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11/08/2003 - 11h42

Guel Arraes volta ao cinema com "Lisbela e o Prisioneiro"

SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo

O ponteiro se aproxima das 11h e o último dos 110 espectadores toma seu assento na sala. Terça-feira, dia 5.

A platéia (unicamente de jornalistas, raras vezes tão numerosos em sessões desse tipo) irá assistir ao longa "Lisbela e o Prisioneiro", com calculada antecedência à sua estréia comercial, prevista para o dia 22, em 200 cinemas do país.

A poucos metros dali, num hotel na zona sul paulistana, o diretor espera o fim da projeção, para entrevistar-se com os espectadores. Enquanto aguarda, lê. As páginas (soltas e fotocopiadas) que tem nas mãos são de autoria de Umberto Eco:

"É indubitável que, se um romance diverte, obtém o consenso do público. Ora, durante certo período, pensou-se que o consenso fosse um sinal negativo. Se um romance encontra consenso, o encontra porque não diz nada de novo e dá ao público aquilo que ele já esperava.

"Creio, porém, que não seja a mesma coisa dizer: "Se um romance dá ao leitor aquilo que ele esperava, encontra consenso" e "se um romance encontra consenso, é porque dá ao leitor aquilo que ele esperava". A segunda afirmação nem sempre é verdadeira".

Dilema

As palavras do escritor italiano delineiam o dilema que persegue o cineasta e homem de televisão Guel Arraes, 49. Leva seu nome o núcleo de produção da TV Globo hoje responsável pelos programas "Casseta & Planeta - Urgente", "Os Normais", "A Grande Família" e por quatro quadros no "Fantástico" -"Homem Objeto", "Brasil Total" e os de Denise Fraga e Chico Anysio.

São também de Arraes os filmes "O Auto da Compadecida" (2000) e "Caramuru - A Invenção do Brasil" (2001), ambos exibidos antes na TV que no cinema. Esse hibridismo colou na imagem pública do diretor um rótulo elogioso -o de ser autor de uma televisão cinematográfica- e também o seu reverso -o de produzir cinema televisivo.

Do ponto de vista de Arraes, a questão é uma só: "Há anos que [o cineasta e roteirista] Jorge [Furtado], [a atriz] Regina Casé, [os humoristas do] Casseta & Planeta -um grupo grande da televisão, que é quase um pequeno movimento artístico-, há anos a gente vive nessa tensão que é conquistar o público e inquietá-lo. Às vezes o inquietamos demais, e ele nos abandona. Às vezes o conquistamos demais, e a crítica nos abandona", disse à Folha.

Arraes gosta de tratar cinema e TV indistintamente. "Tem uma hora em que eles ficam iguais." E afirma que a popularidade da TV brasileira é o ponto de apoio às pretensões do país de desenvolver uma indústria cinematográfica.

"Temos um produto audiovisual que o público ama ver. Então temos um potencial enorme de público [para o cinema brasileiro]. Sem essa televisão, não seria muito realista pensar que o Brasil deve ter um grande cinema. É um país pobre. Nenhum país com pouco dinheiro tem uma cinematografia pujante. É a televisão que dá o termômetro do que se pode esperar."

Estratégia

Em "Lisbela e o Prisioneiro", Arraes ajustou a fórmula divertir/inquietar de maneira a não correr risco de afastar o público esperado.
O roteiro do filme foi feito por ele, em parceria com o cineasta Jorge Furtado ("O Homem que Copiava") e com o ator Pedro Cardoso.

""O Homem que Copiava" [lançado em junho passado] e "Lisbela e o Prisioneiro" são duas estratégias parecidas, com pesos diferentes", afirma Arraes.

"Digo ao Jorge que não sei se ele fez o filme mais popular do mundo de vanguarda, ou se ele fez o filme de vanguarda mais popular do mundo. "Lisbela e o Prisioneiro" tem uma proporção inversa de divertimento para alguma pitada de inquietação."

As pitadas de inquietação estariam "mais na linguagem do que no conteúdo das idéias".

Adaptada do texto teatral homônimo de Osman Lins, "Lisbela e o Prisioneiro" é uma comédia romântica com os elementos típicos do gênero: Lisbela (Débora Falabella) está comprometida com um noivo pedante (Bruno Garcia) quando se apaixona pelo sedutor Leléu (Selton Mello).

Os amantes terão de superar a oposição do pai da moça (André Matos), a perseguição de um bandido (Marco Nanini) e os ciúmes de uma antiga paixão do herói (Virginia Cavendish).

Arraes entrecortou a história numa narrativa que mescla cenas em tempos imaginários e em ordem cronológica e um desfecho que oferece três possibilidades sucessivas.

A ação transcorre no Nordeste brasileiro. Aí, o diretor procurou introduzir uma "novidadezinha".

"Se há um lugar mitológico no cinema brasileiro é o Nordeste. E um Nordeste muito preciso [o do sertão ressecado]. Nosso universo é suburbano, vagamente nos anos 60, porque tenta um idílio ainda possível entre uma cultura local e a industrialização."

13h30 da terça, dia 5. Arraes se dirige à sala onde o esperam 110 jornalistas. Dispensou o almoço. Contentou-se com frutas. No elevador, comenta: "Em São Paulo, fico meio nervoso. O pessoal costuma ser severo".
Começa a entrevista. Uma sucessão de perguntas amenas. Como se diria no falar nordestino de "Lisbela", fica a impressão de que o pessoal gostou "bem muito" do filme. Na saída da sala, a pergunta do diretor: "Os críticos estavam aí?". Não, Guel. Não estavam.

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