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24/01/2004 - 04h44

Congresso discute a concessão de poder de polícia às guardas civis

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GILMAR PENTEADO
ALESSANDRO SILVA

da Folha de S.Paulo

O combate direto à violência no país pode ganhar novos aliados: os prefeitos e suas guardas. A municipalização da segurança, que hoje é um dever constitucional do Estado, será uma das principais discussões na área nos próximos anos, segundo especialistas. A experiência paulistana, com a maior guarda do país, deve estar no centro do debate nacional.

Pesquisa Datafolha realizada em dezembro, em 396 municípios, dá uma prévia do que será a discussão. De 12.180 entrevistados, 22% disseram que o prefeito deveria ser o principal responsável pela segurança pública --38% responderam o presidente da República e 31%, o governador. A preferência pelos prefeitos era de 17% em setembro de 2002 e de 20% em março de 2003.

A experiência paulistana de guarda civil começou em 1986, com 885 homens, todos armados. Hoje, a capital tem a maior guarda do país, com 5.866 homens e mulheres, um crescimento de 563% em 17 anos. Em todo o Brasil, há 410 cidades com guardas municipais --um exército que, somado, chega a 50 mil homens.

Em São Paulo, a Guarda Civil Metropolitana foi reestruturada na gestão petista e virou experiência piloto para o que pode ser uma nova fase das guardas, criadas para "proteção de bens, serviços e instalações" dos municípios, segundo a Constituição de 1988. Só atuam no combate direto aos crimes em situações de flagrante.

Em 2002, a guarda paulistana ganhou uma corregedoria autônoma em relação ao comando --o que não existe nas polícias estaduais e federais--, plano de carreira e regulamento disciplinar. Também perdeu alguns "resquícios" trazidos por oficiais da reserva da Polícia Militar, os primeiros comandantes, que "transformaram as guardas em mini-PMs", segundo o presidente do Conselho Nacional das Guardas Civis e secretário municipal de Segurança Urbana de São Paulo, Benedito Domingos Mariano.

Na limpeza desses "resquícios" trazidos pelos oficiais, a Prefeitura de São Paulo extinguiu unidades que eram verdadeiras cópias da estrutura da PM --Romu (Rondas Municipais), uma espécie de Rota, e Gepam (Grupo Especial de Proteção Ambiental), que pretendia usar fardas camufladas, como o COE, unidade da PM que realiza ações na mata.

As antigas camionetes Veraneio, semelhantes às usadas pela PM, foram substituídas por automóveis Corsa e Fiesta, e o canil deve deixar de ser uma inspetoria da guarda. "Para que tantos cães, se a guarda não foi feita para reprimir conflitos de rua?", questiona Mariano.

Projeto piloto

O Conselho Nacional das Guardas Civis vai usar a experiência paulistana como base para tentar regulamentar as milícias municipais. Um projeto de emenda constitucional que tramita no Congresso, do senador Romeu Tuma (PFL), confere poder de polícia às guardas e estabelece que as regras de funcionamento serão fixadas em uma lei federal.

Uma minuta de projeto de lei com as regras de regulamentação foi apresentada pela Prefeitura de São Paulo ao Ministério da Justiça em 2003. Com algumas emendas, a mesma proposta foi aprovada por um grupo de trabalho formado por Ministério da Justiça, Casa Civil, conselho das guardas e entidades de municípios.

Em uma estratégia que visa evitar confronto com o papel das polícias estaduais, as guardas municipais ganharam uma nova função: polícia preventiva e comunitária. "O objetivo não é ir atrás das ocorrências. É estar presente para inibi-las", diz Mariano.

A atuação das guardas, pelo projeto, seria mais intensa na segurança escolar e de trânsito, na proteção ao ambiente e na mediação de conflitos urbanos.

A expectativa é que as discussões disseminem ainda mais as guardas civis, que viveram seu boom a partir de 1988. Segundo Mariano, a expectativa de receber verba federal seduziu prefeitos.

"O prefeito tem de entender que essa polícia custa caro. É preciso investir em treinamento, controle e fiscalização. Dos custos, 95% saem do orçamento próprio do município", afirma.

Para Silvio Peccioli (PFL), coordenador do Fórum Metropolitano de Segurança Pública da Grande São Paulo e prefeito de Santana de Parnaíba, o fortalecimento das guardas é uma resposta de "cunho imediatista", daí a necessidade de discutir a função delas no Sistema Único de Segurança Pública --que reunirá Estados, suas polícias e o governo federal.

"Nenhum prefeito é doido de colocar um homem despreparado nas ruas, porque, se der algum problema, ele está acabado. Veja o tamanho do risco que se assume com isso", afirma Peccioli. Segundo ele, principalmente nas cidades menores, em razão da proximidade, a população cobra dos políticos locais melhorias na segurança. "O dirigente que se limita a dizer que não é problema seu toma o troco na próxima eleição."

Essa avaliação é confirmada pelo Datafolha. Dos entrevistados em municípios do interior, 25% apontaram o prefeito como o principal responsável pela segurança. Nas regiões metropolitanas, esse índice caiu para 17%.

Riscos

O sociólogo Fernando Salla, pesquisador do Núcleo de Estudos da Violência da USP (Universidade de São Paulo), também cita a municipalização da segurança como uma das discussões mais importantes, mas não tem o mesmo otimismo de Mariano. "O problema é saber até onde vai esse poder de polícia das guardas. Sou descrente em relação aos mecanismos tradicionais de controle."

Para ele, se essas estruturas forem as mesmas adotadas pelas polícias estaduais e federais, os casos de corrupção e abuso de poder vão se repetir.

Salla afirma que, mais do que a formação de corpos policiais, é importante discutir a eficiência do trabalho policial. "A taxa de esclarecimento de crimes é muito baixa. Em vez de aumentar a estrutura, é preciso saber se o trabalho é bem feito ou não."

Para o sociólogo Túlio Kahn, ex-diretor do Departamento de Cooperação e Articulação das Ações de Segurança Pública da Senasp (Secretaria Nacional de Segurança Pública), a tendência é de envolvimento cada vez maior do governo federal e das prefeituras na questão da segurança, o que não requer obrigatoriamente a concessão de poder de polícia às guardas municipais.

Segundo ele, as guardas podem se tornar "Rotinhas". "Vão fazer mais do mesmo", afirma. Para Kahn, as guardas precisariam encontrar um segmento de ação. "As prefeituras deveriam se preocupar mais com políticas públicas do que com o lado repressivo."

Repressão

O secretário estadual da Segurança Pública de São Paulo, Saulo de Castro Abreu Filho, critica a possibilidade de as guardas terem poder de polícia e chama de "eufemismo" a expressão "policiamento preventivo". "Isso é jogo de palavras. A polícia é sempre repressiva", diz.

Para ele, as guardas podem se tornar uma "armadilha" para os prefeitos. "Ter polícia custa caro. E pode haver conseqüências graves se ela não for bem treinada."

Abreu Filho afirma que as polícias locais podem se tornar "guardas pretorianas". "O prefeito pode querer dar à guarda o perfil dele. Fica a cara do freguês." Para ele, a principal contribuição da prefeitura está na melhoria da infra-estrutura urbana. "Em vez de ficar remendando, é preciso enfrentar a questão."

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