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09/03/2006 - 12h03

Fotografia e ioga estão entre novos "parceiros" da caminhada

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MARCOS DÁVILA
da Folha de S.Paulo

"Deixe-me ir, preciso andar/Vou por aí a procurar/Rir pra não chorar/Se alguém por mim perguntar/Diga que eu só vou voltar/Quando eu me encontrar." Os versos do sambista Candeia lembram que os caminhos trilhados pelos pés, muitas vezes, levam a lugares que só existem dentro de nós mesmos. O movimento mais natural do corpo, aprendido à custa de tropeços no primeiro ano de vida, parece estar sempre ligado ao (auto)conhecimento. Afinal, são os nossos pés que nos levam a todos os lugares. Não é bem assim: em cidades cada vez mais planejadas para carros, a caminhada acaba virando evento, e o sedentarismo, regra.

J.Coppola/Folha Imagem
Grupo caminha na estrada Velha de Santos, em SP
Grupo caminha na estrada Velha de Santos, em SP
Além de trekkings e percursos por centros históricos, as caminhadas aparecem acompanhadas de práticas de ioga, meditação e tai chi chuan, de discussões filosóficas e de cursos de inglês e de fotografia, entre outros.

A professora de educação física Ivani Trombetta, da Unidade de Reabilitação Cardiovascular e Fisiologia do Exercício do Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, acredita que associar esse exercício a atividades prazerosas é uma excelente idéia. "Se a caminhada é feita numa intensidade não muito forte, a pessoa nem percebe que está fazendo exercício. E tem outro aspecto, que é o de dedicar um tempo para si mesmo", afirma. "Descer do ônibus um ponto antes ou fazer uma caminhada até o trabalho não é a melhor opção, na minha opinião."

J.Coppola/Folha Imagem
Grupo caminha na estrada Velha de Santos, em SP
Grupo caminha na estrada Velha de Santos, em SP
Se a associação é feita com atividades como a ioga e o tai chi, melhor ainda. "É perfeito, pois o organismo deve ser trabalhado como um todo." Segundo ela, práticas como a ioga trabalham a musculatura, o alongamento e o equilíbrio, mas não tanto o sistema cardiovascular, que é o complemento que a caminhada traz, por ser um exercício aeróbico.

O controle da intensidade do movimento no andar é preciso. É fácil diminuir e acelerar os passos e, conseqüentemente, controlar o gasto de energia sem ultrapassar os limites do corpo. É o que afirma o médico do esporte Renato Romani, do Cemaf (Centro de Estudos da Medicina da Atividade Física e do Esporte), da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).

Para ele, a junção da caminhada com práticas meditativas é muito importante. "Muitas vezes, a pessoa anda 30 minutos num parque e se distrai tanto que, quando termina, nem sabe onde está. É o momento dela", diz. "Acreditamos que manter um pensamento positivo na caminhada, pensar no próprio corpo, por exemplo, tende a melhorar o aproveitamento da prática. A meditação traz essa consciência, pois você pensa no próprio corpo."

MEDITAÇÃO

"O caminho é onde os nossos pés estão", afirma Monja Coen, sentada num banco, depois de guiar um passeio na praça Buenos Aires, em São Paulo, sob muitos olhares curiosos. Ela organiza a Caminhada Zen, evento gratuito que acontece todo terceiro domingo do mês, a partir das 10h, no parque da Água Branca, em São Paulo. Trata-se de uma meditação feita em movimento. O projeto começou depois que a monja teve de se mudar de um grande templo para uma sala de meditação pequena. Entre os períodos de meditação sentada, havia sete minutos de caminhadas meditativas, mas, na sala diminuta, todos ficavam amontoados. Surgiu então a idéia de levar a prática para os parques e praças da cidade e estender o convite para todos os interessados.

Hoje, a atividade conta com o apoio da Secretaria Municipal da Saúde, que inseriu o evento no projeto Saúde nos Parques. A proposta é que monitores treinados pela monja multipliquem a prática em outros parques.

"A idéia da meditação caminhando é nos trazer de volta ao presente, que é a nossa única realidade", afirma a monja zen-budista. Para isso, a respiração e o direcionamento do olhar têm papel fundamental. "Quando caminhamos, não ficamos olhando para lá e para cá. Usamos os olhos baixos com o foco no caminho, mas, ao mesmo tempo, não perdemos a visão periférica", diz. "É preciso desenvolver a equanimidade dos sentidos."

Existem dois tipos de andar nessa meditação. Um deles é bem lento, o passo deve ter o tamanho da metade do pé. Quem olha diz que estão todos parados. As mãos ficam unidas na altura da barriga, e uma delas fica com os dedos cerrados, como se segurasse um cajado, para fornecer um eixo de equilíbrio ao corpo.

Em outro momento, o passo é acelerado. Nos movimentos mais rápidos, a respiração segue o ritmo dos passos. A inspiração dura geralmente três ou quatro passos, e a expiração, cinco ou seis.

IOGA

A professora de ioga Claudia Ruschel Lima, 40, aliou-se ao fotógrafo e guia de ecoturismo Guto Arouca, 41, para formar o grupo Caminhar Expedições e Travessias, que oferece passeios com práticas de ioga.

Antes de começar, os andarilhos fazem um alongamento a partir de posições da ioga. Durante a caminhada, é adotada uma técnica de respiração que também consiste em coordenar a inspiração e a expiração com os passos. "Essa respiração é utilizada há milênios pelos sherpas, povo do Himalaia conhecido pela sua destreza no monte Everest", afirma Claudia.

A designer Sílvia Guerra, 46, nunca tinha feito uma caminhada até participar de uma aventura com o grupo no pico do Lopo, com cerca de 1.800 m de altitude, em Estrema (MG). "Só cheguei até o topo por conta da respiração", afirma. As sessões de ioga acontecem à beira de um lago, no alto de uma montanha ou no gramado do parque, no fim ou no meio do passeio. Depende do trajeto.

A publicitária Ângela Guanais, 49, que já participou de diversos passeios com o grupo, acredita que a ioga dá uma outra percepção à caminhada. "A prática possibilita um contato mais sutil com a natureza, com mais concentração e sensibilidade."

HISTÓRIA

Sabe aquele casarão cercado pela mata atlântica, onde o imperador dom Pedro 1o se encontrava com sua amante, a marquesa de Santos? Pois então, é apenas uma lenda. Essa foi uma das histórias que empolgaram o assistente de importação João Tiago Urbano, 24, durante uma caminhada de 9 km pela estrada Velha de Santos, feita no último domingo.

Com um céu totalmente descoberto, que permitia uma vista rara da Baixada Santista, Urbano desceu a serra com um grupo de 25 pessoas, todas da sua família. O roteiro Caminho do Mar, que tem saídas de terça a domingo, a partir das 8h, passa por um conjunto de monumentos históricos em fase terminal de restauração, como os casarões Pouso Paranapiacaba e Rancho da Maioridade. As construções mostram passo a passo os desafios do homem para vencer a barreira da serra do Mar.

Até hoje, essa barreira deixa suas marcas. "Como é só descida, força muito as pernas", diz Urbano, que terminou o percurso com dores na canela e na panturrilha, mesmo tendo feito um alongamento antes de começar.

Para quem não quer enfrentar a serra, o roteiro São Paulo a Pé, pelo centro velho da cidade, pode ser uma opção. Organizado todos os domingos pelo grupo Andanças, o percurso dura cerca de quatro horas e passa por lugares como o Mosteiro de São Bento, o Edifício Martinelli e o Teatro Municipal. No mesmo dia, o grupo também promove uma caminhada pelo bairro da Luz, que tem como atrativos o parque da Luz, a Pinacoteca do Estado e o Mercado Municipal, entre outros pontos históricos.

O Clube da Caminhada da PUC (Pontifícia Universidade Católica) de São Paulo também organiza passeios históricos pela antiga estrada de Santos e pelo centro de São Paulo, entre outros, abertos ao público em geral.

FOTOGRAFIA

Engenheiro ambiental e fotógrafo há 18 anos, Jurandir Lima, 40, resolveu juntar suas duas paixões e criou um trekking fotográfico, realizado pela sua empresa Trilhas & Trilhas.

Depois de fazer expedições em diversos parques nacionais brasileiros, ele montou roteiros de caminhadas para transmitir seu conhecimento de fotografia na natureza.

O engenheiro Luís Alexandre Mozzilli, 60, que já participou desses passeios, leva sua máquina fotográfica em todas as viagens desde os 20 anos de idade. "Gosto muito de fotografar porque você vê o mundo com outros olhos."

FILOSOFIA

"Nunca confie numa idéia que não tenha surgido de uma caminhada", teria dito o filósofo Friedrich Nietzsche (1844-1900). A citação é da bióloga Rita Mendonça, que organiza o projeto Caminhadas Filosóficas, promovido pela Associação Palas Athena, em São Paulo.

Representante no Brasil da Sharing Nature Foundation e fundadora da ONG Instituto Romã de Vivências com a Natureza, a bióloga criou o projeto a partir do conceito de que pensamos de maneira diferente enquanto andamos. "Queria colocar essa idéia à prova e investigar como pensamos a partir do corpo em movimento", diz.

Questões filosóficas sobre o tempo e o pensamento estão entre as abordadas durante as caminhadas, que acontecem normalmente em áreas florestais próximas ou no entorno de São Paulo.

"É nesse contraste de ambientes que temos um território maior para reflexões. Caminhando em áreas naturais, os órgãos dos sentidos funcionam de um jeito diferente, a percepção do mundo muda", diz a bióloga.

INGLÊS

Chamado de "walk'n'talk", esse tipo de passeio envolve caminhadas moderadas em trilhas de praias e de montanhas acompanhadas por um professor de inglês. Durante todo o percurso, somente esse idioma é usado. "Desde o "good morning" de manhã até o "see you again" à noite, só falamos em inglês", afirma a secretária Luiza Murassawa, 45, que encarou uma caminhada de 12 km em Ubatuba, das 6h da manhã às 11h da noite, depois de 20 anos sem praticar, e pretende repetir a experiência mais vezes para voltar à forma.

O passeio, realizado pela agência Venturas & Aventuras, tem como alvo principal os alunos de escolas de inglês.

TAI CHI

A caminhada é essencial no aprendizado do tai chi chuan. Os praticantes da arte marcial chinesa devem ter consciência total do caminhar: de que forma mover as articulações das pernas e como colocar a planta dos pés no chão, realizando a transferência do peso e coordenando os movimentos com a respiração.

"Com o passar do tempo, as pessoas se esquecem de como andar e pisam de uma forma errada, o que traz problemas para as articulações", afirma o professor de tai chi e de kung fu Daniel Gobbo, 24, do Templo Shaolin de Kung Fu.

Segundo ele, o tai chi busca exemplos na observação do andar de animais, como os tigres. O movimento deve começar no calcanhar e terminar na ponta dos dedos, de forma que toda a planta do pé se apoie em algum momento no chão. "Isso massageia todo o corpo."

Colaborou Flávia Mantovani, da Reportagem Local

ONDE ENCONTRAR
-Templo Shaolim de Kung Fu (0/11/5071-7484; www.tskf.com.br)
-Caminhar Expedições e Travessias (0/xx/11/3645-1675 e 9617-3045; info.caminhar@terra.com.br)
-Zendô Brasil (0/xx/11/3062-8964; www.monjacoen.com.br)
-Palas Athena (0/xx/11/3266-6188; www.palasathena.org)
-Caminho do Mar Pólo Ecoturístico (0/xx/13/3372-3307 e 3372-4114; www.fphesp.org.br/caminhos)
-Andanças (0/xx/11/6863-0233 e 8143-6744; www.andancastur.com.br)
-Trilhas & Trilhas (0/xx/11/6231-2933 ou 6231-0840; www.trilhasetrilhas.tur.br)
-Venturas & Aventuras (0/xx/11/3872-0362; www.venturas.com.br)
-Instituto Romã de Vivências com a Natureza (0/xx/11/3726-7939; www.institutoroma.com.br)
-Clube da Caminhada da PUC-SP (0/xx/11/ 3670-8035; pac-vracom@pucsp.br)

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