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25/12/2003 - 08h05

Música brasileira ficou independente em 2003, dizem produtores

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GUILHERME GORGULHO
da Folha Online

O ano de 2003 marcou a solidificação de um movimento de independência na música popular brasileira. Foi neste ano que vários artistas de renome ganharam mais liberdade em trabalhos independentes enquanto grandes gravadoras foram afetadas pela crise do setor.

O crescimento da pirataria e a popularização da internet como meio de troca de músicas vêm pressionando as gravadoras a cada ano que passa, segundo a opinião de produtores musicais ouvidos pela Folha Online.

Segundo dados da CPI da Pirataria da Câmara dos Deputados e da ABPD (Associação Brasileira dos Produtores de Discos), o número de artistas contratados pelas gravadoras no Brasil caiu 30% entre 1997 e 2002, reduzindo os lançamentos de discos em 24%. Neste mesmo período, o percentual de discos piratas vendidos saltou de 3% para 59%, movimentando R$ 788 milhões e assombrando as empresas.

"Houve uma tomada de posição dos artistas por sentirem que, numa gravadora independente, eles têm mais liberdade e são atendidos com mais atenção", afirma o produtor, pesquisador e crítico Zuza Homem de Mello, 70.

"A gravadora é uma grande fábrica, uma linha de montagem, que tem que padronizar. Os artistas que já têm uma posição firmada não precisam se sujeitar a imposições", diz Mello.

Nomes como Maria Bethânia e Gal Costa lançaram discos em 2003 por selos independentes --depois de anos como parte do elenco de grandes gravadoras-- e Milton Nascimento encerrou seu contrato com a Warner e deve lançar o próximo disco por um selo próprio.

Mas quais são as outras vantagens de se desvincular das grandes empresas multinacionais para produzir seus trabalhos?

"Vantagem maior que a liberdade não tem. As gravadoras seriam o quê? Distribuidoras. E, como distribuidoras, talvez elas não percam sua importância", opina o diretor e produtor Fernando Faro, 66, com mais de 30 anos de experiência na área. "A gente podia antecipar que o caminho seria esse", defende Faro.

Sem modismo

Outro aspecto que pesou para o aperto nas grandes gravadoras foi que, a exemplo do ano passado, não surgiu um novo modismo musical após o esgotamento de axé, pagode e sertanejo.

"Para as gravadoras, modismo é o que há de melhor, pois começa a vender sem que o público possa analisar", diz Mello. "Todas as gravadoras vão direto à Igreja agradecer a Deus por um modismo, por ter um norte."

Maria Rita

Apesar do movimento de "independência", o principal destaque da MPB foi resultado de investimento de uma multinacional: a cantora Maria Rita, que lançou disco, DVD e fez shows que lotaram grandes casas do eixo Rio-São Paulo com direito até a especial na TV Globo --coisa rara para uma cantora em início de carreira.

A filha de Elis Regina sempre alegou que tinha como objetivo se desvincular ao máximo da imagem da mãe, buscando obter um reconhecimento de suas qualidades por mérito próprio. Depois de participar do disco "Pietá", de Milton Nascimento, Maria Rita lançou o seu disco de estréia e já vendeu mais de 350 mil cópias.

"O sucesso da Maria Rita foi puxado pela locomotiva Elis. Mas, se ela continuar, isso mostra que ela tem talento", afirma Mello. Para o produtor, outro grande fator que pesou para o êxito da cantora iniciante foi o alto investimento da Warner na divulgação do trabalho.

"Até a Wanessa Camargo consegue espaço. Na Maria Rita também houve investimento, só que ela tem o que oferecer em termos musicais", diz Mello, destacando, no entanto, que a filha de Elis evitou exagerar nos efeitos na produção de seu trabalho apesar do suporte financeiro da gravadora. "Houve até um certo excesso de elogios, e isso desvalorizou outras cantoras", pondera Mello.

Balanço

Para Fernando Faro, o balanço geral sobre a música popular brasileira produzida no ano de 2003 foi muito positivo. "Acho que foi um ano muito fértil, e o próximo promete ser ainda mais."

Segundo Faro, além de Maria Rita, 2003 foi também o ano de Marisa Monte e Zeca Pagodinho. Marisa Monte continuou com grande sucesso ao lado de Arnaldo Antunes e Carlinhos Brown com o grupo Tribalistas, apesar de o disco ter sido lançado no final de 2002. Neste ano, o trio pop emplacou músicas nas rádios e em trilha sonora de novela.

"A Marisa deu uma apagadinha no fim do ano. O Zeca não... ele está sempre na ponta. Um sambista, pesquisador... ele é ótimo", diz Faro. O cantor lançou neste ano o "Acústico MTV" dando continuidade ao sucesso de "Deixa a Vida me Levar" (2002).

Já o produtor Zuza Homem de Mello acha que o ano perpetuou a ciclo da repetição da música "passageira" e "menos consistente" na mídia. "Como nos últimos anos, muita gente ficou sem saber o que acontecia na MPB, no que ela tinha de mais representativa, porque o rádio e a TV passaram batido em relação a alguns trabalhos que havia de novo na MPB."

Mello aponta o compositor e violonista Guinga como o maior destaque da MPB do ano. "Guinga continua a produzir um trabalho num nível superior até ao que havia nos anos passados." O compositor lançou neste ano "Noturno Copacabana", o sexto disco de sua carreira, pelo selo Velas.

Mello acredita, no entanto, que houve uma conquista de espaço de gêneros como o jazz e o erudito em grandes centros urbanos como São Paulo e Rio. Ele cita o crescimento no número de assinaturas para os espetáculos da Sala São Paulo, na estação Júlio Prestes, como um dos sinais concretos do aumento do interesse do público por estilos menos populares.

"Há um público jovem indo atrás disso, e isso é favorável para a música." De acordo com Mello, outro exemplo foi o fato da noite de jazz do TIM Festival, do qual foi curador, ter se esgotado primeiro. "O que há é uma migração de jovens para o jazz e o erudito", afirma Mello, destacando a "empatia" que há entre estes dois gêneros.

Desafio

A popularização da internet para a troca de músicas também vem levantando diversos questionamentos a respeito de pirataria e da postura que os artistas têm que adotar frente esta novidade.

"Como será não se sabe --todos estão tentando encontrar uma saída", afirma Mello. "O que é preciso se lembrar é que os meios anteriores não vão sumir. Na verdade, os meios se solidificam."

Já Fernando Faro diz não acreditar que a nova mídia ocasionará mudanças no meio de produção dos artistas. Ele vê benefícios na ampliação dos canais de divulgação. "Acho que, quanto mais se divulgar a música popular brasileira (...), seria ótimo, será ótimo", ressalta.

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