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O governo deveria dar droga aos viciados?

A questão essencial do tráfico de drogas é uma lei da economia: a lei da oferta e da procura. Enquanto houver quem compre um produto, haverá quem o venda. Podem perseguir e prender quantos traficantes quiserem, mas, se existir alguém disposto a comprar uma mercadoria, sempre existirá mercado para um vendedor.

É mais fácil um jornalista perceber um problema nacional quando um dos colegas -no caso, Tim Lopes, da TV Globo- morre na favela, nas mãos dos traficantes, do que quando toma conhecimento da cocaína que rola livremente, comprada, é claro, de traficantes. O preço da droga é um dos ingredientes de uma das piores modalidades de risco-país, o crime organizado.

Essa obviedade estava fora do discurso do presidente Fernando Henrique Cardoso, que, na quinta-feira passada, em cerimônia no Palácio do Planalto, apontou o crime organizado como principal inimigo do pais. Guindou a violência, síntese perversa de todas as fragilidades sociais, ao topo da agenda nacional; enfrentá-la, acrescentou, será a mais importante tarefa de seu sucessor. Naquele mesmo dia, uma macabra coincidência: o caseiro do seu sítio, em Ibiúna, fora assassinado.

Os convidados que ouviam o discurso estavam particularmente impressionados com a divulgação de uma fita que revelou o traficante Luiz Fernando da Costa, o Fernandinho Beira-Mar, articulando da cadeia a compra de um míssil, eloquente sinal de fragilidade do poder público.

Durante a cerimônia presidencial, foi divulgada pesquisa realizada pelo Cebrid (Centro Brasileiro de Informações sobre Drogas Psicotrópicas), da Universidade Federal de São Paulo, que informava que 9,1 milhões de brasileiros já usaram algum tipo de droga ilícita. Esse número é bem menor, proporcionalmente, aqui do que nos Estados Unidos ou no Chile. Daí se vê o risco de aumento de consumo -e, junto, o aumento da criminalidade. Vendem-se para jovens mais drogas do que livros.

Para aplacar o moralismo da sociedade, movido a desinformação e preconceito, é mais fácil acenar com a repressão do que com a prevenção. Difícil dizer claramente que, nesse campo, o melhor é o menos ruim, ou seja, a redução de danos.

O viciado é uma dupla vítima. Além dos estragos da dependência química, vê-se jogado na delinquência, obrigado a negociar com os traficantes e, muitas vezes, é refém deles. Por causa desse acúmulo de dramas, duas das maiores autoridades nesse tema no Brasil defendem que postos de saúde deveriam distribuir drogas mais pesadas aos viciados.

"É uma forma de tirá-los da convivência com a criminalidade, que só aumenta o problema, e transformá-los num problema de saúde pública", sustenta Elisaldo Carlini, diretor do Cebrid e membro do Conselho Internacional de Controle de Narcóticos, da ONU. "Ao ir ao centro de saúde retirar a droga, o viciado entraria num ambiente em que poderia ser tratado", afirma Dartiu Xavier, diretor do programa de cuidados aos dependentes de drogas da Universidade Federal de São Paulo.

Ambos conhecem a experiência realizada em Liverpool, na Inglaterra, onde se distribuiu heroína aos viciados. "Caiu a violência associada às drogas e diminuiu a contaminação pelo vírus HIV", diz Dartiu.

Carlini conta que, devido ao insucesso de políticas repressivas, países desenvolvidos se mostram dispostos a participar da produção e da distribuição de drogas. É uma tendência que se nota especialmente na Inglaterra, na França, na Alemanha e na Holanda. "Na Holanda, estão produzindo, com autorização oficial, maconha, destinada a doentes que necessitem da droga", acrescenta. Na histeria da guerra americana de combate às drogas, a experiência foi desativada, mas, agora, está voltando.

Não se está defendendo, neste artigo, a legalização das drogas (embora eu tenha dúvidas sobre o que é pior, legalizar ou deixar a distribuição nas mãos de criminosos), mas apenas um olhar mais pragmático diante do doente.

Certamente, tal posição incomoda a imensa maioria dos eleitores (e, inclusive, dos leitores desta coluna). Deposita-se mais confiança na repressão, algo que não tem funcionado em nenhuma parte do mundo.

Talvez mudassem de olhar diante de uma única pergunta: caso seu filho fosse viciado, onde vocês gostariam que ele tivesse acesso a drogas: numa "boca" ou num posto de saúde?

Duvido que um pai responsável tivesse dúvidas ao responder a essa questão.

PS - Pela minha vivência com jovens vítimas de dependência química, o melhor antídoto contra o vício é o indivíduo ter um projeto de vida, ou seja, perspectivas de realização. Ajudar os jovens a desenvolver sua auto-estima e capacidade de administrar dores e frustrações é tarefa, primeiro, da família e, depois, da escola. Portanto a educação contra as drogas é o ensinamento dos valores. Separei artigos sobre experiência de educação contra dependência química, destinados a pais e educadores. Estão na página do Aprendiz:

 
 
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