Sinai. Na estação, Mercedes pagaria de R$ 5 a R$ 15 a mais pela passagem.

No porto da Manaus Moderna, dono de barco paga mais do que na estação, R$ 30, para atracar e receber mercadorias fora das vistas de fiscais. Nos barcos entram televisões, geladeiras, cargas de bebidas, farinha e tudo o que possa abastecer as cidades ribeirinhas _e dar combustível a um novo naufrágio em potencial.
 

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