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24/01/2004 - 04h36

As restrições ao uso do automóvel em SP vão aumentar?

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ALENCAR IZIDORO
da Folha de S.Paulo

Hoje os paulistanos se irritam ao ficar parados em congestionamentos. Daqui a 20 anos, a reclamação será outra: a obrigatoriedade de deixar seus automóveis parados nas garagens, num fenômeno que já tem até apelido.

"Serão os carros-samambaia", prevê Laurindo Junqueira, ex-secretário dos Transportes de Santos e de Campinas, referindo-se à planta tóxica difundida popularmente como adorno de quintais.

É praticamente unânime entre especialistas a avaliação de que uma restrição veicular mais drástica que o atual rodízio será inevitável no futuro de São Paulo.

A utilização indiscriminada do automóvel será "proibitiva" não só por causa de medidas governamentais --como fim de vagas públicas de estacionamento, taxação de combustíveis e pedágios urbanos--, mas em razão do custo.

Quem quiser usar o transporte individual pagará caro porque a demanda por petróleo tende a subir, por conta da evolução drástica da motorização em países populosos como a China.

E mesmo energias alternativas, como hidrogênio, terão limitações devido ao aumento da frota --500 carros por dia são incorporados às ruas de São Paulo, que terá quase 10 milhões de carros em 2024, se o ritmo for mantido.

Não se trata de um declínio da função, da importância ou da propriedade do automóvel, explica Jurandir Fernandes, atual secretário estadual dos Transportes Metropolitanos, mas de uma mudança de hábitos.

A participação das viagens de automóvel na totalidade de deslocamentos deve até crescer --hoje, na região metropolitana de São Paulo, já representam 53%.

Mas quem costuma usar o carro para ir até mesmo à padaria da esquina vai pensar duas vezes se não é melhor ir a pé, evitando as dificuldades e os custos para estacionar. E quem nunca usar um modo coletivo para ir ao trabalho (nem que seja numa integração carro-metrô ou carro-ônibus) correrá sério risco de gastar muito mais e de perder mais tempo.

"O carro obrigatoriamente terá um uso mais racional. Todos poderão ter um. A questão é saber quando poderão usar", afirma Cláudio de Senna Frederico, engenheiro que integra um grupo de especialistas convidados pela UITP (principal associação internacional de transportes públicos) para elaborar as diretrizes do setor no mundo para 2020.

O ritmo dessas mudanças vai depender do crescimento econômico do Brasil, da renda da população e das resistências políticas. Mas nada que demore mais de 20 anos, afirmam os especialistas.

Francisco Macena, que presidiu a Companhia de Engenharia de Tráfego nos três primeiros anos da gestão Marta Suplicy, aposta que São Paulo terá pedágio urbano em até dez anos --com a cobrança de uma taxa diária pelo uso do carro em determinadas regiões, como acontece hoje em Londres, ou em determinadas vias, idéia que já chegou a ser planejada na gestão Celso Pitta (1997-00) para as marginais.

Motocicletas, tipo de transporte individual em expansão, também devem ser alvo de restrições, pois concentram os principais problemas de poluição e mortes no trânsito. Entre especialistas, cresce a pressão para que elas sejam obrigadas a circular nas mesmas faixas dos carros, e não entre eles.

Metrô

Está enganado quem acredita que, com a pressão para que os carros sejam menos utilizados, todo mundo terá uma linha de metrô disponível na porta de casa --nem em 2024 nem nunca.

Os projetos de melhoria do transporte público e de ampliação da malha sobre trilhos até que são ambiciosos. Mas os metrôs, um transporte caro, destinado a atender um volume grande de passageiros, têm sua expansão limitada, não sendo viável (nem racional) levá-los a todos os lugares da cidade, diz Laurindo Junqueira.

Exceto para os principais corredores de deslocamento, os ônibus, cujos trajetos são mais flexíveis, devem continuar prevalecendo como a principal opção de transporte público de São Paulo.

Um movimento crescente é a valorização dos trens (que, se modernizados, têm potencial para triplicar sua atual demanda) e de modos de transporte intermediários entre ônibus e metrô.

O antigo Fura-Fila, atual Paulistão, chegou a ser uma idéia dessas, mas fracassou por ser construído num percurso com demanda restrita, sem apresentar um custo/benefício adequado.

No Pitu 2020 (projeto liderado pelo Estado em 1997 para definir diretrizes do transporte), especialistas traçaram como meta a construção de 300 km de tecnologia moderna sobre trilhos (metrô normal, de superfície, trem especial) na região metropolitana em 20 anos --hoje existem 58 km.

De concreto, com financiamentos acertados ou em estágio avançado, segundo Jurandir Fernandes, há somente a previsão de mais 30 km de metrô até 2010 --a construção da linha 4 (Luz-Vila Sônia) e a extensão das linhas 2 (Ana Rosa-Vila Prudente) e 5 (Largo Treze-Vila Mariana).

A meta de construir 300 km até 2020 já é vista como inalcançável, mesmo com a taxação de usuários de automóvel e o uso da verba arrecadada para fazer as obras, idéia defendida nos últimos anos pelo urbanista Cândido Malta.

A dificuldade para atingir esse "sonho" não está apenas no custo para fazer essas novas linhas metroviárias --que poderiam demandar perto de US$ 30 bilhões.

Custeio

O dilema do setor é saber como manter no futuro, com tarifas acessíveis, a operação desses sistemas --preocupação que já virou motivo de pressão para reduzir as gratuidades existentes hoje nas integrações entre trem e metrô.

"O transporte do mundo inteiro é deficitário. Não há como repassar seus custos aos usuários", diz Adhemar Gianini, que foi secretário municipal dos Transportes na gestão Luiza Erundina (1989-92).

"A tarifa terá de ser subsidiada, sob risco de aumentar ainda mais a exclusão", reforça Senna Frederico, citando uma prática habitual da população de baixa renda de andar longas distâncias a pé e até de dormir na rua por não ter dinheiro para voltar para casa.

"Os novos investimentos e a modernização [inclusive para aumentar a acessibilidade de idosos, já que a população está envelhecendo] deixarão os sistemas mais caros no futuro. Esse custo não poderá ser repassado aos mais pobres, que mais precisam dos coletivos", diz Reginaldo de Paiva, do Instituto de Engenharia.

Para ter uma idéia da dimensão do problema, basta saber que, de 1995 a 2002, a Companhia do Metropolitano acumulou um prejuízo contábil (sem incluir os novos investimentos) de R$ 3,31 bilhões.

E não há muita margem para modificar essa situação, até porque os problemas não estão na ociosidade. Ao contrário: as duas principais linhas de metrô já estão no limite --e, nas obras futuras, a equação econômica tende a ser mais complicada, já que, com a expansão da oferta, não deverá existir a atual superlotação.

Não-transporte

Com mais restrições aos carros e expansão limitada do transporte coletivo, uma das tendências é a redução dos deslocamentos na cidade, num movimento chamado de não-transporte. A idéia consiste na descentralização dos serviços e no fortalecimentos de pólos regionais. "O ideal é que todos morem e trabalhem se deslocando menos", diz Paiva.

Esse objetivo ressalta a necessidade de uma parceria metropolitana, até porque muitos dos que trabalham na capital paulista moram em outros municípios da Grande São Paulo.

"Prefeituras e Estado precisam pensar juntos. Sem isso, será só paliativo", afirma Senna Frederico, destacando, por exemplo, os problemas existentes atualmente para fazer um sistema integrado.

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