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09/11/2006 - 08h02

Tecnologia revela cada vez mais cedo detalhes do feto durante gravidez

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IARA BIDERMAN
Colaboração para a Folha de S.Paulo

Nicolas ainda não nasceu, mas já tem o seu primeiro álbum de fotos. As imagens do bebê não nascido, consideradas "quase perfeitas" pela mãe, a economista Roberta Nicoleto Musico, 35, foram colecionadas durante as inúmeras ultra-sonografias que Musico teve de fazer durante a gestação.

A possibilidade de obter "fotos" de boa qualidade da vida intra-uterina, que revelam detalhes como um nariz mais achatado ou um olhinho puxado, é apenas a parte mais visível do avanço tecnológico dos exames de gravidez.

Do primeiro registro eletrônico do batimento cardíaco fetal, gravado em 1901, ao "baby face" (imagens do rosto do feto obtidas com ultra-sonografia 3D), a vida secreta dos bebês está, a cada dia, mais exposta à curiosidade dos pais e à pesquisa médica.

Eduardo Knapp/F
Grávida de cinco meses, Grasiele Bassana Olszewsky, 25, faz ultra-sonografia
Grávida de cinco meses, Grasiele Bassana Olszewsky, 25, faz ultra-sonografia
É esta última que justifica a parafernália tecnológica, pois, com ou sem álbum de fotos, os exames de última geração permitem, de forma pouco ou nada invasiva, acompanhar o desenvolvimento da gestação, diagnosticar precocemente possíveis problemas e controlar riscos.

Foi o caso de Musico. Na quinta tentativa de fertilização assistida, ela conseguiu engravidar. Mas, logo no início da gestação, teve sangramento da placenta. Além disso, a ultra-sonografia do colo do útero indicou a possibilidade de parto prematuro. Para preveni-lo, foi feita uma cerclagem (sutura no colo do útero para evitar a dilatação antecipada) e ela passou boa parte dos nove meses em repouso. As imagens das ultra-sonografias 3D do filho a ajudaram a passar o período com mais tranqüilidade.

"Ver, a cada semana, que o bebê está perfeito faz muita diferença", diz. Além de se garantir sobre o bem-estar do seu filho, Musico se beneficiou de exames que monitoram a saúde da mãe --como ela já teve um derrame, o doppler do fluxo do sangue na artéria uterina permitiu um melhor controle de suas condições cardiovasculares.

Custo-benefício

É consenso que os exames de alta tecnologia beneficiam as gestantes de risco. Nas de baixo risco, a questão ainda está em aberto --embora, entre as que podem arcar com o custo, seja difícil encontrar uma que não queira fazer pelo menos a ultra-sonografia 3D. "O lado bom é que os exames não são invasivos. O ruim é que o rastreamento não é definitivo.

Conforme o resultado, gera ansiedade e pode levar a paciente a fazer muitos exames desnecessários", diz Wladimir Taborda, coordenador de ginecologia e obstetrícia do Hospital Israelita Albert Einstein. Para Taborda, ainda não há comprovação sobre a vantagem de aplicar vários desses exames em todas as mulheres, principalmente levando em conta a relação entre o custo e a efetividade deles.

A educadora Vandressa Guimarães Duarte Gaspar, 35, que teve o seu segundo filho na semana passada, optou por fazer vários dos exames de última geração, "só por precaução". Embora tenha passado muito bem durante toda a gestação, acredita que os procedimentos sempre dão mais segurança aos pais. "Hoje é possível detectar quase tudo, e a gente se cerca de cuidados. Muitas mulheres têm uma gravidez normal, e o bebê nasce com problema de coração, algo que pode ser descoberto antes do parto", diz.

Gaspar tem razão. Segundo Renato Ximenes, diretor científico do Centrus (Centro de Ultra-Sonografia e Medicina Fetal), em cada cem bebês nascidos, um apresenta problemas congênitos no coração. "Quase 95% dos bebês que nascem com cardiopatias são de gestantes de baixo risco", afirma Ximenes. Os exames disponíveis são um meio de detectar o problema e determinar quais medidas devem ser tomadas para evitar complicações ou a morte do recém-nascido.

Exame cosmético

A tendência é que mesmo os exames mais sofisticados virem rotina. A microempresária Vanessa Cury de Camillis Lestingi, 34, grávida de seis meses de seu terceiro filho (uma menina), é testemunha da rapidez dos avanços.

Na gestação de Lucas, 6, a ultra-sonografia morfológica, hoje realizada rotineiramente, ainda era uma novidade disponível em poucos lugares. Ela não chegou a fazer o exame. Quando engravidou de Nicole, hoje com três anos, já fez o morfológico --a novidade, então, era o doppler fluxometria (exame do fluxo sangüíneo entre placenta, cordão umbilical e bebê).

Agora, na terceira gravidez, é que o doppler entrou na agenda de exames de Lestingi. "Esse exame permite verificar se o bebê está bem ou se vai entrar em sofrimento fetal. É um procedimento que pode dar muita tranqüilidade para a futura mãe", diz Flávio Garcia de Oliveira, diretor do Centro Interamericano de Medicina Materno-Fetal.

Lestingi não é do tipo de grávida ansiosa, tampouco daquelas que adoram novidades "high-tech". A ultra-sonografia 3D, "para ver a carinha do bebê", por exemplo, ela acha que é besteira e não vai fazer.

Muitos médicos concordam com ela. "Fazer o exame apenas para tirar a foto do rosto do bebê no útero é algo discutível. Qual é o valor científico? Traz benefício para a mãe? Há um grande debate sobre o que estão chamando de ultra-sonografia cosmética", diz Eduardo Cordioli, médico da medicina fetal do Hospital e Maternidade Santa Joana e da Pro Matre Paulista.

Ele acrescenta, porém, que o exame 3D é importante para mostrar aspectos como o volume dos órgãos --alterações no tamanho sinalizam doenças ou malformações.

A tecnologia também é muito útil para a prática da telemedicina, já que a imagem pode ser gravada e enviada para diversos especialistas em qualquer parte do mundo.

Seja como for, é raro uma paciente de clínica particular que não queira sair da consulta com um CD personalizado com as fotos da ultra-sonografia 3D do bebê. Coisas de mãe, mas que, acreditam alguns, podem servir para envolver o pai, que fica mais "por fora" do que se passa dentro do útero.

Isso costuma ocorrer, mas é bom lembrar que a foto, por melhor que seja a sua qualidade, é de um feto, e pode gerar decepções e inseguranças. Quando a auxiliar administrativa Grasiele Bassana Olszewsky, 25, grávida de cinco meses, mostrou entusiasmada a foto da ultra-sonografia 3D para o marido, ouviu dele: "Ai, que coisinha feia". Ela nem se importou --se pudesse, conta, faria um exame desses por mês; ademais, tem certeza de que sua filha será bem bonita.

Três dimensões

Foi com a ultra-sonografia 3D que Olszewsky soube estar esperando uma menina. "Nos exames anteriores, em 2D, não dava para saber com certeza qual o sexo", diz ela. Hoje em dia, não é preciso esperar muito. Entre os exames de ponta para grávidas, está o da sexagem fetal, que permite saber o sexo do bebê a partir da oitava semana de gestação. O índice de acertos desse teste ultrapassa os 99%.

Assim como a foto do feto, o teste de sexagem fetal é apenas a ponta do iceberg das possibilidades abertas para a pesquisa da vida intra-uterina. Ele é resultado das descobertas da biologia molecular, que, junto à tecnologia da imagem, é o futuro dos exames da gravidez.

"Descobriu-se que, desde o início da gestação, já há DNA do feto no plasma da mãe. A biologia molecular consegue detectar quantidades minúsculas desse DNA e pesquisar as informações que ele traz", explica José Eduardo Levy, responsável pelo laboratório de biologia molecular do banco de sangue do Hospital Sírio-Libanês.

Para realizar o teste, a mãe só precisa fazer uma coleta simples de sangue. Na maioria das vezes, o resultado serve para satisfazer a curiosidade dos pais, mas, em casos de doenças ligadas ao sexo, é uma informação que orienta médicos e pais quanto às medidas a serem tomadas.

E as pesquisas da biologia molecular avançam para responder muito mais do que a clássica pergunta, "é menino ou menina?". Para Levy, "estamos vivendo uma revolução na medicina fetal, que abriu um mundo para testes genéticos precoces não invasivos".

O teste, inócuo para a saúde da mãe e do bebê, traz à tona também algumas questões éticas. A principal é a possibilidade de permitir a seleção de uma característica genética, levando a um tipo indesejável de controle de natalidade. Levy acredita que o risco maior de isso ocorrer é quando o teste é feito no embrião, antes da implantação, um procedimento que não é permitido por lei no Brasil.

Além dos aspectos éticos, a alta tecnologia aplicada aos exames de gravidez levanta a questão da desumanização da gestação e do parto.
Para Taborda, por mais paradoxal que pareça, se for bem utilizada, essa tecnologia pode significar um maior número de partos sem hospitalização.

"Se posso separar o grupo de risco, com exames seguros e pouco invasivos, interno apenas as gestantes que precisam de cuidados hospitalares. Para as outras, o parto pode deixar de ser um evento médico-cirúrgico e voltar a ser um evento sociofamiliar", afirma.

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