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14/01/2001 - 04h02

Provão revela barreira racial no ensino

  • Para MEC, adoção de cotas é inconstitucional

  • Escolaridade determina a discriminação

  • Uerj pode reservar vagas para carentes

  • Estácio de Sá tem campus na Rocinha


  • ANTÔNIO GOIS, da Folha de S.Paulo

    É do topo da pirâmide do sistema educacional brasileiro que se percebe com clareza a dimensão da desigualdade racial no país. Os negros, apesar de representarem 5,7% da população, são apenas 2,2% dos formandos de 18 cursos superiores avaliados pelo MEC no provão de 2000.

    Se a proporção de negros na população e na universidade fosse a mesma, o número de formandos nas universidades desse grupo étnico seria 160% maior.

    Em alguns cursos, a distorção é ainda mais visível. Em odontologia, por exemplo, apenas 0,7% dos estudantes que se formaram neste ano são negros. Em medicina, essa taxa é de 1%. Na área de veterinária, eles são apenas 1,1% do total.

    A mesma desigualdade se dá quando se compara a porcentagem de pardos e mulatos entre os brasileiros e entre os formandos. Segundo a PNAD (Pesquisa Nacional por Amostragem de Domicílio) de 1999 do IBGE, esse grupo representa 39,5% dos brasileiros, mas apenas 13,5% dos formandos que fizeram o exame do MEC.

    Quando se junta o número de negros e pardos, esse grupo acaba representando 15,7% dos formandos e 45,2% da população. Tanto no caso do provão como na pesquisa do IBGE, são as próprias pessoas avaliadas que definem seu grupo racial.

    Os dados sobre a presença de grupos raciais na universidade foram elaborados a partir dos questionários socioeconômicos respondidos por 197 mil alunos que participaram do exame do MEC no ano passado. O provão é condição obrigatória para o estudante obter o diploma.

    A diversidade da sociedade brasileira não é equivalente entre os formandos nem mesmo em cursos menos concorridos de carreiras com menos prestígio salarial, como é o caso de letras. Nessa área, 3,9% dos formandos são negros e 21,6%, pardos. Em matemática, essas taxas são, respectivamente, 3,5% e 20% dos alunos.

    Para o secretário de Educação Superior do MEC, Antônio Macdowell de Figueiredo, o perfil dos formandos é um reflexo da desigualdade social brasileira.

    "Não é na universidade que se dá essa desigualdade, ela vem desde a base educacional. A melhoria no acesso no ensino fundamental e médio tende a amenizar esse quadro desigual na universidade", afirma Figueiredo.

    A antropóloga da UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro) Yvonne Maggie, autora de um estudo sobre estudantes carentes que ingressaram no ensino superior no Rio de Janeiro, afirma que existe no Brasil uma hierarquia das carreiras que já é determinada na inscrição no vestibular.

    "Já há uma pré-seleção natural dos próprios estudantes. As classes média e alta, cuja porcentagem de brancos e amarelos é maior, escolhem as carreiras mais privilegiadas, como direito ou medicina", diz Yvonne.

    A antropóloga acredita que a desigualdade social no ensino superior se dá entre cursos, e não entre universidades. "O perfil de um aluno de medicina de uma universidade particular é quase igual ao de um estudante de curso particular. A maior diferença acontece quando se compara os cursos de baixo e de alto prestígio na sociedade", diz.

    Apesar da desigualdade, Yvonne afirma que a tendência é de melhoria na participação dos extratos mais carentes.

    "A diminuição da taxa de repetência e a expansão do ensino médio vão ajudar a mudar esse quadro. Acredito que em breve teremos um número maior de formandos negros. Mesmo assim, os dados de hoje mostram que existe uma classe média negra em número significativo", diz.

    Brancos
    O grupo étnico com mais representantes entre os formandos é o de brancos -eles são 54% da população e 80% dos estudantes que fizeram o provão.

    Um dos dados que mais chamam a atenção é a participação da população que se diz amarela (de origem asiática). Apesar de representar apenas 0,5% da população, o número de pessoas dessa raça supera o de negros entre os formandos, chegando a representar 2,6% do total.

    Em alguns cursos, como em medicina, o número de amarelos é três vezes maior do que o de negros. No Brasil, há 11 negros para cada pessoa de origem asiática.

    Para o pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) Sergei Soares, autor de um estudo sobre discriminação no mercado de trabalho, o bom desempenho dos estudantes de cor amarela nessa
    estatística não é uma peculiaridade apenas da sociedade brasileira. "Esse desempenho tem raízes culturais e é encontrado em quase todo mundo", afirma Soares.

    Yvonne Maggie, antropóloga da UFRJ, concorda: "Há até países que estabeleceram um limite para a presença dos estudantes de origem asiática na universidade para privilegiar outras minorias".
     

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