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28/08/2004 - 06h29

Tradução preserva idiossincrasias

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especial para a Folha

Inicialmente inspirada pelas gírias de mods e rockers, a linguagem "nadsat" de "Laranja Mecânica" acabou sendo recriada por Anthony Burgess depois de uma viagem a Leningrado (hoje São Petersburgo). Com receio que os termos roqueiros caducassem rapidamente, Burgess inventou neologismos calcados em palavras russas misturadas ao "cockney" (o modo de falar da classe operária britânica). Essa operação criativa transformou o trabalho do tradutor Fábio Fernandes em um exercício semelhante ao praticado na tradução de poesia e que o ocupou por longos nove meses.

Publicado pela primeira vez no Brasil há 30 anos pela extinta editora Artenova, a prosódia de "Laranja..." oscila entre a estranheza dos termos "nadsat" e o inglês "shakesperiano ou bíblico" identificado pelo crítico Blake Morrison. Fernandes diz que "há muitas diferenças entre as duas traduções. Primeiro, porque cada tradutor tem um universo lingüístico pessoal, e segundo, porque se passaram mais de 30 anos entre as duas traduções e, por melhor que uma tradução seja, ela sempre corre o risco de ficar datada".

Como a tradução da edição anterior do livro é da década de 70, período em que era comum aportuguesar estrangeirismos, Fernandes adotou procedimentos mais condizentes com os dias atuais. "Eu gosto muito da tradução do Nelson Dantas, mas acho que ela "datou" justamente no aportuguesamento da linguagem "nadsat"." E exemplifica: ""Veck" (sujeito) foi traduzido por ele como "veque", ao passo que eu optei por "vek". Nenhuma das duas formas de traduzir o termo está errada, já que hoje em dia é bastante normal usar os termos no original, como "sale" ou "streetwear". No caso acima, só retirei a letra c, porque foneticamente não faz diferença e deixar a terminação em k transmite ao leitor uma impressão de "russificação" que acho importante preservar".

A nova edição de "Laranja Mecânica", além do prefácio e de artigo elucidando a operação tradutória, traz também um glossário "não autorizado" da linguagem "nadsat". O desejo de Anthony Burgess era que o leitor submergisse sem bóia salva-vidas no idioleto fora-da-lei de Alex e sua gangue, a fim de que tal estranhamento o transportasse à metrópole ultraviolenta do futuro onde se passa a história. O escritor americano William Burroughs, um criador de paisagens bizarras e experimentador de novas formas, assinou embaixo: "Eu não conheço nenhum outro escritor que tenha feito tanto com a linguagem quanto Burgess fez". Partindo de Burroughs, um autor que acreditava na palavra como um vírus usado no controle do poder, dá para confiar.

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