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23/01/2004
-
08h14
SÉRGIO DÁVILA
da Folha de S.Paulo
Conheço uma menina que viveu um ano na Austrália sem comer arroz. A família com quem a garota foi morar aprendeu algumas palavras em português --a mesma meia dúzia que ela sabia em inglês. E "arroz" com sotaque australiano ficou parecido com "a horse", prato que era oferecido com insistência pelos anfitriões. Ela recusava e jurava que ninguém comia cavalo no Brasil. E nunca teve coragem de desmentir a história.
A comunicação, ou a falta dela, deve ser a maior geradora de problemas e confusões. De vez em quando, gera também um grande filme, como "Encontros e Desencontros", cujo título original é "Lost in Translation" e, por uma ironia que define o Brasil, foi perdido na tradução.
Mas o segundo longa de Sofia Coppola só aparentemente fala do drama e da graça de se estar num país em que não se fala a língua. É um tratado da incomunicabilidade dos sentimentos. Para dar conta disso, a diretora convocou um dos grandes atores vivos do cinema americano, o desprezado Bill Murray.
Ele é Bob Harris, um astro decadente que ganha dinheiro fazendo comerciais no Japão. E não é só o rumo de sua carreira que o deixa entediado e desiludido. Seu casamento não vai bem, sua forma física idem. Morando num hotel em Tóquio enquanto decide a cor do carpete pelo telefone com a mulher, Bob tem a vida no piloto automático.
Entra em cena Charlotte --aliás, é um close na bunda dela que abre o filme. Sua dona é Scarlett Johansson, 19, cabelo escorrido, bocão e voz grossa, que brilhou como a esquisita número dois de "Ghost World". Casada com um fotógrafo de moda (Giovanni Ribisi) em ensaios fora da cidade, ela passa a maior parte do tempo no hotel, o mesmo em que está Bob.
Então os dois se conhecem e, apesar das diferenças, começam a falar a mesma língua, ou melhor, a criar um novo dialeto, cheio de gírias e de piadas privadas. Enquanto isso, o Japão e os japoneses fazem fundo cômico.
Como um crítico disse (OK, fui eu, na Ilustrada de sábado passado), a julgar pelos dois filmes de Sofia ("Virgens Suicidas", 1999) e pelos dois últimos de papai Francis ("Jack", 1996, e "O Homem que Fazia Chover", 1997), a menina está na frente.
Avaliação:
Encontros e Desencontros (Lost in Translation)
Produção: EUA/Japão, 2003
Direção: Sofia Coppola
Com: Bill Murray, Scarlett Johansson
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Ibirapuera e circuito
Leia mais
Trilha sonora é tratada como personagem em filme de Sofia Coppola
Aparência esconde sentimentos mudos em "Encontros e Desencontros"
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da Folha de S.Paulo
Conheço uma menina que viveu um ano na Austrália sem comer arroz. A família com quem a garota foi morar aprendeu algumas palavras em português --a mesma meia dúzia que ela sabia em inglês. E "arroz" com sotaque australiano ficou parecido com "a horse", prato que era oferecido com insistência pelos anfitriões. Ela recusava e jurava que ninguém comia cavalo no Brasil. E nunca teve coragem de desmentir a história.
A comunicação, ou a falta dela, deve ser a maior geradora de problemas e confusões. De vez em quando, gera também um grande filme, como "Encontros e Desencontros", cujo título original é "Lost in Translation" e, por uma ironia que define o Brasil, foi perdido na tradução.
Mas o segundo longa de Sofia Coppola só aparentemente fala do drama e da graça de se estar num país em que não se fala a língua. É um tratado da incomunicabilidade dos sentimentos. Para dar conta disso, a diretora convocou um dos grandes atores vivos do cinema americano, o desprezado Bill Murray.
Ele é Bob Harris, um astro decadente que ganha dinheiro fazendo comerciais no Japão. E não é só o rumo de sua carreira que o deixa entediado e desiludido. Seu casamento não vai bem, sua forma física idem. Morando num hotel em Tóquio enquanto decide a cor do carpete pelo telefone com a mulher, Bob tem a vida no piloto automático.
Entra em cena Charlotte --aliás, é um close na bunda dela que abre o filme. Sua dona é Scarlett Johansson, 19, cabelo escorrido, bocão e voz grossa, que brilhou como a esquisita número dois de "Ghost World". Casada com um fotógrafo de moda (Giovanni Ribisi) em ensaios fora da cidade, ela passa a maior parte do tempo no hotel, o mesmo em que está Bob.
Então os dois se conhecem e, apesar das diferenças, começam a falar a mesma língua, ou melhor, a criar um novo dialeto, cheio de gírias e de piadas privadas. Enquanto isso, o Japão e os japoneses fazem fundo cômico.
Como um crítico disse (OK, fui eu, na Ilustrada de sábado passado), a julgar pelos dois filmes de Sofia ("Virgens Suicidas", 1999) e pelos dois últimos de papai Francis ("Jack", 1996, e "O Homem que Fazia Chover", 1997), a menina está na frente.
Avaliação:
Encontros e Desencontros (Lost in Translation)
Produção: EUA/Japão, 2003
Direção: Sofia Coppola
Com: Bill Murray, Scarlett Johansson
Quando: a partir de hoje nos cines Bristol, Ibirapuera e circuito
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