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27/01/2004
-
03h22
THIAGO GUIMARÃES
da Agência Folha, em Belo Horizonte
O dispositivo que transfere à Justiça Federal competência para julgar crimes contra os direitos humanos tem apoio do governo Luiz Inácio Lula da Silva, mas não é consenso no meio jurídico.
A proposta, que já passou pela Câmara e atualmente tramita no Senado durante a convocação extraordinária do Congresso, prevê que, nas hipóteses de "grave violação" de direitos humanos, o procurador-geral da República poderá, em qualquer fase do inquérito ou processo, pedir ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o crime seja julgado pela Justiça Federal. Se aprovada, caberá ao STJ determinar ou não o deslocamento da competência.
O objetivo, expresso na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) conhecida como reforma do Judiciário, é "assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte".
A medida enfrenta resistências, principalmente no Judiciário e no Ministério Público dos Estados. Opositores alegam que a federalização seria uma espécie de "atestado prévio de incompetência" dos Judiciários estaduais nas causas de direitos humanos.
"Não há dados científicos ou estatísticos que comprovem que a Justiça Federal é mais eficaz nas punições", diz o presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Grijalbo Coutinho.
Para o juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo Ivan Sartori, trata-se de proposta "absurda", que fere a autonomia dos Estados e o direito das pessoas de saber onde serão julgadas.
Há ainda quem ache que a Justiça estadual está mais disseminada, o que facilita as denúncias. "A federalização acarretará forte abalo no acesso à Justiça", diz o diretor de Cidadania e Direitos Humanos da Ajuris (associação de juízes do Rio Grande no Sul), João Ricardo Costa.
Na mesma linha, o coordenador da Promotoria de Direitos Humanos e Conflitos Agrários do Ministério Público de Minas Gerais, Afonso Teixeira, repudia a federalização. "Parece prestação de contas a organismos internacionais."
"Risco zero"
O ministro Nilmário Miranda (Secretaria Especial dos Direitos Humanos) rebate as críticas e afirma que a proposta traz "risco zero" para a autonomia dos Estados, pois apenas casos "bem debatidos e acompanhados pela opinião pública" deverão ser submetidos à apreciação do STJ.
"O que coloca em xeque a autonomia dos Estados é o acobertamento de crimes graves praticados por agentes públicos", disse.
O advogado e vice-prefeito de São Paulo, Hélio Bicudo (PT), militante na área de direitos humanos, também defende a proposta, encampada por entidades como as ONGs Human Rights Watch e Justiça Global e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). "As Justiças estaduais são absolutamente corporativas."
Contudo, a proposta atual é mais tímida do que a PEC sobre o assunto de 1996, que foi modificada no Congresso. No texto original, o deslocamento de competência poderia ser suscitado ainda por "órgão federal de defesa dos direitos humanos", e não só pelo procurador-geral da República.
"A legislação deveria ser ampliada para que outros órgãos também pudessem suscitar a federalização", diz a professora de Direitos Humanos da PUC-SP Flávia Piovesan.
Estados criticam federalização de crimes contra direitos humanos
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da Agência Folha, em Belo Horizonte
O dispositivo que transfere à Justiça Federal competência para julgar crimes contra os direitos humanos tem apoio do governo Luiz Inácio Lula da Silva, mas não é consenso no meio jurídico.
A proposta, que já passou pela Câmara e atualmente tramita no Senado durante a convocação extraordinária do Congresso, prevê que, nas hipóteses de "grave violação" de direitos humanos, o procurador-geral da República poderá, em qualquer fase do inquérito ou processo, pedir ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) que o crime seja julgado pela Justiça Federal. Se aprovada, caberá ao STJ determinar ou não o deslocamento da competência.
O objetivo, expresso na PEC (Proposta de Emenda à Constituição) conhecida como reforma do Judiciário, é "assegurar o cumprimento de obrigações decorrentes de tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil seja parte".
A medida enfrenta resistências, principalmente no Judiciário e no Ministério Público dos Estados. Opositores alegam que a federalização seria uma espécie de "atestado prévio de incompetência" dos Judiciários estaduais nas causas de direitos humanos.
"Não há dados científicos ou estatísticos que comprovem que a Justiça Federal é mais eficaz nas punições", diz o presidente da Anamatra (Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho), Grijalbo Coutinho.
Para o juiz do Tribunal de Alçada Criminal de São Paulo Ivan Sartori, trata-se de proposta "absurda", que fere a autonomia dos Estados e o direito das pessoas de saber onde serão julgadas.
Há ainda quem ache que a Justiça estadual está mais disseminada, o que facilita as denúncias. "A federalização acarretará forte abalo no acesso à Justiça", diz o diretor de Cidadania e Direitos Humanos da Ajuris (associação de juízes do Rio Grande no Sul), João Ricardo Costa.
Na mesma linha, o coordenador da Promotoria de Direitos Humanos e Conflitos Agrários do Ministério Público de Minas Gerais, Afonso Teixeira, repudia a federalização. "Parece prestação de contas a organismos internacionais."
"Risco zero"
O ministro Nilmário Miranda (Secretaria Especial dos Direitos Humanos) rebate as críticas e afirma que a proposta traz "risco zero" para a autonomia dos Estados, pois apenas casos "bem debatidos e acompanhados pela opinião pública" deverão ser submetidos à apreciação do STJ.
"O que coloca em xeque a autonomia dos Estados é o acobertamento de crimes graves praticados por agentes públicos", disse.
O advogado e vice-prefeito de São Paulo, Hélio Bicudo (PT), militante na área de direitos humanos, também defende a proposta, encampada por entidades como as ONGs Human Rights Watch e Justiça Global e o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra). "As Justiças estaduais são absolutamente corporativas."
Contudo, a proposta atual é mais tímida do que a PEC sobre o assunto de 1996, que foi modificada no Congresso. No texto original, o deslocamento de competência poderia ser suscitado ainda por "órgão federal de defesa dos direitos humanos", e não só pelo procurador-geral da República.
"A legislação deveria ser ampliada para que outros órgãos também pudessem suscitar a federalização", diz a professora de Direitos Humanos da PUC-SP Flávia Piovesan.
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