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13/06/2004 - 06h54

Gays sonham com casamento tradicional

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AURELIANO BIANCARELLI
da Folha de S.Paulo

Casais heterossexuais estão se separando, o casamento ortodoxo está em crise, a família está dispensando as bênçãos da igreja. Na contracorrente, pares homossexuais estão buscando tudo isso. Querem viver juntos, formar famílias, adotar filhos e casar de papel passado. Se possível, querem subir ao altar.

Alguns se sentem bem quando saem pela noite à procura de parceiros. Pode-se lembrar que existem "dark rooms", onde homossexuais fazem sexo no escuro sem saber com quem. Mas um universo cada vez maior da população homossexual está buscando um parceiro para dividir projetos e cuidar um do outro quando ficarem velhinhos --o mesmo que desejam os casais heterossexuais.

O tema da parada gay de hoje em São Paulo é justamente "Temos família e orgulho". O evento pretende reunir 1,5 milhão de pessoas e se tornar a maior parada do gênero já realizada no mundo.

"Gays e famílias não são opostos", diz Reinaldo Pereira Damião, presidente da associação da parada. A palavra família aponta para direitos de cidadania, como parceria civil, pensão, divisão de bens, diz o texto da parada. A aceitação e o respeito à homossexualidade começam na família. Ainda há registros de filhos expulsos de casa ou humilhados na escola ou no trabalho quando revelam sua orientação sexual.

Buquê de flores

Alguns vão além da luta pela união estável, até agora só conseguida na Justiça. Sonham em cuidar um do outro, em ouvir a frase "até que a morte os separe".

O bispo Isaias Rodrigues dos Santos, 35, da Igreja Católica Ortodoxa, já celebrou quatro casamentos de parceiras lésbicas. Na fila, segundo ele, estão vários outros casais. Seu projeto --que ele diz já estar em andamento-- prevê uma chácara em Atibaia, próxima a São Paulo, com toda a infra-estrutura para um casamento.

"Os casais homossexuais serão abençoados por um rito de consagração. A festa terá bufê, lembrancinhas e mesmo o buquê de flores, que será jogado para os participantes."

O designer Kleber, 23, e o DJ César, 26, já se inscreveram na fila para se casar. "Deus é um só para todos. A fé está acima de tudo", diz Kleber. "Não é porque alguns não concordam com minha orientação sexual que perderei meus direitos", diz.

Segundo d. Rodrigues dos Santos, a chácara-capela será utilizada para batizar filhos de homossexuais e até ordenar padres de sua igreja. "Entre os católicos, gays são excluídos da eucaristia."

Para a maioria dos gays e lésbicas, o casamento tem um significado político, de cidadania. "O importante é ter o direito de ter essa opção, pois defendemos leis iguais para todos", diz Miriam Martins, coordenadora-geral da ONG Um Outro Olhar, voltada para a saúde e os direitos das lésbicas. Enquanto essa igualdade não chega, gays e lésbicas procuram atalhos, como o reconhecimento da união estável.

"Igrejas não nos abraçam"

Pedro Almeida, da Associação GLBT (gays, lésbicas, bissexuais e transgêneros), observa que o grupo "abraça todas as religiões". "Elas é que não nos abraçam." Ele considera que adaptar textos bíblicos para que enquadrem casamentos homossexuais pode soar como algo falso ou forçado.

O antropólogo Luiz Mott, 58, professor da Universidade Federal da Bahia, diz que pesquisas sobre o ritual do matrimônio revelam que as liturgias entre casais do mesmo sexo antecederam casamentos heterossexuais. "A descoberta foi feita por John Boswell, da Universidade da Califórnia", diz Mott, que é fundador do Grupo Gay da Bahia (GGB).

Ele próprio é casado com Marcelo Cerqueira, 36, em cerimônia realizada por um pastor da Igreja Pacifista Cristã, "numa liturgia cristã ainda em 1985". Mas Mott rejeita qualquer idéia de cópia do modelo nuclear de família. "Viver com alguém e desejar se casar com ele, como igrejas de várias religiões já fazem, não significa macaquear o modelo heterossexual."

A psicóloga lésbica Danielle Leite Costa Cunha Melo, 27, do Rio de Janeiro, está se especializando em atender famílias heterossexuais que têm filhos homossexuais. "Há um preconceito grande mesmo entre os especialistas", diz. "Entre as famílias, o assunto é tratado com muito sofrimento e, às vezes, até violência."

À procura do parceiro

Danielle Melo aparece no cartaz da campanha pela diversidade que a Associação da Parada e a prefeitura estão lançando, especialmente para professores. "Quando a família não lida bem com o tema, ele vai aparecer na escola. E muitos professores não sabem como tratá-lo." Segundo ela, os alunos precisam conhecer a vida como ela é, e as mulheres lésbicas precisam ter a coragem de mostrar seus rostos.

Nem todos os homossexuais e lésbicas estão procurando formar famílias. Muitos dizem que, quando chega a noite da sexta, não resistem em "sair à caça". Mas há quem queira e não está conseguindo. O designer Gustavo Schoner, 29, diz que todo mundo está à procura de um parceiro, mas nem sempre o encontra. "Quando encontrá-lo, vou respeitá-lo muito e tratá-lo bem", diz.

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