REFLEXÃO


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urbanidade
03/06/2009

O sonho de pichar em Paris

A Fundação Cartier, em Paris, está exibindo uma exposição de Beatriz Milhazes, uma das artistas plásticas brasileiras mais badaladas no mundo. E mais um brasileiro, dessa vez um anônimo, foi convidado a se apresentar, no próximo mês, naquele espaço: o ex-pichador Djan Ivson. Só vai viajar, porém, se acertar suas contas com a Justiça -o que parece difícil.

A forma de expressão que condenou Djan é justamente o que atraiu os curadores da Fundação Cartier, que programa uma exposição sobre o grafite no mundo. Ocorre que ele, enquanto não se acertar com a Justiça, não terá autorização para deixar o país. “Estou correndo contra o tempo.”

Pichador desde os 12 anos, Djan se envolveu em uma série de problemas com a Justiça, condenado a serviços comunitários. Era considerado ousado por suas escaladas pelo lado externo dos prédios.

Afirma que, desde a condenação, pressionado pela família e amigos, estaria respeitando a lei e dedicando-se ao grafite

Mas manteve o interesse por essa forma de expressão transgressora. Produziu vídeos sobre a ação dos pichadores em São Paulo e vendia o material em lojas do centro. Estava gravando no dia em que resolveram pichar os espaços brancos na Bienal, quando ocorreram prisões.

Ninguém documentou, como ele, com tantos detalhes, os bastidores dessa tribo urbana, visível apenas nos muros -além dos vídeos, ele coleciona papéis com as letras realizadas pelos pichadores, alguns deles mortos. “A pichação é um grito existencial.” Todo esse registro chamou a atenção dos irmãos Roberto T. Oliveira e João Wainer (fotógrafo da Folha), interessados em fazer um documentário sobre a pichação. Djan se tornou o fio que conduz o documentário.

Ao fazer o levantamento para a exposição, os curadores da Fundação Cartier viram o documentário e se interessaram pelo estilo das letras que povoam uma metrópole como São Paulo.
Daí veio o convite para Djan reproduzir ali sua grafia. “Descobri que não podia ir quando fui tentar tirar o passaporte.”

Já tinha cumprido pena de 72 horas de serviços comunitários -mas alega que não sabia que faltavam mais 90 horas. “Não vejo problemas em cumprir a pena.” Não quiseram converter essas horas em pagamento de cestas básicas.

Se ele não conseguir embarcar, não ficará inteiramente invisível. O documentário será mostrado pela primeira vez em Paris -a Fundação Cartier ajudou a pagar a finalização-, e as assinaturas dos pichadores colecionadas por Djan serão expostas num painel.

Veja as fotos


Coluna originalmente publicada na Folha de S. Paulo, editoria Cotidiano.

   
   
 
 

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