REFLEXÃO


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urbanidade
12/03/2008

Guerreando na sombra

Sob um jequitibá-rosa, velhinhos vão ver se a invenção para proteger a árvore em uma obra do metrô funciona


IMAGENS DE UMA SÃO PAULO ANTIGA , com meninos brincando, velhos jogando dominó e casais namorando na praça, vêm sobrevivendo ao caos urbano sob a sombra de um jequitibá-rosa, de 15 metros de altura, do tamanho de um prédio de cinco andares. Essas imagens estavam ameaçadas no final do mês passado, prestes a ceder espaço à modernidade do metrô. "Dificilmente a árvore iria sobreviver", conta o arquiteto Eduardo Maggi, que, em parceria com engenheiros e botânicos, está desenvolvendo uma invenção para tentar preservar o jequitibá-rosa.
Formado em arquitetura no Mackenzie, Eduardo Maggi, 53, trabalha há 30 anos no setor de obras do metrô. "Já enfrentei todo tipo de obstáculo" - mas nunca o de ter de salvar apenas uma árvore em uma operação que, à primeira vista, parecia impossível. "A avaliação inicial era que não havia alternativa: era a árvore ou o metrô."

O traçado da linha 2-verde do metrô passava, na Vila Prudente, ao lado da praça Padre Lourenço Barendse, de 550 metros quadrados, na zona leste. Os engenheiros fizeram todos os cálculos e decretaram: a árvore tinha de sair. Temeu-se, porém, uma revolta da comunidade, acostumada há tantas décadas com aquela paisagem bucólica.

Com longo aprendizado de revoltas comunitárias por causa dos transtornos das obras do metrô, Eduardo Maggi soube pelos botânicos que seria muito arriscado transplantar o jequitibá-rosa, a maior árvore nativa brasileira, símbolo do Estado de São Paulo. Especialistas dizem que aquela espécie corre risco de extinção. Em suma, o metrô teria de conviver, na marra, com o jequitibá-rosa o que, para muitos engenheiros, soaria como uma bobagem ecológica diante dos benefícios que o metrô traz ao transporte público.

Das pranchetas dos arquitetos, dos engenheiros e dos botânicos, saiu um projeto, nunca antes imaginado, que deve ser realizado pelo metrô: uma jardineira será suspensa numa vala, enquanto as escavações estiverem sendo realizadas para a passagem do trem. Terminada a obra, será jogada terra, e tudo, pelo menos na superfície, poderá voltar ao normal.

Faltava resolver um problema: o imenso tamanho das raízes. Foi quando se decidiu que, naquele ponto, a passagem seria dez metros mais profunda para que o trem não abatesse, com o tempo, a árvore.

Uma platéia atenta saberá se a invenção funciona ou não. Os velhinhos, sentados no banco da praça, estarão observando. E o farão debaixo da sombra da possível vítima.

Veja as fotos do jequitibá-rosa:
Foto 1
Foto 2
Foto 3



Coluna originalmente publicada na Folha de S.Paulo, editoria Cotidiano.

   
   
 
 

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