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29/12/2002 - 07h52

São Silvestre bate recorde de deficientes

GUILHERME ROSEGUINI
da Folha de S.Paulo

Quando Émerson Iser Bem cruzou a linha de chegada e levou a bandeira do Brasil ao lugar mais alto do pódio na São Silvestre de 1997, o deficiente físico Marcos Eduardo da Costa e Silva sentiu uma enorme vontade de correr.

Demorou quase cinco anos para concretizar o sonho. Começou a treinar em junho deste ano e disputou alguns torneios preparatórios. Na próxima terça, promete que vai completar a prova e celebrar no mesmo local em que o ídolo Iser Bem garantiu o último triunfo brasileiro no evento.

"Mas não vou me preocupar em ganhar. Gosto mesmo é de competir, de estar na rua e ver as pessoas torcendo", afirmou o atleta de 25 anos, que sofreu uma paralisia cerebral no nascimento.

Histórias como a de Costa e Silva deixaram de ser exceções na mais famosa prova de rua do país. Em 2002, quase 300 deficientes estarão misturados aos mais de 15 mil corredores que disputam a 78ª edição da São Silvestre. Um recorde nas estatísticas que surpreendeu os organizadores.

"Não é possível precisar com exatidão o número de deficientes porque não há uma ficha de inscrição específica. Mas nossa estimativa [300 atletas] mostra que o número é quase 50% maior que no ano passado", afirmou Ivo Camanzano, supervisor de eventos esportivos da Gazeta Esportiva, uma das organizadoras da prova.

O "boom" de atletas deficientes provocou até algumas alterações na estrutura da corrida. Quinze minutos antes da largada da prova feminina (15h) será realizada uma partida extra dedicada exclusivamente a esses competidores.

Até o ano passado, apenas participantes que utilizavam cadeiras de roda iniciavam seu percurso em um horário especial.

"A largada é apenas uma opção de segurança para eles. Se o deficiente quiser correr ao lado dos demais competidores, não há problema. Não queremos segregar ninguém", avisa Camanzano.

Evitar a segregação é, aliás, a principal luta desses atletas. Além de lapidar a parte física, eles utilizam as competições como oportunidade de integração social.

"Já vi nossos atletas chegarem na frente de muitos outros corredores. Durante a prova, muitos anônimos se oferecem para correr lado a lado e dar apoio. Isso é o mais gratificante", explicou Claudio Roberto de Almeida, técnico da Estação Especial da Lapa, entidade que, além de Costa e Silva, levará outros dez atletas portadores de deficiências para a corrida.

Preconceito
Antes de conseguirem status e respeito na São Silvestre, muitos deficientes foram obrigados a cumprir um caminho espinhoso. A principal barreira era o preconceito, dentro e fora das pistas.

Um dos casos mais emblemáticos ocorreu com Tadeu Monteiro, técnico do Projeto Geração Campeã, de Brasília. A entidade envia portadores de deficiência para a São Silvestre há três anos.

"Na primeira vez que competimos, um deficiente mental comeu demais e defecou no ônibus. A reação dos que não possuíam distúrbios foi surpreendente: eles disseram que nunca mais viajariam com pessoas daquele tipo."

Monteiro ignorou as ameaças e seguiu seu trabalho no grupo. Desta vez, ele deve chegar a São Paulo com dez deficientes, número recorde de sua instituição.

O treinador de Brasília e outros técnicos tentam utilizar a visibilidade da São Silvestre para alavancar ainda mais o esporte e a valorização da auto-estima de seus comandados. Utilizam exemplos como o de Jefferson Luiz Nunes Silva, 19, que também sofreu uma paralisia cerebral. Ele completa em 2002 sua terceira participação.

Questionado sobre o motivo da persistência na modalidade, Nunes Silva, da Estação Especial da Lapa, abre um imenso sorriso e responde sem titubear: "Hoje sei que posso correr muito bem".
 

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