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29/06/2006 - 11h54

Idade e histórico ganham importância para diagnosticar hipertensão

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FLÁVIA MANTOVANI
da Folha de S.Paulo

Os índices são médicos, mas boa parte das pessoas leigas estão familiarizadas com eles: se o aparelho de medir pressão acusar a famosa dupla 12 por 8, não há motivo para preocupação. Mesmo um 13 por 9 não costuma causar alarde. Mas, quando passa disso, a luz vermelha se acende e é sinal de tratamento à vista, certo? Nem sempre. Números como esses não são mais absolutos na hora de definir quem deve e quem não deve receber tratamento para hipertensão.

Cada vez mais, a tendência é considerar diversos fatores de risco, e não só a pressão arterial, na hora de definir o diagnóstico de hipertensão, a meta a ser atingida e o tratamento que o paciente vai receber. Assim, se uma pessoa tiver pressão 12 por 8, mas for diabética, já deve ficar de olho e, em alguns casos, até abaixar o índice. Por outro lado, quem possui pressão um pouco alta (14 por 9, por exemplo), mas não tem outros fatores de risco, nem sempre precisará tomar remédios ou diminuir drasticamente os índices: uma mudança no estilo de vida pode resolver.

A abordagem, chamada estratificação de risco, é um dos destaques da 5ª Diretriz Brasileira de Hipertensão, que será divulgada em agosto no 14º Congresso da Sociedade Brasileira de Hipertensão. Finalizado em fevereiro, o documento atualiza as diretrizes de 2002, que já tratavam do tema, mas de forma menos aprofundada.

"A grande novidade é que toda decisão terapêutica deve se basear nessa estratificação, que é a avaliação do risco cardiovascular do paciente. Para isso, levamos em conta não só a pressão arterial mas também outros fatores de risco, lesões em órgãos como o coração e os rins e doenças cardiovasculares prévias. O nível da pressão pode ser prejudicial ou não, dependendo de uma constelação de fatores", diz Osvaldo Kohlmann Jr., nefrologista da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) que participou da elaboração da nova diretriz.

O assunto também foi um dos destaques do congresso anual da ASH (Sociedade Americana de Hipertensão), que ocorreu no mês passado, em Nova York. O presidente da entidade, Thomas Giles, afirmou, em um artigo em que propõe uma nova definição de hipertensão, que "qualquer tratamento de hipertensão baseado apenas nas medidas da pressão arterial --sem considerar outros sinais de risco cardiovascular-- não é recomendado".

Polêmica

Giles defende também uma questão polêmica: que sejam receitados remédios para quem está no limite entre a pressão normal e a levemente alta --a chamada pré-hipertensão, definida por valores entre 12 por 8 e 13,9 por 8,9. A recomendação é considerada um exagero por muitos médicos. Ex-diretores da ASH chegam a acusar Giles de agir baseado nos interesses da indústria farmacêutica.

No centro da discussão, está o Trophy (Trial of Preventing Hypertension), estudo apresentado em março que avaliou, pela primeira vez, a eficácia do tratamento medicamentoso para prevenir a hipertensão em pré-hipertensos. Os resultados mostraram uma redução de 15,6% no risco relativo no grupo que tomou o remédio --no caso, a substância candesartan cilexetil-- em comparação com o grupo de controle.

"Trata-se apenas de um estudo, é preciso avaliar mais. Esse conceito dos americanos de tratar toda pessoa com pressão acima de 12 por 8 é muito drástico e não vingou na Europa nem no Brasil", afirma o fisiologista Robson Santos, presidente da Sociedade Brasileira de Hipertensão. Segundo ele, atualmente esses pacientes são apenas orientados a levar uma vida mais saudável.

O nefrologista Décio Mion, chefe da unidade de hipertensão do Hospital das Clínicas da USP (Universidade de São Paulo), também afirma ser contra medicamentar a população. "O estudo é um primeiro indício de que talvez valha a pena dar medicamento no início, mas isso ainda é muito discutível. Precisamos de mais evidências para mudar nossa conduta, pois muitas pessoas seriam afetadas com isso", diz.

Para Kohlmann Jr., o estudo tem limitações, "mas mostra que é preciso atuar no indivíduo pré-hipertenso, com ou sem remédios, principalmente se ele tiver fatores de risco".

Mesmo tendo pressão "no limite do normal" (entre 13 por 9 e 14 por 9), a jornalista Lívia Queiroz, 23, toma remédios há cinco anos para controlá-la. Isso porque sua família é cheia de hipertensos --pai, mãe, avós e irmãos--, e os antecedentes familiares são um fator de risco para eventos cardiovasculares.

O bancário José Luiz Jr., 27, passa pelo mesmo problema. Sua mãe, que é hipertensa e diabética, sofreu um princípio de infarto aos 36 anos. Seu pai também tem hipertensão. Por isso, mesmo tendo pressão normal, ele controla o consumo de sal, exercita-se com freqüência e faz check-up anual.

Mas nem todo mundo chega a tomar essas precauções. O cardiologista Flávio Cure, do Hospital Samaritano do Rio de Janeiro, lembra que, por se tratar de uma doença "silenciosa", que raramente apresenta sintomas, muitas pessoas não sabem que sofrem do mal --estima-se que isso ocorra com 35% dos afetados. "Há ainda um problema de adesão ao tratamento. Muitos pacientes param de tomar os remédios acreditando já estarem curados e voltam a praticar velhos hábitos prejudiciais à saúde."

Apesar de nem sempre dar conta de tratar sozinho a hipertensão, manter um estilo de vida saudável é recomendável tanto para hipertensos graves quanto para quem tem pressão normal ou "limítrofe".

O cardiologista Heno Ferreira Lopes, da unidade de hipertensão do Incor (Instituto do Coração do Hospital das Clínicas da USP), acaba de lançar o livro "A Dieta do Coração" (ed. Abril), no qual explica, em linguagem simples, como funciona uma dieta chamada Dash (Dietary Approaches to Stop Hypertension), criada por pesquisadores dos EUA, em 1997, para combater a hipertensão.

Um estudo feito durante oito semanas mostrou que a dieta provocou redução média da pressão máxima de 14 para 12,9 e da mínima de 9 para 8,5. Também foi comprovado que ela diminui o colesterol "ruim" e os triglicérides. Isso sem fazer ninguém passar fome, já que é uma dieta de 2.000 calorias.

O mais curioso é que, quando foi criada, a Dash não previa a redução de sal, um vilão muito associado à hipertensão. Apenas a prevalência de frutas, vegetais, grãos integrais e laticínios desnatados e a redução de gordura e de açúcar foram suficientes para os bons resultados. "O sal, até então, era o único elo conhecido entre hipertensão e alimentação", observou Lopes no livro. Pesquisas posteriores mostraram que a versão da Dash com redução de sal é ainda mais eficaz.

A designer Roberta de Felippe, 25, já tomou remédios para reduzir a pressão, mas hoje consegue controlá-la apenas com uma alimentação equilibrada, caminhadas e exercícios na bicicleta ergométrica --as atividades aeróbicas são as mais indicadas. Ela tem pressão 12 por 8, mas, como é diabética, precisa ficar de olho. "Fico controlando sempre", conta.

Nova classe

Outra novidade apresentada no congresso da ASH foi um medicamento que será provavelmente o primeiro de um novo grupo de anti-hipertensivos: os "inibidores de renina". Há mais de uma década, não surge uma nova classe de remédios para o problema. A substância, chamada aliskiren, está no fim dos testes clínicos (fase 3) e ainda precisa obter a aprovação dos órgãos reguladores.

Desenvolvida pelo laboratório Novartis, ela atua inibindo a renina, enzima responsável pela ativação de um sistema que afeta a regulação da pressão arterial. Já há remédios que atuam sobre esse sistema. A diferença é que o novo fármaco bloqueia seu ponto de ativação: a enzima que o desencadeia.

Ainda não é possível saber se isso se traduzirá em vantagens para os pacientes. "É válido por ser uma nova arma terapêutica, mas só saberemos seus reais benefícios na fase 4 de pesquisas", diz Robson Santos.

Além da Novartis, outro laboratório farmacêutico, o Actelion, também desenvolve um inibidor de renina --que está atualmente na segunda fase de testes clínicos.

A jornalista Flávia Mantovani viajou a Nova York a convite da Novartis

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