Publicidade
Publicidade
26/11/2005
-
16h50
SILVANA ARANTES
da Folha de S.Paulo
O documentarista João Moreira Salles deixou de incluir cenas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no documentário "Entreatos", sobre a campanha presidencial de 2002, "para defender o Lula". "Porque acho que ele não sabe o que está dizendo ali", afirmou.
Salles possui 180 horas de imagens gravadas para o documentário e disse que irá doar todo o material "a uma instituição pública, dentro de seis ou sete anos".
No momento em que citou a decisão tomada na edição do filme --durante debate do programa Folha Documenta, na noite de anteontem, em São Paulo--, Salles falava sobre o compromisso ético que pauta a relação entre documentarista e documentado. "Não quero, não posso nem nunca serei desleal com os personagens de meus filmes", disse ele, que também tem no currículo uma cinebiografia sobre o pianista Nelson Freire.
O diretor ressaltou também a transformação do alcance e até do sentido que determinadas declarações podem sofrer, de acordo com a "diferença de domínio" de sua divulgação.
"Duvido que alguém aqui não tenha rido ou até mesmo contado alguma piada racista. Uma coisa é fazer isso na esquina, outra é transportá-la para uma tela."
Salles disse que "no fundo é divertida" a discussão em torno de "Entreatos" que ele trava atualmente com o prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia (PFL), pela seção Tendências/Debates da Folha. "Cesar Maia tem pelo menos essa virtude: é divertido."
O prefeito do Rio reprova a decisão de Salles de não haver autorizado o relançamento do documentário nos cinemas após a crise do governo Lula da Silva.
Oportunismo
Salles disse que não quis "fazer um lance de oportunismo" com a crise de agora, assim como não se interessou em "aproveitar o carnaval da posse para lançá-lo".
O diretor contou que não chegou a um acordo numa negociação de parceria com a Globo Filmes, "porque a Globo queria que o filme fosse exibido na semana que antecedia a posse".
"Entreatos" estreou no cinema em novembro do ano passado e teve cerca de 60 mil espectadores. "Foi visto por quem desejou vê-lo", disse Salles.
E tratou como sinal de ingenuidade as tentativas de identificar hoje no filme sinais antecipadores da crise do governo Lula. "Querem ver se o abraço que Lula deu no José Dirceu foi apertado ou não; se o Silvinho Pereira já aparecia desejando a Land Rover."
"Ser inteligente agora é fácil. Já estava tudo lá [no filme]. Não só o que é ruim mas também o que é bom." Salles diz acreditar que "Entreatos" não seja capaz de mudar a opinião do público a respeito de Lula. "O espectador sai do filme com o mesmo Lula com que entrou. Quem gostava gosta mais e quem não gostava gosta menos ainda."
Marcinho VP
O debate com Salles ocorreu após a exibição de seu documentário "Notícias de uma Guerra Particular" (1999), sobre o tráfico no Rio, com enfoque no morro Dona Marta, que era domínio do traficante Marcinho VP.
A primeira pergunta da platéia a Salles foi sobre sua relação com o traficante. Em 2000, Salles informou à polícia que, regenerado, Marcinho VP escrevia um livro. O cineasta financiava a elaboração da obra, destinando ao autor um valor mensal de R$ 1.200.
A revelação desembocou numa crise do governo Anthony Garotinho com o então coordenador de Segurança, Luiz Eduardo Soares, e numa acusação a Salles de favorecimento ao traficante.
Salles disse que a amizade que estabeleceu com Marcinho VP, morto em 2003, não o constrange. "[A amizade] surge de uma longa conversa em que ele se rendeu aos meus argumentos, decidiu deixar o tráfico e escrever um livro. O resto é o resto", afirmou.
Para o documentarista, essa relação "merece ser criticada por quem julga que ela é imprópria por estar além do manual".
Polícia
O diretor avaliou a polícia do Rio de Janeiro como "especialmente ruim" e disse que ela "já não serve mais à sociedade e talvez nem sequer a si mesma [em esquemas de corrupção]".
Salles afirma que os políticos fluminenses se tornam "reféns" da polícia. "Entram com planos de mudança e sucumbem em seis meses, porque a polícia tem capacidade de aumentar ou diminuir índices [de criminalidade] e produzir sensação de insegurança."
Para ele, "é possível mudar, mas é preciso coragem e vontade política, e o Rio, infelizmente, tem produzido pouco isso".
Leia mais
Crise política torna "Entreatos" um "outro filme"
Especial
Leia o que já foi publicado sobre João Moreira Salles
Salles "defendeu" Lula em "Entreatos"
Publicidade
da Folha de S.Paulo
O documentarista João Moreira Salles deixou de incluir cenas do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no documentário "Entreatos", sobre a campanha presidencial de 2002, "para defender o Lula". "Porque acho que ele não sabe o que está dizendo ali", afirmou.
Salles possui 180 horas de imagens gravadas para o documentário e disse que irá doar todo o material "a uma instituição pública, dentro de seis ou sete anos".
No momento em que citou a decisão tomada na edição do filme --durante debate do programa Folha Documenta, na noite de anteontem, em São Paulo--, Salles falava sobre o compromisso ético que pauta a relação entre documentarista e documentado. "Não quero, não posso nem nunca serei desleal com os personagens de meus filmes", disse ele, que também tem no currículo uma cinebiografia sobre o pianista Nelson Freire.
O diretor ressaltou também a transformação do alcance e até do sentido que determinadas declarações podem sofrer, de acordo com a "diferença de domínio" de sua divulgação.
"Duvido que alguém aqui não tenha rido ou até mesmo contado alguma piada racista. Uma coisa é fazer isso na esquina, outra é transportá-la para uma tela."
Salles disse que "no fundo é divertida" a discussão em torno de "Entreatos" que ele trava atualmente com o prefeito do Rio de Janeiro, Cesar Maia (PFL), pela seção Tendências/Debates da Folha. "Cesar Maia tem pelo menos essa virtude: é divertido."
O prefeito do Rio reprova a decisão de Salles de não haver autorizado o relançamento do documentário nos cinemas após a crise do governo Lula da Silva.
Oportunismo
Salles disse que não quis "fazer um lance de oportunismo" com a crise de agora, assim como não se interessou em "aproveitar o carnaval da posse para lançá-lo".
O diretor contou que não chegou a um acordo numa negociação de parceria com a Globo Filmes, "porque a Globo queria que o filme fosse exibido na semana que antecedia a posse".
"Entreatos" estreou no cinema em novembro do ano passado e teve cerca de 60 mil espectadores. "Foi visto por quem desejou vê-lo", disse Salles.
E tratou como sinal de ingenuidade as tentativas de identificar hoje no filme sinais antecipadores da crise do governo Lula. "Querem ver se o abraço que Lula deu no José Dirceu foi apertado ou não; se o Silvinho Pereira já aparecia desejando a Land Rover."
"Ser inteligente agora é fácil. Já estava tudo lá [no filme]. Não só o que é ruim mas também o que é bom." Salles diz acreditar que "Entreatos" não seja capaz de mudar a opinião do público a respeito de Lula. "O espectador sai do filme com o mesmo Lula com que entrou. Quem gostava gosta mais e quem não gostava gosta menos ainda."
Marcinho VP
O debate com Salles ocorreu após a exibição de seu documentário "Notícias de uma Guerra Particular" (1999), sobre o tráfico no Rio, com enfoque no morro Dona Marta, que era domínio do traficante Marcinho VP.
A primeira pergunta da platéia a Salles foi sobre sua relação com o traficante. Em 2000, Salles informou à polícia que, regenerado, Marcinho VP escrevia um livro. O cineasta financiava a elaboração da obra, destinando ao autor um valor mensal de R$ 1.200.
A revelação desembocou numa crise do governo Anthony Garotinho com o então coordenador de Segurança, Luiz Eduardo Soares, e numa acusação a Salles de favorecimento ao traficante.
Salles disse que a amizade que estabeleceu com Marcinho VP, morto em 2003, não o constrange. "[A amizade] surge de uma longa conversa em que ele se rendeu aos meus argumentos, decidiu deixar o tráfico e escrever um livro. O resto é o resto", afirmou.
Para o documentarista, essa relação "merece ser criticada por quem julga que ela é imprópria por estar além do manual".
Polícia
O diretor avaliou a polícia do Rio de Janeiro como "especialmente ruim" e disse que ela "já não serve mais à sociedade e talvez nem sequer a si mesma [em esquemas de corrupção]".
Salles afirma que os políticos fluminenses se tornam "reféns" da polícia. "Entram com planos de mudança e sucumbem em seis meses, porque a polícia tem capacidade de aumentar ou diminuir índices [de criminalidade] e produzir sensação de insegurança."
Para ele, "é possível mudar, mas é preciso coragem e vontade política, e o Rio, infelizmente, tem produzido pouco isso".
Leia mais
Especial
Publicidade
As Últimas que Você não Leu
Publicidade
+ LidasÍndice
- Alice Braga produzirá nova série brasileira original da Netflix
- Sem renovar contrato, Fox retira canais da operadora Sky
- Filósofo e crítico literário Tzvetan Todorov morre, aos 77, em Paris
- Quadrinhos
- 'A Richard's estava perdendo sua cara', diz Ricardo Ferreira, de volta à marca
+ Comentadas
- Além de Gaga, Rock in Rio confirma Ivete, Fergie e 5 Seconds of Summer
- Retrospectiva celebra os cem anos da mostra mais radical de Anita Malfatti
+ EnviadasÍndice